Leia o relatório abaixo com atenção e complemente a sentença. Enfrente todas as questões penais e processuais propostas, lembrando-se de mencionar na fundamentação todos os artigos eventualmente pertinentes, cuja correta citação será levada em conta pela banca.
Narra a denúncia que, em 15 de outubro de 2011, por volta das 17h, no entroncamento da Av. Rio Branco com Rua Sete de Setembro, no centro da cidade do Rio de Janeiro, José, Antônio e Murilo, agindo dolosamente e o primeiro empregando arma de fogo, surpreenderam Márcio, que estava em seu veículo Gol, ameaçando a vítima gravemente com o propósito de subtrair-lhe o mencionado automóvel.
Segue a inicial acusatória descrevendo que os referidos agentes entraram no carro da vítima, que foi violentamente colocada no banco de trás e, enquanto José a ameaçava com a arma que portava, Antônio assumia a condução do veículo e Murilo sentava-se no banco do carona.
A denúncia acrescenta que nas proximidades do Outeiro da Glória, cinco minutos após a abordagem, José sai do carro com a vítima, que permanece intimidada por ele, sob a mira de arma de fogo, enquanto os demais agentes seguem com o automóvel em direção à Zona Sul da cidade.
O Ministério Público assevera que, de acordo com as declarações do lesado, José revista Márcio naquele momento e descobre que a vítima portava um cartão bancário. José obriga Márcio a acompanhá-lo ao caixa eletrônico situado na Rua das Laranjeiras, distante dez minutos a pé de onde estavam, restringindo a liberdade da vítima, necessariamente, para obrigá-la a ter acesso ao citado caixa e colocar a mão no terminal, meio exigido pelo Banco, em substituição à senha alfanumérica, para liberar o dinheiro. Assim, Márcio é obrigado a sacar trezentos reais, dos quais José se apropriou.
José mantém a vítima subjugada ao tempo em que ambos seguem a pé na direção do Cosme Velho, mas policiais, avisados por pessoas que estavam perto do caixa eletrônico e suspeitaram da cena, abordam os dois na Rua Alice, cerca de cinco minutos da saída do citado caixa eletrônico.
José é preso imediatamente, o dinheiro é recuperado pela vítima e a arma, apreendida e posteriormente examinada, é considerada pelos peritos absolutamente incapaz de produzir disparos, pois além de não estar municiada, continha defeito insanável no mecanismo de acionamento.
No bolso de José os policiais encontraram também cinco envelopes de maconha e o agente declarou que eram para seu uso pessoal. Cerca de trinta minutos da abordagem da vítima na Avenida Rio Branco, outros policiais, alertados por rádio da subtração do veículo, interromperam a passagem do carro pela Avenida Nossa Senhora de Copacabana e prenderam em flagrante Murilo, que estava ao volante. Este teria sido reconhecido por Márcio na Delegacia de Polícia. Não havia outras pessoas no automóvel.
Antônio foi reconhecido pela vítima por meio das fotografias de um álbum que foi exibido a Márcio em sede policial, durante a lavratura do auto de prisão em flagrante relativamente a José e Murilo.
A denúncia conclui que os três acusados devem ser condenados como incursos nas penas dos artigos 157, § 2º, incisos I e II, c. c. 158, § 1º, ambos do Código Penal, em concurso material e José também como incurso nas penas do artigo 28 da Lei nº. 11.343/06.
Comunicada imediatamente a prisão em flagrante ao juiz de direito da 35ª Vara Criminal da Capital e ouvido o Ministério Público, que requereu a conversão da prisão em flagrante de José em prisão preventiva e a decretação da prisão preventiva de Antônio, nos dois casos para assegurar a instrução criminal, tendo em vista o manifesto receio da vítima, declarado por Márcio ao Delegado de Polícia no auto de prisão em flagrante, o magistrado decretou a prisão preventiva dos três denunciados com este fundamento. O juiz criminal salientou, no que concerne a Murilo, que apesar de a vítima não ter reclamado de ameaças da parte de Murilo, a situação dele era idêntica a dos demais agentes.
A autoridade policial encerrou a investigação criminal em 48h (quarenta e oito horas), tempo necessário à execução da ordem de prisão de Antônio, encontrado na casa da namorada, pois que desconhecido o endereço de residência, situação inalterada até o fim do processo. Além disso, o Delegado de Polícia providenciou a juntada aos autos da folha penal dos três acusados e do laudo de exame em arma referido.
Após a citação e resposta preliminar das Defesas dos acusados a denúncia foi recebida como oferecida.
Em sua resposta preliminar o acusado José requereu o desmembramento do processo e envio de peças ao Juizado Especial Criminal para apurar o crime da Lei de Drogas. Assinalou, ainda, que a única condenação transitada em julgado em relação a ele impunha-lhe pena de um ano de detenção pelo crime do artigo 16 da Lei nº. 6.368/76 e, embora não operada a prescrição da reincidência, por não ter decorrido tempo superior a cinco anos, neste caso não prevaleceria a reincidência, o que justificava a revogação da prisão preventiva. José salienta, ao fim de sua resposta preliminar, que a vítima sabia que a arma estava sem munição e que, portanto, o crime único praticado era de furto, em sua modalidade tentada, cabendo a suspensão condicional do processo.
A Defesa de Murilo, por sua vez, aduziu que o acusado recebera o carro de Antônio nas proximidades do Shopping Rio Sul, em Botafogo, e que não sabia tratar-se de veículo roubado, cabendo a Murilo deixar o veículo no início da comunidade da Rocinha, onde outra pessoa o receberia. Murilo nega a subtração do carro e o conhecimento da ação desenvolvida em Laranjeiras e assevera, ainda, que não conhece José.
A Defesa de Antônio, em sua resposta preliminar, nega a autoria dos dois crimes.
Todas as Defesas arrolam testemunhas.
Em decisão fundamentada o juiz criminal recebe a denúncia e rechaça as irresignações, sublinhando que:
A) A questão da autoria, negada por Antônio, seria resolvida após a instrução, prevalecendo os indícios recolhidos no inquérito policial;
B) Do mesmo modo a desclassificação postulada por José, havendo indícios significativos da existência dos crimes de roubo e extorsão, corporificados nas declarações policiais da vítima, dos autores das prisões e das testemunhas da abordagem da vítima na Av. Rio Branco e no caixa eletrônico;
C) E assim também estaria reservada à instrução criminal a definição da conduta imputada a Murilo – se roubo e extorsão ou receptação – subsistindo, por ora, a qualificação da denúncia;
D) Que não caberia desmembrar a acusação de porte de drogas a José porque em conexão probatória com os crimes patrimoniais. Ultima a decisão declarando inalteradas as condições que levaram à emissão do decreto de prisão preventiva.
A instrução criminal está retratada na assentada de fls. Registra-se que a vítima, inquirida, reconheceu exclusivamente Antônio e José e relatou os fatos em conformidade com o que havia declarado em sede policial. Márcio, igualmente de forma taxativa, retratou-se do reconhecimento de Murilo, e afastou as suspeitas sobre este acusado. Disse a vítima que o terceiro agente era bastante diferente do réu Murilo e que confundiu-se na delegacia, induzido pela prisão de Murilo ao volante do veículo.
A testemunha arrolada pelo Ministério Público, relativamente à abordagem da vítima na Av. Rio Branco, endossou as declarações de Márcio, reconheceu José e Antônio e também disse que o outro agente era bem diferente de Murilo.
Os dois policiais militares autores da prisão de José confirmaram o fato, declararam terem encontrado a arma sem munição, os trezentos reais e as drogas no bolso da calça de José e esclareceram que o caixa eletrônico ficava distante do lugar da prisão, sendo certo que José e Márcio não haviam sido seguidos do caixa até o citado local.
O policial autor da prisão de Murilo, por seu turno, confirmou os dados gerais do conhecimento do roubo do carro, por notícia via rádio da viatura, e a prisão do referido acusado, que na mesma hora teria negado qualquer envolvimento com o roubo do automóvel.
Das testemunhas arroladas pelas Defesas foram ouvidas somente duas, por indicação de Murilo. Estas confirmaram que Murilo estava trabalhando na padaria quando Antônio, conhecido assaltante, parou o carro roubado e pediu que Murilo conduzisse o veículo até a Rocinha, quando então alguém o procuraria para receber o veículo. Foi juntado, ainda, o cartão de ponto do trabalho deste acusado, indicando o horário em que Murilo deixou a padaria, seu emprego, em harmonia com as declarações do próprio réu e depoimento das testemunhas que arrolou.
Os acusados, em seus interrogatórios, reiteraram as alegações das respostas preliminares. Murilo, todavia, acrescentou que sabia da fama de “assaltante” de Antônio, mas ainda assim aceitou levar o automóvel até a Rocinha, sem desconfiar de se tratar de carro produto de crime.
Encerrada a instrução probatória, o Ministério Público ofereceu alegações finais e postulou a condenação dos três acusados na forma da denúncia. Sobre a prova produzida por Murilo a acusação salientou que as testemunhas não mereciam crédito, a vítima devia estar intimidada para alterar sua declaração e que as declarações válidas de Márcio seriam aquelas prestadas ao Delegado de Polícia, configurando a prova da responsabilidade penal de Murilo pelo roubo e extorsão.
A Defesa de José insistiu na separação dos processos, na tese do crime único, na desclassificação para furto tentado e, eventualmente, na absorção da extorsão pelo roubo, afastando-se o incremento pelo emprego da arma, pois que esta era imprestável. A Defesa de Antônio persistiu com a tese da negativa de autoria, mas acrescentou que de qualquer maneira não havia provas da ligação de João com o crime de extorsão. Assinalou, ao fim, que se houve roubo do carro, com a prisão em flagrante de Murilo este crime não passara da tentativa. A Defesa de Murilo postulou a desclassificação das condutas para o crime de receptação culposa, sob o fundamento que o réu recebera o carro roubado, mas por imprudência não lograra ter a consciência da origem criminosa do veículo.
A folha penal de Murilo não contempla anotações. A de José registra com exclusividade a condenação pelo crime do artigo 16 da Lei nº. 6.368/76. E a de Antônio aponta condenação definitiva, com trânsito em julgado em 02 de abril de 2011, pela prática de crime de roubo tentado, à pena de um ano, nove meses e dez dias de reclusão e quatro dias-multa, deferindo-se o sursis pelo prazo de dois anos. José e Murilo tinham 30 (trinta) e 21 (vinte e um) anos de idade à época do fato. Antônio tinha 20 (vinte) anos de idade.
É o relatório. Decida.
Márcio é denunciado por tentativa de homicídio porque, agindo com dolo de matar, fez disparos de arma de fogo em Antônio, que foi atingido, mas sobreviveu por causa da pronta intervenção dos médicos do hospital da posse em nova Iguaçu, lugar do fato.
A vítima ficou internada dez dias, sem contato com a autoridade policial, e não havia testemunhas do crime.
Dois dias depois da tentativa de homicídio, Márcio tem sua conversa telefônica com Cláudio, conhecido traficante, interceptada por ordem do juiz da vara criminal de Itaguaí, pois Cláudio estava sendo investigado por suspeita de liderar uma quadrilha de traficantes e receptadores.
O alvo da interceptação era Cláudio. Na conversa interceptada, Márcio se vangloria de ter atirado contra Antônio e diz que agiu por ciúmes, pois Antônio é o atual marido da ex-mulher de Márcio.
Antônio, recuperado, dez dias depois dos fatos identifica seu conhecido Márcio à autoridade policial e com base nisso e nas interceptações, enviadas pelo juiz criminal de Itaguaí ao delegado de nova Iguaçu no dia seguinte à conversa com Cláudio, o Ministério Público denuncia Márcio.
Instada a apresentar resposta, a defesa de Márcio pleiteia a rejeição da denúncia ao argumento de que a prova da interceptação telefônica é ilícita e teria sido determinante na identificação da autoria.
Indaga-se: trata-se, de fato, de prova ilícita e, na hipótese de acolhida esta tese, a denúncia deve ser rejeitada? Responda de forma fundamentada.
Na cidade de Arsenal, no Estado Z, residiam os deputados federais Armênio e Justino. Ambos objetivavam matar Frederico, rico empresário que possuía valiosas informações contra eles. Frederico morava na cidade de Tirol, no Estado K, mas seus familiares viviam em Arsenal. Sabendo que Frederico estava visitando a família, Armênio e Justino decidiram colocar em prática o plano de matá-lo. Para tanto, seguiram Frederico quando este saía da casa de seus parentes e, utilizando-se do veículo em que estavam, bloquearam a passagem de Frederico, de modo que a caminhonete deste não mais conseguia transitar. Ato contínuo, Armênio e Justino desceram do automóvel. Armênio imobilizou Frederico e Justino desferiu tiros contra ele, Frederico. Os algozes deixaram rapidamente o local, razão pela qual não puderam perceber que Frederico ainda estava vivo, tendo conseguido salvar-se após socorro prestado por um passante. Tudo foi noticiado à polícia, que instaurou o respectivo inquérito policial. No curso do inquérito, os mandatos de Armênio e Justino chegaram ao fim, e eles não conseguiram se reeleger. O Ministério Público, por sua vez, munido dos elementos de informação colhidos na fase inquisitiva, ofereceu denúncia contra Armênio e Justino, por tentativa de homicídio, ao Tribunal do Júri da Justiça Federal com jurisdição na comarca onde se deram os fatos, já que, à época, os agentes eram deputados federais. Recebida a denúncia, as defesas de Armênio e Justino mostraram-se conflitantes. Já na fase instrutória, Frederico teve seu depoimento requerido. A vítima foi ouvida por meio de carta precatória em Tirol. Na respectiva audiência, os advogados de Armênio e Justino não compareceram, de modo que juízo deprecado nomeou um único advogado para ambos os réus. O juízo deprecante, ao final, emitiu decreto condenatório em face de Armênio e Justino. Armênio, descontente com o patrono que o representava, destituiu-o e nomeou você como novo advogado.
Com base no cenário acima, indique duas nulidades que podem ser arguidas em favor de Armênio. Justifique com base no CPP e na CRFB.
(1,25 Ponto)
Maria, jovem extremamente possessiva, comparece ao local em que Jorge, seu namorado, exerce o cargo de auxiliar administrativo e abre uma carta lacrada que havia sobre a mesa do rapaz. Ao ler o conteúdo, descobre que Jorge se apropriara de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), que recebera da empresa em que trabalhava para efetuar um pagamento, mas utilizara tal quantia para comprar uma joia para uma moça chamada Júlia. Absolutamente transtornada, Maria entrega a correspondência aos patrões de Jorge.
Com base no relatado acima, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
1 - Jorge praticou crime? Em caso positivo, qual(is)? (Valor: 0,35)
2 - Se o Ministério Público oferecesse denúncia com base exclusivamente na correspondência aberta por Maria, o que você, na qualidade de advogado de Jorge, alegaria? (Valor: 0,9)
(1,25 Ponto)
Tício foi denunciado e processado, na 1ª Vara Criminal da Comarca do Município X, pela prática de roubo qualificado em decorrência do emprego de arma de fogo. Ainda durante a fase de inquérito policial, Tício foi reconhecido pela vítima. Tal reconhecimento se deu quando a referida vítima olhou através de pequeno orifício da porta de uma sala onde se encontrava apenas o réu. Já em sede de instrução criminal, nem vítima nem testemunhas afirmaram ter escutado qualquer disparo de arma de fogo, mas foram uníssonas no sentido de assegurar que o assaltante portava uma. Não houve perícia, pois os policiais que prenderam o réu em flagrante não lograram êxito em apreender a arma. Tais policiais afirmaram em juízo que, após escutarem gritos de “pega ladrão!”, viram o réu correndo e foram em seu encalço. Afirmaram que, durante a perseguição, os passantes apontavam para o réu, bem como que este jogou um objeto no córrego que passava próximo ao local dos fatos, que acreditavam ser a arma de fogo utilizada. O réu, em seu interrogatório, exerceu o direito ao silêncio. Ao cabo da instrução criminal, Tício foi condenado a oito anos e seis meses de reclusão, por roubo com emprego de arma de fogo, tendo sido fixado o regime inicial fechado para cumprimento de pena. O magistrado, para fins de condenação e fixação da pena, levou em conta os depoimentos testemunhais colhidos em juízo e o reconhecimento feito pela vítima em sede policial, bem como o fato de o réu ser reincidente e portador de maus antecedentes, circunstâncias comprovadas no curso do processo.
Você, na condição de advogado(a) de Tício, é intimado(a) da decisão. Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima, redija a peça cabível, apresentando as razões e sustentando as teses jurídicas pertinentes.
(5,0 Ponto)
Quando o Código de Processo Penal admite o uso da videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real para realizar o interrogatório do réu (indique duas hipóteses)?
Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida.
Tendo como referência inicial o artigo do Código de Processo Penal acima transcrito, redija um texto dissertativo a respeito do sistema processual penal adotado no Brasil e das possíveis nulidades que podem ocorrer em caso de violação a esse modelo.
Em seu texto aborde, necessariamente, os seguintes aspectos:
1 - Ordem de formulação de perguntas às testemunhas no procedimento comum ordinário;
2 - Tipo de nulidade em caso de inobservância, pelo magistrado, da ordem de inquirição das testemunhas, segundo o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça.
(30 linhas)
Redija um texto dissertativo que defina interrogatório sub-reptício. Em seu texto, indique duas de suas características principais, bem como as eventuais implicações decorrentes da realização desse tipo de interrogatório nas fases inquisitorial e acusatória.
(até 30 linhas)
Em 02/01/2008, Abel e Lúcio foram acusados de furtar cinco televisores LCD na loja Alfa Eletrodomésticos, localizada no centro da cidade de Cachoeiro de Itapemirim – ES, de propriedade do casal Ana e Breno.
No dia seguinte, ofereceram os aparelhos aos empresários Carlos e Doni, proprietários da loja Beta Eletrodomésticos, situada no mesmo município. Carlos e Doni adquiriram os aparelhos por R$ 200,00 cada, a fim de revendê-los por R$ 1.500,00 em seu estabelecimento comercial.
Quando estavam expondo as mercadorias nas prateleiras de sua loja, Carlos e Doni foram presos por agentes da delegacia de combate a delitos contra o patrimônio, e, após prestarem esclarecimentos no distrito policial, foram prontamente liberados.
A autoridade policial determinou, no mesmo dia, a instauração de inquérito contra os envolvidos. No interrogatório, Carlos afirmou que sabia da origem ilícita dos aparelhos televisores. Esclareceu, ainda, que é pai de Ana, uma das proprietárias da loja Alfa, com quem não tem bom relacionamento desde que ela se casou com Breno. Por fim, informou que sabia que as mercadorias haviam sido subtraídas da loja de Ana.
O interrogatório de Doni foi uníssono ao de Carlos em vários aspectos. Entretanto, Doni acrescentou que os lucros do seu estabelecimento vinham apresentando queda considerável nos últimos anos, em razão da elevada carga tributária, fato que o levou a comprar mercadorias de origem duvidosa. Além disso, o dinheiro que ganhava revendendo mercadorias roubadas ajudava-o a sustentar o seu vício em crack.
Ana e Breno também foram prestar esclarecimentos, na condição de testemunhas. Segundo eles, no dia 03/01/2008, ao chegarem ao seu estabelecimento comercial, inaugurado há um ano, perceberam que uma parede do depósito da loja fora escalada e que cinco televisores LCD haviam sido furtados.
Afirmaram, ainda, serem casados há dez anos em regime de comunhão universal de bens. Confirmaram não ter bom relacionamento com Carlos, pois este tem sérias implicâncias com Breno, mas disseram que nunca haviam tido problemas com Doni. Alegaram, também, que ficaram surpresos ao saber que as mercadorias haviam sido adquiridas conscientemente pelos indiciados. Por fim, informaram que, além do valor das mercadorias subtraídas, experimentaram um prejuízo de R$ 4.500,00 com os danos no prédio.
Foi produzido exame de corpo de delito no local do crime por um único perito oficial, que concluiu que o estabelecimento comercial fora invadido no período noturno por uma pessoa que se utilizou de uma corda para chegar ao telhado e, logo em seguida, abriu um buraco nas telhas, por onde retirou as mercadorias.
Também foram analisadas as imagens do circuito interno de TV da loja. Apesar de toda a ação criminosa ter sido filmada, não foi possível a identificação do invasor.
Foram juntadas aos autos as folhas de antecedentes criminais dos envolvidos, o que permitiu saber que Carlos e Doni haviam sido condenados anteriormente, por duas vezes, com sentenças transitadas em julgado, pela prática de delitos contra o patrimônio. As penas relativas a esses delitos haviam sido extintas dois e três anos antes da presente prisão, respectivamente.
Os televisores foram apreendidos e, posteriormente, devolvidos a Ana e Breno.
Relatado o inquérito, os autos foram remetidos à 1.ª Vara Criminal de Cachoeiro de Itapemirim, que, em seguida, abriu vista ao Ministério Público. O promotor de justiça designado para o caso ofereceu denúncia contra Carlos e Doni pela prática do delito de receptação qualificada — Código Penal (CP), art. 180, § 1.º —, tendo declinado as demais circunstâncias aplicáveis e instruído a inicial acusatória com os autos do inquérito policial.
Durante a instrução do feito, Carlos e Doni negaram, em juízo, a prática dos fatos descritos na denúncia, afirmando que confessaram em sede policial porque foram torturados. Doni foi submetido a avaliação médico-pericial, cuja conclusão mostrou que ele, ao tempo da ação delituosa, não possuía a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato.
Restou comprovado, ainda, que os réus agiram com elevado grau de culpabilidade, que possuem péssima conduta social e têm personalidade voltada para a prática de ilícitos. Carlos tinha 55 anos de idade na data do fato e Doni, 25 anos. Por fim, não há nada nos autos que demonstre que a conduta das vítimas tenha contribuído para a ação criminosa.
Já em fase de conclusão para sentença, foi juntada aos autos cópia da sentença proferida pelo juízo da 2.ª Vara Criminal de Cachoeiro de Itapemirim, que comprova que Abel e Lúcio foram absolvidos da acusação de furto das mercadorias na Loja Alfa Eletrodomésticos, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal (CPP). Aberta vista às partes, estas nada requereram.
Após a regular tramitação processual, o juiz, em sentença absolutória própria, com fundamento no art. 26 do CP, absolveu Doni, em razão de sua dependência de drogas, determinando a extinção de sua punibilidade (CP, art. 107, IX).
Dando aplicabilidade ao art. 383 do CPP, condenou Carlos pela prática do delito de receptação simples (art. 180, caput), argumentando, em síntese, que não é razoável punir mais severamente o agente que atua com dolo eventual se comparado àquele que age com dolo direto.
Por isso, concluiu que, no caso, devia ser afastada a aplicação das penas previstas no § 1.º do art. 180 do CP, devendo incidir as previstas no caput do mesmo dispositivo.
Na primeira fase de aplicação da sanção (CP, art. 59), considerando os maus antecedentes decorrentes das condenações pretéritas, o juiz fixou a pena-base em um ano e um mês de reclusão, em regime aberto, e doze dias-multa, no valor unitário de um trinta avos do maior salário mínimo mensal vigente na data do fato.
Na segunda fase, em razão da confissão espontânea (CP, art. 65, III, d), atenuou a pena para dez meses de reclusão e nove dias-multa, deixando de aplicar a agravante da reincidência (CP, art. 61, I) para não incorrer em bis in idem.
Entendendo inexistir outras circunstâncias agravantes e(ou) atenuantes e causas de aumento e(ou) diminuição, tornou aquela pena definitiva.
Por fim, não acolheu o pedido ministerial de fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelas vítimas, por entender que se trata de pedido de natureza não criminal, que deve, por isso, ser pleiteada em ação cível própria, ressaltando, ainda, que as mercadorias foram devolvidas às vítimas.
A sentença foi publicada no diário da justiça do dia 31/03/2010 (quarta-feira).
Em 02/04/2010, foram opostos embargos de declaração pela acusação, a fim de que fossem supridas diversas omissões no julgado, e pela defesa, requerendo a integração do decisum no intuito de obter a absolvição do réu, sob o argumento de que a suposta receptação é, na verdade, fato atípico, pois não restou comprovada a participação da autoria delitiva por parte de Abel e Lúcio no crime de furto, conforme informação do juízo da 2.ª Vara Criminal.
Alegou-se, ainda, que incide, no caso, a regra do art. 181, II, do CP, e que a ação penal padece de nulidades pelo fato de o exame de corpo de delito ter sido produzido por um único perito e por não ter havido a suspensão do processo até o trânsito em julgado da decisão proferida nos autos da ação instaurada contra Abel e Lúcio.
Após a apresentação das petições de contrarrazões pelas partes, os embargos da defesa foram acolhidos pelo juízo sentenciante, com efeitos modificativos, tendo sido decretada a absolvição de Carlos, com fundamento no art. 386, III, do CPP. Por consequência, o juízo deixou de apreciar as demais teses debatidas pelas partes, declarando-as prejudicadas.
A decisão foi publicada em 27/05/2010 (quinta-feira), tendo sido feitas pela secretaria do juízo todas as intimações necessárias nesse mesmo dia.
Os autos foram entregues com vista na promotoria de justiça daquele município capixaba em 01/06/2010 (terça-feira). O promotor de justiça deu-se por ciente pessoalmente nos autos em 04/06/2010 (sexta-feira).
Com base na situação hipotética apresentada acima, na qualidade de promotor de justiça do município de Cachoeiro de Itapemirim, elabore a peça processual adequada, devidamente embasada na legislação, na doutrina e(ou) na jurisprudência. Alegue toda matéria de direito processual e material pertinente à acusação. Não crie fatos novos, tomando por verdadeiros aqueles narrados na questão.
Date a peça no último dia do prazo de interposição para o Ministério Público, considerando que todos os períodos de segunda a sexta-feira são dias úteis.
(5,0 Pontos)
(até 150 linhas)