1303 questões encontradas
A Lei nº XX, do Município Beta, dispôs que são bens do Município todas as terras públicas em seu território sem destinação, que nunca integraram o patrimônio de um particular, ainda que possam estar na sua posse de maneira ilícita, tidas como indispensáveis à proteção de ecossistemas naturais.
A partir da narrativa acima, responda aos questionamentos a seguir.
A - A Lei nº XX, do Município Beta, ao atribuir os referidos bens ao Município, é materialmente constitucional? (Valor: 0,65)
B - Bens da natureza dos descritos na narrativa podem ser objeto de doação a um particular? (Valor: 0,60)
Por enquanto não há notas de professor Não há nenhum comentário ainda. Seja o primeiro!
João e Maria são servidores públicos federais estáveis, ocupantes de cargo efetivo, e estão lotados no mesmo órgão, sediado em Município do interior do Estado Alfa. Ambos os servidores requereram à Administração Pública federal suas remoções a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração, pelos fundamentos a seguir.
I - João pretende se remover no âmbito do mesmo quadro, com mudança de sede para a capital do Estado Alfa, para acompanhar sua cônjuge Joana, que é servidora pública civil do Estado Alfa, que acabou de ser removida, a pedido, para órgão sediado na capital do citado Estado.
II - Maria pretende se remover no âmbito do mesmo quadro, com mudança de sede para a capital do Estado Alfa, por motivo de saúde, haja vista que acabou de ser diagnosticada com câncer e o tratamento de quimioterapia indicado pelos seus médicos assistentes somente está disponível em unidade de saúde situada na capital do citado Estado.
A Administração Pública federal indeferiu ambos os requerimentos de remoção, para não desfalcar os recursos humanos do órgão de origem.
Os servidores João e Maria procuraram você, como advogado(a), para defender seus interesses. Levando em consideração os fatos narrados, de acordo com a legislação de regência, responda aos itens a seguir.
A - João possui direito subjetivo à remoção pretendida? (Valor: 0,60)
B - Maria tem direito subjetivo à remoção pleiteada? A decisão da Administração Pública federal acerca do requerimento de Maria constitui ato administrativo discricionário? (Valor: 0,65)
Por enquanto não há notas de professor Não há nenhum comentário ainda. Seja o primeiro!
A lei orgânica do Município Delta estabelece a competência não exclusiva do prefeito municipal para nomear servidores ocupantes de cargo em comissão. João, prefeito recém empossado, vem promovendo diversas mudanças na administração municipal e editou decreto municipal delegando ao secretário municipal da Casa Civil competência para nomear e exonerar os titulares de cargos em comissão, exceto os cargos de secretários municipais, procurador-geral e presidentes das entidades integrantes da Administração Indireta municipal.
Registra-se que a legislação municipal, no que tange à delegação de competência, repete os mesmos termos da lei federal que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.
Jorge, secretário municipal da Casa Civil, praticou ato administrativo exonerando Maria de cargo em comissão, com formal, extensa e circunstanciada motivação no sentido de que a exoneração era imprescindível para cortes de despesas, diante da crise financeira por que passa o Município que agravou o déficit orçamentário.
No dia seguinte à sua exoneração, Maria verificou que foi publicada no Diário Oficial a nomeação de outra pessoa (sem qualquer relacionamento com agentes públicos) para o mesmo cargo em comissão que ocupara, inclusive sendo lotada no mesmo setor, com igual remuneração e para exercício de idênticas funções de assessoramento que outrora exercia.
Mesmo sabedora de que era ocupante de cargo exclusivamente em comissão, de livre nomeação e exoneração, Maria não se conformou com o ocorrido e procurou você como advogado(a). Em pesquisa ao site da transparência do Município, você verificou a plena saúde financeira do Município, já que o orçamento municipal do exercício em vigor é o maior de sua história e superou a arrecadação esperada, em razão do recebimento de recursos oriundos dos royalties do petróleo.
Diante dos fatos narrados, responda, de forma fundamentada, às questões a seguir.
A - A delegação de competência feita pelo prefeito João ao secretário municipal da Casa Civil é lícita? (Valor: 0,60)
B - Qual argumento deve ser utilizado judicialmente pelo advogado(a) visando à declaração de nulidade do ato de exoneração de Maria? (Valor: 0,65)
Por enquanto não há notas de professor Não há nenhum comentário ainda. Seja o primeiro!
Gabriel é servidor de determinado órgão consultivo federal, ao qual compete a emissão de pareceres que são considerados, por lei, obrigatórios e vinculantes. Por estar assoberbado de trabalho, Gabriel não conseguiu elaborar, em tempo, o parecer que afeta os interesses da sociedade empresária Alfa. Decorrido o respectivo prazo, a Administração deu prosseguimento ao processo administrativo, para que fossem adiantadas outras providências.
Após longo período, mas antes da conclusão do processo, Gabriel finalmente apresentou sua opinião técnica, fundamentada em entendimento controvertido, mas que foi determinante para o posicionamento da autoridade competente.
A orientação adotada mostrou-se contrária aos interesses da mencionada sociedade, causando-lhe prejuízos, à vista dos quais tal pessoa jurídica dispõe-se a buscar as vias pertinentes para a responsabilização administrativa pessoal do parecerista.
Considerando que o processo administrativo em questão não conta com legislação acerca de rito específico, responda, fundamentadamente, aos questionamentos a seguir.
A - O processo administrativo poderia ter prosseguido sem a apresentação do parecer de Gabriel? (Valor: 0,60)
B - A existência de controvérsia é suficiente para a responsabilização administrativa pessoal de Gabriel por sua opinião técnica? (Valor: 0,65)
Por enquanto não há notas de professor Não há nenhum comentário ainda. Seja o primeiro!
As sociedades empresárias Alfa, Beta e Gama, em comunhão de ações e desígnios, fraudaram licitação para reforma e manutenção de estádio esportivo, mediante ajuste e combinação que frustraram o caráter competitivo do certame, que culminou com a contratação da sociedade empresária Gama por determinado Estado da Federação.
Após regular processo administrativo deflagrado pela Administração Pública Estadual contratante, restaram comprovadas a autoria e a materialidade do ato ilícito, bem como um prejuízo ao erário na ordem de 50 milhões de reais.
A sociedade empresária Alfa, em janeiro de 2021, procurou voluntariamente o Estado com intuito de celebrar acordo de leniência. Por sua vez, a sociedade empresária Beta, em abril de 2021, também procurou o Estado com o mesmo escopo.
Observados os fatos narrados à luz da Lei Anticorrupção, responda aos questionamentos a seguir.
A - Poderão as sociedades empresárias Alfa e Beta celebrar, ao mesmo tempo e acerca dos mesmos fatos, acordo de leniência com o Estado? Justifique. (Valor: 0,60)
B - Pelo poder público, de quem é a competência para celebrar o acordo de leniência? Há necessidade de participação do Ministério Público e/ou de homologação judicial para a validade do acordo de leniência? Justifique. (Valor: 0,65)
Por enquanto não há notas de professor Não há nenhum comentário ainda. Seja o primeiro!
O Estado Beta realizou licitação e formalizou contrato administrativo, com base na Lei nº 14.133/21, para a realização de uma obra de grande relevância para a coletividade, da qual se sagrou vencedora a sociedade Alfa S/A, a qual iniciou a execução do contrato após a mobilização do equipamento necessário para tanto.
Posteriormente, durante o período de validade da avença, verificou-se a existência de irregularidade na respectiva licitação, à qual a sociedade Alfa não concorreu ou deu causa. Em razão disso, a Administração iniciou procedimento administrativo para promover a invalidação do contrato.
No trâmite de tal procedimento, em que respeitado o princípio da ampla defesa e contraditório, questões relevantes foram ponderadas, tais como a impossibilidade de sanar o vício em questão e as consequências de se promover a anulação do contrato, aspecto em que foi especialmente debatido o fato de que eventual invalidação seria contrária ao interesse público, notadamente em razão dos impactos financeiros, econômicos e sociais decorrentes do atraso na fruição do objeto em questão, assim como os custos para a desmobilização e o posterior retorno às atividades.
Não obstante, o Poder Público, por meio de decisão assinada pela autoridade competente, decidiu anular o contrato, com efeitos pretéritos, mediante indenização do contratado pelo que já tinha executado até então e pelos prejuízos comprovados.
A única justificativa invocada para o aludido ato de invalidação foi a violação ao princípio da legalidade, na medida em que, dos atos nulos, não se originam direitos. Não houve menção a qualquer alternativa possível no caso concreto, ou à caracterização de interesse público que justificasse a medida, ou mesmo às consequências práticas, jurídicas e administrativas que decorreriam de tal decisão.
O advogado constituído pelos representantes da sociedade Alfa, tempestivamente, impetrou mandado de segurança, mediante apresentação da prova pré-constituída e dos argumentos jurídicos pertinentes, sendo certo que as normas de organização judiciária estadual apontavam para a competência do Tribunal de Justiça Local, o que ocasionou a regular tramitação do feito perante a câmara competente.
Inicialmente, foi deferida a liminar para suspender os efeitos da decisão de invalidação do contrato, mas sobreveio acórdão, unânime, que revogou a liminar e denegou a segurança, sob o fundamento de que não cabe ao Judiciário verificar a existência de interesse púbico na situação, na medida em que a matéria se submete à discricionariedade administrativa. Foram opostos embargos de declaração, rejeitados por não haver omissão, contradição ou obscuridade a ser sanada, cuja decisão foi publicada na última sexta-feira.
Observando o Art. 105, inciso II, da CRFB/88, redija a petição da medida pertinente à defesa dos interesses da sociedade Alfa contra a decisão prolatada em única instância pelo Tribunal de Justiça estadual, desenvolvendo todos os argumentos jurídicos adequados à admissibilidade do recurso e ao mérito da demanda, considerando a urgência da manifestação jurisdicional.
(Valor: 5,00)
Obs.: a peça deve abranger todos os fundamentos de Direito que possam ser utilizados para dar respaldo à pretensão. A simples menção ou transcrição do dispositivo legal não confere pontuação.
Por enquanto não há notas de professor Não há nenhum comentário ainda. Seja o primeiro!
"Dito Corruptus" foi condenado pela prática de ato de improbidade administrativa, previsto no art. 10, inc. IX, da Lei n° 8.429/92, à obrigação de reparação do dano gerado ao erário do Município de Povo Sofrido, correspondente ao valor histórico de R$ 100.000,00, além da sanção de suspensão dos direitos políticos pelo período de 7 anos.
O ente lesado foi o município de Povo Sofrido, tendo o ato improbo sido praticado por "Dito Corruptus" na época em que exerceu o honroso mandato de Prefeito daquele município.
No decreto condenatório, já transitado em julgado, ficou estabelecida a incidência, sobre o valor histórico do dano, de juros e correção monetária a partir da data do prejuízo causado ao erário.
Elaborados os regulares cálculos contábeis. apurou-se que o valor do dano atinge a cifra atualizada (corrigida monetariamente) de R$ 150.000,00, ao passo que os juros legais correspondem a R$ 50.000.00, totalizando um débito de R$ 200.000,00.
Diligenciando, o órgão de execução do Ministério Público com atribuição para pleitear o cumprimento do referido decreto condenatório identificou que "Dito Corruptus" apenas em imóveis e veículos automotores (livres e desembaraçados), possui um patrimônio de R$ 3.200.000.00.
Sabedor de que o órgão de execução do MP já estava reunindo elementos para dar cumprimento efetivo ao decreto condenatório, "Dito Corruptus" protocola petição na Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público da Comarca de Povo Sofrido, pleiteando a celebração de acordo, com fulcro no § 4° do art. 17-B da Lei n° 8.429/92.
A proposta apresentada corresponde ao imediato reembolso aos cofres públicos da importância de R$ 150.000.00, referente ao valor do dano regularmente atualizado (corrigido monetariamente), mas sem a incidência de juros, além da redução do período de suspensão dos direitos políticos de 7 para 5 anos.
A petição veio instruída com documento subscrito pelo Prefeito, pela Procuradora-Geral e pelo Controlador Geral do Município de Povo Sofrido na atualidade, anuindo à proposta apresentada.
A conveniência e a vantagem do acordo, segundo a petição de "Dito Corruptus", justificam-se pelo imediato pagamento dos R$ 150.000,00, que serão recolhidos aos cofres públicos municipais nas 24 horas subsequentes à sua homologação judicial.
Sem adentrar na análise da constitucionalidade ou não do dispositivo legal citado, discorra concluindo pela necessidade de cumprimento, neste caso, do decreto condenatório nos exatos moldes nele estabelecidos, motivando a rejeição à proposta de acordo apresentada, tanto no que se refere ao valor correspondente à reparação do dano (sem a incidência de juros), quanto em relação à redução do período de suspensão dos direitos políticos.
(2,0 Pontos)
(20 Linhas)
A prova foi realizada com consulta a códigos e(ou) legislação.
Por enquanto não há notas de professor Não há nenhum comentário ainda. Seja o primeiro!
Em matéria de sanções aqueles que praticaram ato de improbidade administrativa, levando em consideração a redação da Lei nº 8.429/1992 dada pela Lei nº 14.230/2021, bem como a atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, responda aos itens a seguir, de forma objetivamente fundamentada.
A - É possível que a sanção de proibição de contratação com o poder público extrapole o ente público lesado pelo ato de improbidade?
B - São cabíveis medidas executivas atípicas, de cunho não patrimonial, no cumprimento de sentença transitada em julgado proferida em ação de improbidade administrativa?
(20 linhas)
(15 Pontos)
A prova foi realizada sem consulta a códigos e(ou) legislação.
Por enquanto não há notas de professor Não há nenhum comentário ainda. Seja o primeiro!
Utilizando o texto abaixo como o relatório de sua sentença (podendo o candidato passar diretamente à fundamentação), elabore sentença de natureza cível, abordando as preliminares e, se o caso, as questões de mérito, elaborando também o dispositivo e solucionando a lide.
Os elementos de prova existentes são aqueles indicados no relatório abaixo e o(a) candidato(a) deverá ater-se a eles na sua análise e fundamentação, não devendo criar fatos, locais ou personagens novos.
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e a ASSOCIAÇÃO MBOREVI-RY LUTA E VIDA DO POVO GUARANI KAIOWÁ propuseram a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA em face da EMPRESA DE ENERGIA ELÉTRICA SUL MATOGROSSENSE – ENESMA, com o objetivo de anular o Decreto n° 513 de 23/09/1970 ou, subsidiariamente, compeli-la a modificar o traçado da servidão de passagem de linhões de transmissão de energia elétrica, que tem extensão total de 17,3 km e atravessa o trecho nordeste do território indígena do Povo Guarani Kaiowá, localizado em Serra Madeira, Município de Naviraí, Mato Grosso do Sul. Pleiteiam também indenização por danos materiais e por danos morais coletivos, decorrentes dos impactos sofridos, e indenização como contraprestação financeira pela servidão de passagem desses linhões de transmissão em seu território.
Consta, da INICIAL, que em 23/09/1970, o Decreto n° 513 declarou a região de Serra Madeira como de utilidade pública para fins de servidão administrativa, sendo celebrado o contrato de concessão n° 25, de 30/11/1970, pelo prazo de 99 anos, entre a União Federal e a ENESMA. Os indígenas ocupavam esse território desde então e, em 2016, a área foi reconhecida como terra tradicionalmente indígena pelo Decreto 15.515, de 15/5/2016, após procedimento administrativo de demarcação, o qual obedece aos trâmites legais.
Os autores alegam que houve o devido licenciamento ambiental das linhas de transmissão, nos moldes da legislação ambiental vigente, especialmente como preceituado na Portaria IBAMA n° 421, de 26/10/2011.
No entanto, as medidas compensatórias e mitigadoras não foram compatíveis com os impactos provocados pelo empreendimento (instalação e operação de linhões de transmissão de energia elétrica) e, por isso, os danos materiais e imateriais suportados pela comunidade indígena são desproporcionais. Soma-se a isso o fato de o povo indígena não ter sido formalmente consultado sobre o empreendimento, o que contraria a Convenção n° 169 da OIT. Informam, ainda, que o procedimento de licenciamento ambiental durou três anos, tendo se iniciado em 2012 e finalizado em 2015, com a expedição da licença de operação em 12/03/2015, com validade de dez anos.
Os linhões de transmissão cruzam parte da Serra Madeira em área de plantio de mandioca e batata. Aduzem que há perigo de descarga elétrica sob os linhões e nas proximidades das torres de sustentação e que houve acidentes e mortes de animais domésticos que se alimentam no entorno das plantações ou que acompanham os indígenas que lidam com o plantio. Contabilizam a perda de cerca de 95 animais – entre cachorros, galinhas, perus e gatos, com prejuízo financeiro advindo da reposição dos bichos. Se isto não bastasse, a altura das torres e das linhas elétricas de transmissão obsta o voo ordinário das aves de rapina típicas da região e prejudica a visão de suas presas, o que está causando grave desequilíbrio ecológico. Destacam que houve um número excessivo de mortes da avifauna, por eletrocussão e por colisão com cabos.
Alegam também que os indígenas que vivem nesse território têm percebido problemas decorrentes das ondas eletromagnéticas: a má qualidade e o baixo valor nutricional da mandioca e da batata plantadas embaixo dos linhões; e o surgimento de problemas dermatológicos nas crianças da comunidade na última década. Destacam que têm utilizado mais insumos agrícolas (fertilizantes) e água para irrigação nessa área, o que tem elevado os custos do plantio. Ainda em relação à presença de linhões de transmissão no local do plantio de alimentos, ressaltam uma perturbação nas atividades do ñembo’e (rezas) e jehovassa (bendições) efetuadas pelo xamã. Essas rezas e bênçãos têm, para os Guarani Kaiowá, poder profilático e fertilizante sobre as plantas cultivadas, garantindo-lhes o crescimento rápido e livre do ataque de pragas e doenças.
Destacam que o Trecho 13 do linhão está muito próximo da área considerada sagrada para culto dos ancestrais e celebrações. O barulho excessivo tem afastado os espíritos que visitam os integrantes da comunidade nas cerimônias; e o campo eletromagnético tem sido considerado pelas lideranças espirituais e religiosas tradicionais – ñanderu e ñandesy – como um fator de dificuldade no contato com o divino.
Os autores também justificam a necessidade de modificação do traçado dos linhões de transmissão pelo fato de que essa rede elétrica requer frequente manutenção, com ingresso de funcionários da ENESMA no território, provocando constante turbação da posse indígena bem como intranquilidade nas crianças e mulheres da comunidade.
Pedem a anulação do contrato de concessão e a consequente retirada das torres e cabos de transmissão, não bastando a mera desativação da condução elétrica, considerando que a população indígena do local sequer se beneficia da energia, nos moldes do § 6° do art. 231 da CF. Alternativamente, pedem a transferência da linha de transmissão para área externa à reserva indígena, sob pena de multa diária de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por dia.
Além dos pedidos relativos à obrigação de fazer, considerando a restrição do uso habitual da área, bem como a frequente turbação provocada pela manutenção da rede elétrica, pedem seja a Ré condenada ao pagamento de indenização no valor de 100% do valor da área ocupada pelas linhas de transmissão, ao pagamento de danos materiais e ao pagamento de danos morais coletivos, estes últimos no valor superior a R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais). Pedem, inaudita altera parte, o desligamento imediato da operação da rede de transmissão de energia elétrica, sob pena de multa diária de R$ 100.000,00 (cem mil reais).
Os autores requereram a produção de prova pericial, com a determinação de que a antecipação dos honorários do perito seja feita pela ré. O Ministério Público Federal juntou inquérito civil no qual constam documentos referentes à concessão, servidão de passagem, demarcação da terra indígena, licenciamento ambiental, depoimentos da comunidade.
A Associação juntou registro fotográfico das crianças com problemas dermatológicos e da fauna eletrocutada, além de material audiovisual com depoimentos dos xamãs. Juntaram notas fiscais e outros documentos que comprovam o maior consumo de insumos agrícolas e a reposição dos animais domésticos.
A apreciação da LIMINAR foi postergada para após a vinda da contestação.
Em CONTESTAÇÃO, a empresa demandada alegou a ilegitimidade da Associação autora, uma vez que conforme se verifica de seus estatutos, foi constituída há menos de 1 (um) ano.
Aduziu ainda a ausência de interesse de agir do Ministério Público Federal, uma vez que em nenhum momento da condução do inquérito civil, que precedeu a propositura da presente ação civil pública e a instrui, houve a tentativa de celebração de termo de ajustamento de conduta.
Alegou também a existência de litispendência entre a ação civil pública e ação popular, em curso na mesma vara, proposta pelo cidadão João da Silva, anteriormente à ação civil pública, com o objetivo único de anulação do processo de licenciamento do linhão por estar em terra indígena.
Sobre o pedido de multa diária, a ré alega a impossibilidade de cobrança de astreintes à concessionária de serviços públicos, em razão da relevância e essencialidade dos serviços prestados.
Alegou também a ocorrência de prescrição, considerando que o Decreto que reconheceu a região como terra tradicionalmente ocupada por indígenas data de 15/5/2016 e a ação foi proposta em 30/06/2021. Além disso, argumentou que o Decreto que declarou aquela região como de utilidade pública para fins de servidão administrativa data de 23/09/1970, sendo anterior ao reconhecimento da região como terra tradicionalmente ocupada por indígenas. Logo, nada há para ser indenizado.
Aduziu, também, que na época da implantação da rede elétrica, houve licenciamento ambiental e foram cumpridas todas as medidas mitigadoras e compensatórias impostas pelo órgão licenciador. Além dessas medidas, a Ré, voluntariamente, ainda atendeu à solicitação do Ministério Público Federal para construção de obras de infraestrutura (construção de escola e centro de convivência), que foram finalizadas e entregues para a comunidade em 2019. Informaram que, em janeiro de 2020, tomou a iniciativa de mobiliar e equipar a escola e o centro de convivência recém construídos.
A Ré ressalta que, no licenciamento ambiental, foram estudados três traçados para instalação da rede elétrica e a alternativa locacional (escolha do melhor traçado) levou em consideração a existência de área já desmatada pela população indígena. Aduz que transferir os linhões de transmissão para outro local é inviável, dada a densa vegetação nativa das proximidades, e causaria sérios danos ecológicos, inclusive com desmatamento de áreas de proteção ambiental.
Ressalta que os problemas dermatológicos e de alteração na qualidade nutricional dos alimentos cultivados não guardam qualquer pertinência com a instalação e operação de linhas de transmissão. Ressalta ainda a Ré que, conforme consta nos Estudos de Impacto Ambiental e no Relatório subsequente (EIA/RIMA), a presença de linhões de transmissão não prejudica a atividade agrícola desenvolvida nem altera os elementos ecológicos (como terra, água, fauna) da área. Embora reconheça que não há estudos específicos sobre a mudança da qualidade nutricional dos tubérculos, realça a total impertinência da alegação, que não tem base científica. Seguem o mesmo raciocínio para refutar os problemas dermatológicos nas crianças.
Segundo a Ré, o tempo decorrido desde a implantação da rede elétrica permitiu a reorganização ecológica, ou seja, se houve algum desequilíbrio, agora não há mais. A alteração da paisagem, neste momento, sem estudo ambiental, causaria novo (ou outro) desequilíbrio ecológico, em proporções que não se pode mensurar. No mais, apresentaram estudos que indicam a excepcionalidade de eletrocussão de aves por linhões de transmissão.
Quanto à alegação de perturbação das atividades religiosas e espirituais, faz referência aos Estudos de Impacto Ambiental e ao Relatório subsequente (EIA/RIMA), bem como aos debates da Audiência Pública, dos quais participaram as lideranças indígenas. Naquele momento, concordaram com o traçado escolhido.
Esta participação qualificada da comunidade indígena, por suas lideranças, no curso do licenciamento ambiental é considerada, pela Ré, como implementação do direito à consulta previsto na Convenção n° 169 da OIT.
Alegou que a manutenção dos linhões tem periodicidade bienal e já foi acordado com a comunidade indígena, no licenciamento, que a entrada seria avisada com antecedência de um mês e nunca coincidindo com a data dos rituais sagrados. Apenas em situação de excepcionalidade (acidente) haverá ingresso da equipe sem aviso prévio.
Aduziu que a desativação da rede deixará os municípios vizinhos sem energia elétrica, prejudicando mais de 60.000 pessoas. Pelas mesmas razões, a anulação do contrato de concessão não se mostra razoável, considerando a quantidade de pessoas que dependem dessa transmissão elétrica.
Acrescenta, ainda, ser incabível qualquer tipo de indenização, considerando que os indígenas continuam a utilizar a área para plantio de mandioca e batata. Ressalta que, conforme constou nos Estudos de Impacto Ambiental e no Relatório subsequente (EIA/RIMA), a área já era desmatada antes da instalação dos linhões e, desde os anos de 1990, tem sido utilizada para o cultivo de tubérculos.
No mais, destacam que cumpriram todas as medidas compensatórias e mitigadoras impostas pelo órgão ambiental licenciador e ainda, de forma espontânea, fizeram investimentos para o bem-estar da comunidade.
A Ré alegou que não são devidos danos morais coletivos (punitive damages) por conta de ausência de previsão legal no ordenamento jurídico brasileiro. Por fim, a ré aduziu não ter responsabilidade por adiantar os custos da prova pericial, uma vez que a prova técnica foi requerida pelos autores. Após a contestação, foi indeferida a medida de urgência pleiteada.
A prova pericial foi realizada pelo grupo de pesquisa interdisciplinar da Universidade Federal do Mato Grosso Sul, sem antecipação dos honorários periciais, tema que será abordado na solução desta lide.
A perícia avaliou a área de servidão em R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais) e os custos para eventual alteração do traçado dos linhões em R$ 20.000.000,00 (vinte milhões). Reconheceu também que teria havido para a comunidade indígena comprometimento de seus locais sagrados, inclusive com a quantificação sonora da operação, bem como que tal aspecto não foi considerado no licenciamento ambiental. No entanto, informou a inexistência de parâmetros para valoração deste tipo de dano cultural imaterial, sendo recomendável a adoção de medidas mitigadoras, como a adoção de barreira acústica no Trecho 13 do linhão. Quanto aos danos à avifauna, o licenciamento ambiental contemplou medidas compatíveis com os impactos da instalação da rede. Todavia, constatou a existência de colisões das aves com consequências significativas para espécies ameaçadas de extinção, como arara-azul grande e codorna buraqueira. Sugeriu como medida compensatória a criação de santuário de aves na borda vizinha à área indígena. Quanto às aves de rapina, não foi identificada mudança populacional na última década, o que pode indicar ausência de dano. Por fim, a perícia foi inconclusiva quanto aos impactos da operação dos linhões nas culturas agrícolas indígenas e na qualidade nutricional dos alimentos.
No mesmo sentido, não pôde concluir se há relação entre os efetivos problemas dermatológicos das crianças da comunidade indígena e as ondas eletromagnéticas.
Apresentados memoriais pelas partes, vieram os autos conclusos para sentença.
(10 Pontos)
Por enquanto não há notas de professor Não há nenhum comentário ainda. Seja o primeiro!
Por enquanto não há notas de professor Não há nenhum comentário ainda. Seja o primeiro!