O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra JOSÉ --, MARIA--, PAULO --, ROGÉRIO --, ANTÔNIO-- e CRISTINA--, imputando-lhes a prática dos crimes de associação para o tráfico de drogas (art. 35 da lei 11343/06), tráfico internacional de drogas (art. 33 da Lei 11343/06) e lavagem de capitais (art. 1º da Lei 9613/98).
Narra a denúncia, in verbis:
(INÍCIO da transcrição da DENÚNCIA)
“Quanto aos crimes de associação para tráfico de drogas e tráfico internacional de drogas
Pelo menos entre os meses de janeiro e dezembro de 2022 os denunciados associaram-se para o fim de importar, exportar, preparar, ter em depósito, transportar e remeter grande quantidade de cocaína da Bolívia para o Brasil e do Brasil para Portugal.
O grupo criminoso promoveu, com êxito, pelo menos duas grandes remessas de drogas do Porto de Itaguaí no Rio de Janeiro para o Porto de Leixões, em Portugal, nos dias 15.2.22 e 20.7.22. Tais carregamentos não foram apreendidos, tendo tais fatos sido relatados pelo corréu ROGÉRIO, e confirmados por registros de câmeras de segurança do Porto de Itaguaí e pelos documentos de exportação que acompanharam os containers em que a droga foi acondicionada.
A droga era mantida em depósito em armazém localizado em Seropédica, Rio de Janeiro, e acondicionada em containers usados para a exportação de cereais pela empresa Grãos do Brasil LTDA, de propriedade dos denunciados JOSÉ e MARIA. No dia 23.12.22, operação da Polícia Federal localizou e apreendeu 230 quilos de pasta de cocaína em containers no Porto de Itaguaí, Rio de Janeiro, tendo efetuado a prisão em flagrante de ANTÔNIO, que estava no local.
A investigação teve início em 10.8.22, com a prisão em flagrante de ROGÉRIO, que teve seu veículo vistoriado em blitz de rotina, realizada pela Polícia Militar, na Avenida das Américas, Barra da Tijuca, Rio de Janeiro. No automóvel de ROGÉRIO foram encontrados dois quilos de pasta de cocaína e 30 mil reais em dinheiro. ROGÉRIO foi preso em flagrante e prestou depoimento a promotores de justiça do MPRJ, acompanhado de advogado, tendo confessado os fatos e admitido que integrava um grupo que se dedicava ao tráfico de drogas, e dispôs-se a fornecer informações sobre seu funcionamento. Após tal depoimento, ROGÉRIO foi levado à audiência de custódia perante juiz de direito, audiência na qual, em face da concordância do promotor de justiça, o juiz concedeu liberdade provisória a ROGÉRIO, que passou a colaborar com as investigações. A partir daí, ROGÉRIO encontrou-se com os demais membros do grupo em diversas ocasiões, tendo efetuado gravações ambientais de conversas travadas com eles, que atestaram a dinâmica das atividades criminosas. Após analisar o conteúdo das mídias, o MPRJ enviou o material ao MPF, em embalagem lacrada, acompanhada de termo circunstanciado de seu conteúdo, dado terem sido produzidas evidências da prática de crime de tráfico internacional de drogas e lavagem de dinheiro transnacional. As mídias recebidas pelo MPF foram anexadas aos autos do inquérito instaurado pela Polícia Federal para apurar os fatos, mediante termo circunstanciado de apensamento e certidão nos autos.
Com base no material produzido por ROGÉRIO, o juízo federal competente autorizou o monitoramento telefônico dos investigados, tendo tal medida probatória sido regularmente prorrogada a cada quinze dias, no período de 15.9.22 a 23.12.22.
JOSÉ é empresário e líder do grupo, tendo providenciado a compra de 230 quilos de pasta de cocaína, em Puerto Suárez, na Bolívia, em 15.11.22, e contratado o motorista PAULO, para fazer o transporte terrestre da droga até o Rio de Janeiro.
MARIA é mãe de JOSÉ e sócia da empresa Grãos do Brasil LTDA, figurando no contrato social como sócia gerente, com 50% de participação societária, tendo contribuído decisivamente para toda a empreitada criminosa.
PAULO dirigiu a carreta de sua propriedade, placa ABC123, de Puerto Suárez até o Rio de Janeiro, tendo efetuado o descarregamento da droga de seu veículo, juntamente com os denunciados ROGÉRIO e ANTÔNIO, na noite do dia 19.11.22, a qual foi deixada em depósito em armazém localizado em Seropédica-RJ. ROGÉRIO efetuou o pagamento de R$ 50.000,00 a PAULO pelo serviço de transporte realizado, tendo este retornado no mesmo dia para Corumbá, onde reside.
Nos dias 05, 06 e 07 de dezembro de 2022, ROGÉRIO e ANTÔNIO providenciaram o transporte e acondicionamento da droga em containers pertencentes a Grãos do Brasil LTDA, burlando a fiscalização das autoridades alfandegárias. Os dois eram empregados da referida empresa, sendo que ANTÔNIO figurava como representante da Grãos do Brasil LTDA junto ao Porto de Itaguaí, competindo-lhe a adoção das providências burocráticas necessárias à exportação de cereais para Portugal.
A remessa da droga para Portugal ocorreria em 23.12.22, tendo sido interrompida pela deflagração de operação da Polícia Federal, com o cumprimento de mandados de prisão preventiva e de busca e apreensão expedidos pelo juízo federal competente. A droga apreendida foi periciada, tendo sido atestado tratar-se de 230 quilos de pasta de cocaína
(laudo pericial de fls).
Quanto ao crime de lavagem de dinheiro
Constatou-se que a importância de U$ 3.000.000,00 (três milhões de dólares), recebida em pagamento pela venda de substância entorpecente pelo grupo criminoso ao longo do ano de 2022, foi depositada em uma offshore localizada no Paraguai, posteriormente remetida a contas bancárias da Construtora Casa Peixoto Ltda, empresa sediada no Rio de Janeiro, de propriedade de CRISTINA.
Após, foram identificados saques em espécie por parte de João e Aparecida, os quais funcionaram como laranjas no esquema de lavagem de dinheiro, a mando de ANTÔNIO, conforme depoimentos prestados no inquérito policial. Na investigação constatou-se que João e Aparecida são pessoas de baixa instrução e não compreendiam o caráter ilícito de suas condutas nem sabiam que os valores sacados eram produto de crime, motivo pelo qual não foram denunciados.
Diálogos telefônicos travados entre CRISTINA e JOSÉ evidenciaram que CRISTINA disponibilizou sua empresa para a lavagem de dinheiro produto do tráfico de drogas, com pleno conhecimento da origem ilícita dos valores, tendo recebido depósitos em conta de sua titularidade no exterior, a mando de JOSÉ, em contrapartida por tal atividade.
Relatórios produzidos pelo COAF e encaminhados ao Ministério Público Federal atestaram transações financeiras atípicas pelos denunciados JOSÉ e ANTÔNIO. Com base em tais relatórios, o juiz federal deferiu a quebra de sigilo fiscal dos mesmos denunciados, tendo sido constatada variação patrimonial a descoberto nos anos fiscais de 2020, 2021 e 2022.
Isto posto, requer o Ministério Público Federal que os ora denunciados sejam citados e processados e, ao final, sejam condenados nos seguintes termos:
1. JOSÉ e ANTÔNIO, como incursos nas penas dos artigos 33 e 35 da Lei 11343/06 e art. 1º da Lei 9613/98.
2. MARIA, PAULO e ROGÉRIO, como incursos nas penas dos artigos 33 e 35 da Lei 11343/06.
3. CRISTINA, como incursa nas penas do art. 35 da Lei 11343/06 e art. 1º da Lei 9613/98.
Requer por fim o Ministério Público Federal o sequestro de todos os bens imóveis pertencentes aos denunciados e bloqueio de todos os ativos financeiros dos denunciados e das empresas Grãos do Brasil LTDA e Construtora Casa Peixoto Ltda, utilizadas na prática dos crimes objeto da denúncia, visando a efetividade da pena de perdimento”.
(FIM DA DENÚNCIA)
A denúncia foi recebida em 10.1.23. Na mesma decisão, o juízo revogou as prisões cautelares de todos os denunciados, concedendo a liberdade provisória, com arbitramento de fiança, e deferiu as medidas de constrição patrimonial requeridas pelo MPF.
Os réus foram citados e apresentaram respostas escritas, arguindo preliminares e requerendo sua absolvição sumária. Os pleitos defensivos não foram acolhidos pelo juízo.
Procedeu-se à Audiência de Instrução e Julgamento, tendo sido tomados os depoimentos das testemunhas arroladas pela acusação e pelas defesas. No interrogatório, o réu ROGÉRIO admitiu os fatos que lhe foram imputados e detalhou o esquema criminoso e a participação dos demais na empreitada criminosa. A ré CRISTINA admitiu ter realizado as transações financeiras descritas na denúncia, mas afirmou não ter conhecimento de que se tratava de dinheiro obtido com tráfico de drogas. Os demais réus negaram os fatos que lhes foram atribuídos.
Em alegações finais, o Ministério Público Federal requereu a condenação de todos os réus nos termos da denúncia. Requereu a incidência de causa de aumento de pena decorrente da transnacionalidade, para todos os réus condenados pelos crimes de tráfico de drogas e associação para tráfico de drogas, na forma do art. 40, I, da lei 11343/06.
Requereu a incidência em favor de ROGÉRIO de causa de redução de pena decorrente de sua colaboração, no patamar de 1/3, na forma do art. 41 da lei 11343/06. Requereu a decretação de perdimento de todos os bens e ativos financeiros constritos, por terem sido obtidos com a prática de tráfico de drogas, ressaltando que as pessoas jurídicasatingidas pelas medidas de constrição patrimonial foram utilizadas para prática dos crimes de tráfico de drogas e lavagem de capitais. Requereu a decretação da prisão preventiva de todos os réus, dada a gravidade em concreto dos crimes praticados e o risco de fuga, pois se trata de pessoas que certamente possuem altas quantias de dinheiro mantidas em contas no exterior.
Em alegações finais, a defesa de JOSÉ alegou as seguintes preliminares: 1. A nulidade das gravações ambientais feitas pelo corréu ROGÉRIO, dado terem sido feitas por provocação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, que claramente não possuía atribuição legal para conduzir a investigação de crimes federais; 2. A nulidade das gravações ambientais feitas pelo corréu ROGÉRIO, tendo em vista terem sido produzidas sem autorização judicial. 3. A nulidade da técnica de investigação consistente no uso de agente infiltrado, tendo em vista a falta de previsão legal e de autorização judicial. 4. A nulidade de todas as provas que derivaram de tais gravações e seu desentranhamento, notadamente as interceptações telefônicas e a apreensão da substância entorpecente. 5. A nulidade dos relatórios da COAF juntados aos autos, tendo em vista terem sido encaminhados ao MPF sem autorização judicial. Em decorrência, a nulidade da quebra de sigilo fiscal dos réus, pois é prova derivada dos relatórios produzidos pelo COAF. No mérito, requereu sua absolvição quanto ao crime do art. 35 da lei 11343/06, dado que uma única apreensão de drogas não é suficiente para caracterizar uma associação organizada com estabilidade para a prática de crimes. Requereu sua absolvição quanto a todos os crimes imputados, dado que, excluídas as provas ilícitas, a mera palavra de corréu colaborador não é suficiente para lastrear decreto condenatório. Subsidiariamente, no que tange à dosimetria, a não incidência da causa de aumento de pena do art. 40, I, da lei 11343/06, dado que tal pedido não foi formulado na denúncia. Requereu ademais a desclassificação típica do delito associativo, devendo incidir o art. 2º, da lei 12850/13, e não o art. 35 da lei 11343/06, por se tratar de lex mitior posterior.
Em alegações finais, a defesa de MARIA alegou a inépcia da denúncia, já que não lhe foi imputada qualquer conduta típica, pois a única acusação formulada contra ela é integrar o contrato social da empresa Grãos do Brasil LTDA, empresa que é de fato administrada por seu filho. Aduz que não participou dos fatos criminosos, requerendo sua absolvição.
Em alegações finais, a defesa de PAULO requereu sua absolvição. Quanto ao crime do art. 35 da lei 11343/06, aduziu que sua participação nos eventos narrados na denúncia foi eventual, tendo prestado um serviço de transporte para JOSÉ, mediante pagamento. Alegou ademais que não tinha conhecimento da natureza ilícita da carga transportada, não tendo agido com dolo de traficar substância entorpecente de comercialização ilícita.
Em alegações finais, a defesa de ROGÉRIO aduziu que a sua colaboração foi efetiva e determinante para o desbaratamento da associação criminosa e para a apreensão do carregamento de drogas que seriam remetidas ao exterior, fazendo jus ao perdão judicial, e não a mera redução de pena, como pretende o MPF.
Em alegações finais, a defesa de ANTÔNIO alegou que este praticou os fatos a mando de JOSÉ, não lhe podendo ser exigida conduta diversa. Ademais sua participação nos fatos foi de menor importância.
Em alegações finais, CRISTINA sustentou que não está evidenciada sua participação em associação criminosa para tráfico de drogas; que conhecia apenas JOSÉ e lhe prestava serviço de internalização de capital mantido no exterior, não mantendo qualquer contato com os demais integrantes do suposto grupo criminoso. Afirma que não tinha conhecimento de que o dinheiro movimentado era produto de crime já que não era informada das atividades da empresa Grãos do Brasil Ltda por JOSÉ. Ausente o dolo de lavar dinheiro ilícito, requereu sua absolvição.
Todas as defesas requereram o indeferimento do pedido do MPF de que fossem decretadas prisões cautelares, em razão do princípio da presunção de inocência. E ainda a não decretação do confisco de bens, pois o MPF não se desincumbiu do ônus de provar que foram adquiridos com a prática de crimes. Os autos vieram conclusos para sentença.
Profira sentença, adotando o relatório acima, que não precisa ser transcrito edando os fatos nele narrados como comprovados. A sentença deve conter todos os elementos e requisitos legais.
Quanto ao assunto self laundering, explique sobre a imputação simultânea, ao mesmo réu, do delito antecedente e do crime de lavagem, e os requisitos necessários para que não ocorra o fenômeno da consunção, segundo a orientação da Corte da Cidadania.
(Valor: 1 ponto)
(20 linhas)
A prova foi realizada com consulta a códigos e(ou) legislação.
Explique, brevemente, a teoria do criminoso de colarinho branco, apontando a sua eventual pertinência etiológica no Brasil contemporâneo.
(20 Linhas)
(10 Pontos)
Considere os seguintes casos e responda às questões abaixo:
Caso I: "A", um deputado federal recém-eleito, queria fazer diferente da "velha política", mostrar serviço para sua base eleitoral e, principalmente, mudar a vida das pessoas. Para tanto, chamou seu amigo e colega de partido, "B", e lhe propôs o seguinte:
"Eu tenho uma base eleitoral forte nos municípios do interior do estado e essa base exige melhorias sejam feitas nas cidades. Portanto, vá até os municípios X,Y e Z, e diga aos prefeitos que irei liberar verbas das minhas emendas parlamentares para a realização de obras públicas de infraestrutura. Esta tarefa será uma oportunidade para você me mostrar sua habilidade política e, caso se saia bem poderei nomeá-lo como meu assessor".
"B", vislumbrando a chance de crescer na carreira e alcançar estabilidade financeira, aceitou o combinado. "B", porém, teve ideia que lhe renderia certo volume de dinheiro em curto prazo. Assim, ao falar com os três prefeitos, "B" afirmou, conforme havia sido orientado, que o Deputado "A" iria liberar as verbas de suas emendas parlamentares para que fossem feitas obras de infraestrutura. Porém, acrescentou que "A" teria condicionado tal liberação ao pagamento de 5% sobre o valor de cada contrato administrativo firmado para a realização das obras, e complementou dizendo que os pagamentos seriam feitos a ele, "B", que, posteriormente, os repassaria para "A".
Os três prefeitos aceitaram os termos do que havia sido proposto. As licitações foram realizadas, os percentuais combinados foram desviados a favor de "B", que ficou com o dinheiro e, como planejara, não o repassou a "A".
A - Relativamente ao caso I, examine, de modo fundamentado e mencionando os dispositivos legais e as categorias dogmáticas pertinentes, a responsabilidade penal de "A" e "B", pelo crime de corrupção passiva (art. 317 do Código Penal).
Caso II: Na seguinte variação do Caso I, "A" determinou que "B" dissesse aos prefeitos, em seu nome, que a liberação das verbas estaria condicionada ao pagamento de 5% sobre o valor de cada contrato administrativo. Para se blindar de qualquer suspeita, "A" determinou ainda que "B" solicitasse aos prefeitos que os valores fossem pagos por meios de transferências em criptomoedas, sem qualquer intermediário envolvido, e que indicasse "C", sujeito que realizava mineração de criptomoedas e que estava disposto aa vendê-las por altos valores em dinheiro, como o contato para que os prefeitos comprassem as criptomoedas e transferissem para "A".
"B" realizou exatamente o que "A" determinou e a proposta foi aceita pelos prefeitos. Assim, três licitações foram realizadas, uma em cada contrato em espécie das contas das prefeituras, compraram as criptomoedas com "C" e as transferiram para a chave pessoal e intransferível de "A".
B - Relativamente ao Caso II, que é, como referido, uma variação do Caso I, examine, de modo fundamentado e mencionando os dispositivos legais e as categorias dogmáticas pertinentes, a responsabilidade penal de "A" e "B" pelo crime de corrupção passiva (art. 317 do Código Penal) e de "A" e "C" pelo crime de lavagem de dinheiro (art. 10, caput, da Lei n.º 9.613/98)
Disserte sobre:
A RECUPERAÇÃO DE ATIVOS NO COMBATE À LAVAGEM DE DINHEIRO
Ao elaborar seu texto, aborde:
A – Conceito e finalidade. A atuação do Delegado de Polícia frente à recuperação de ativos.
B – Medidas assecuratórias. Possibilidade no Inquérito Policial.
C – A apreensão no contexto das medidas assecuratórias.
D – Confisco alargado. Significado. Requerente. O Delegado de Polícia e a coleta de elementos que propiciam a aplicação do instituto.
(60 linhas)
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) recebe um Relatório de Inteligência Financeira (RIF) oriundo do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).
Em análise do relatório, o agente ministerial do MPDFT visualiza que o RIF indica lavagem de dinheiro decorrente de sonegação fiscal que veio apontada em Relatório de Informação Fiscal oriundo do órgão fazendário do Distrito Federal. Neste último relatório, está detalhada a ocorrência de infrações penais contra a ordem tributária tipificadas no artigo 1, incisos I, II e V, da Lei nº 8.137/90.
O agente ministerial do MPDFT também possui indicação consistente da respectiva autoria.
Considerando a situação narrada, responda: há justa causa para o oferecimento de denúncia por crime do artigo 1º da Lei nº 9.613/98? Justifique.
(15 Pontos)
(30 Linhas)
Alibabá, nascido em 2.1.1947, filho de Leopoldina, dono da construtora Mil Tendas, do Hotel Mirante da Lua e do Supermercado Preço Fino, este com sedes em Marte/SC, Júpiter/SC e Netuno/SC, foi eleito para comandar Marte/SC, tomando posse em janeiro de 2017. Em 12.9.2017 ingressou na Procuradoria-Geral de Justiça uma representação firmada pelo Vereador Robin, indicando que Alibabá, desde o início de seu mandato, teria se associado com um grupo de pessoas, entre empresários, servidores públicos municipais com cargos comissionados e também efetivos, com o intuito de praticar delitos em prejuízo ao erário.
A notícia crime informou que Alibabá teria nomeado com esse propósito, as seguintes pessoas para cargos comissionados na prefeitura municipal: Alcapone, nascido em 23.4.1970, filho de Virgínia, para chefe de gabinete; Marina, nascida em 15.4.1988, filha de Lourdes, para Secretária de Administração; Virgulino, nascido em 23.2.1970, filho de Maria, para Secretário de Obras; Firmino, nascido em 27.7.1968, filho de Elizabeth, para Secretário de Educação; Lampião, nascido em 14.3.1948, filho de Wanda, para Diretor de Licitações, afeto à Secretaria de Administração.
Além desses nomeados, a notícia indicava que estariam envolvidos os servidores públicos efetivos de Marte/SC: Jeferson (nascido em 31.3.1955, filho de Kátia), presidente da comissão de licitações; Gustavo (nascido em 18.4.1992, filho de Nilze), servidor integrante da comissão de licitações.
O expediente asseverava o envolvimento no esquema criminoso dos empresários: Félix, nascido em 13.12.1979, filho de Dorvalina, sócio proprietário da construtora Vilas Secas; Demóstenes, nascido em 17.9.1966, filho de Alvina, sócio proprietário da construtora Dias Melhores; Daniel, filho de Demóstenes e de Vilma, nascido em 1.12.1999, também sócio proprietário da construtora Dias Melhores; e Ana, filha de Débora, nascida em 24.5.1986, sócia proprietária da construtora Piso Certo.
A representação encaminhada ao Subprocurador-Geral de Justiça para Assuntos Jurídicos, diante de delegação do Procurador-Geral de Justiça, foi autuada como notícia de fato, que, imediatamente, passou a ser instruída a fim de se permitir a formação de juízo de valor, sendo determinada a realização de diligências preliminares, especialmente análise dos bancos de dados disponíveis para avaliação da verossimilhança do fato.
Por meio de análise do Portal Transparência do município de Marte/SC, confirmou-se que as pessoas identificadas como servidores públicos realmente ocupavam os cargos efetivos e comissionados (analisando seus contracheques), bem como que o município teria efetuado nos dois primeiros quadrimestres de 2017, três grandes contratos com as empresas indicadas, gerando um pagamento de valores próximos a R$20.000.000,00, em obras para o parque industrial da cidade.
Em continuidade, verificou-se informação no site da prefeitura que a Diretoria de Licitações, por meio de Lampião, teria lançado três licitações, na modalidade de Concorrência Pública, com critério de julgamento do tipo menor preço global, pelo regime de empreitada por preços unitários, cujos editais teriam sido publicados no Diário Oficial do Estado do dia 22.11.2017.
As licitações versavam sobre: a contratação de empresa para a construção de escola básica municipal Crescendo e Aprendendo (concorrência nº 5/2017), solicitada pelo secretário de educação; contratação de empresa para a construção da ponte metálica sobre o Rio Adriático (concorrência nº 6/2017); e a contratação da pavimentação asfáltica de estrada vicinal de Marte/SC (concorrência nº 7/2017), as duas últimas solicitadas pelo secretário de obras.
As três licitações receberam autorização de Alibabá e indicavam a origem dos recursos para as despesas, metade municipais e metade oriundos de verbas estaduais, não havendo aporte de recursos federais.
Em 11.12.2017, mediante portaria fundamentada, foi instaurado o Procedimento Investigatório Criminal - PIC nº 8/2017, da Subprocuradoria-Geral de Justiça para Assuntos Jurídicos, que, a título de diligências, determinou a requisição de auxílio de força policial (integrada pelos agentes Alex, Fábio, George, Max e Luiz) para colaborar com as investigações e efetuar o levantamento das pessoas físicas e jurídicas envolvidas (endereços, mídias sociais, informações públicas), sem prejuízo de outros elementos pertinentes, o que foi efetivado por meio de relatório pormenorizado após análise dos bancos de dados e diligências de campo, sugerindo, por causa da contemporaneidade das licitações, a efetivação de cautelares preparatórias, diante da clandestinidade das condutas de quem comete esse tipo de infração.
Baseado nesse relatório foram solicitadas medidas de interceptação telefônica, telemática, ação controlada e quebra de dados armazenados em nuvens.
Os pedidos foram deferidos pelo Poder Judiciário no primeiro dia de expediente forense de 2018, iniciando-se o monitoramento dos investigados, bem como obtidos seus e-mails, atuais (durante o prazo de 15 dias) e pretéritos, restando alvo de seguidas prorrogações, em atenção a decisões judiciais devidamente fundamentadas.
No início da interceptação telefônica foram flagradas conversas entre Alibabá com seus subordinados Alcapone, Virgulino e Marina, ajustando reunião com Félix e Demóstenes para tratar das três licitações em curso.
Na reunião realizada no dia 16.1.2018, na cidade de Júpiter/SC, em restaurante próximo ao Supermercado Preço Fino, a força policial conseguiu captar imagens confirmando a presença de Alibabá, Alcapone, Félix, Demóstenes, Daniel e Ana, esta convidada na tarde anterior por Alibabá, em diálogo registrado na plataforma de gravações.
No dia seguinte, foram observados diálogos entre os envolvidos na reunião, revelando a divisão das três obras entre as construtoras, ficando explicitado, ainda, que os serviços da empresa Piso Certo seriam efetuados pela empresa Mil Tendas (de Marte/SC).
As propostas foram abertas nos dias 5, 6 e 7 de fevereiro de 2018, para, respectivamente, os editais das concorrências nº 5/2017, 6/2017 e 7/2017, constatando-se que a comissão de licitação era composta por Jeferson (presidente), Lampião e Gustavo como membros.
Nos três processos licitatórios compareceram Félix, Daniel e Ana, os quais apresentaram seus envelopes com propostas e documentos de habilitação no dia 4.2.2018, além de Pedro (nascido em 15.8.1988, filho de Malvina) e Guilherme (nascido em 14.3.1971, filho de Danielle), sócios proprietários das construtoras Touro e Hilux.
Na reunião, após dirimidas algumas dúvidas, constatou-se que não houve inabilitados ou impugnações dos licitantes, passando-se a abertura dos envelopes com as propostas, que estavam em conformidade com as regras do edital, julgando-se as licitações com as seguintes classificações:
a) concorrência nº 5/2017: 1º Construtora Vilas Secas vencedora com o valor de R$18.000.000,00; 2º Construtora Touro com R$18.100.000,00; 3º Construtora Piso Certo com R$19.000.000,00; 4º Construtora Dias Melhores com R$21.000.000,00 e 5º Construtora Hilux com R$21.300.000,00;
b) concorrência nº 6/2017: 1º Construtora Dias Melhores vencedora com o valor de R$16.000.000,00; 2º Construtora Touro com R$16.250.000,00; 3º Construtora Vilas Secas com R$17.000.000,00; 4º Construtora Piso Certo com R$19.000.000,00 e Construtora Hilux com R$19.300.000,00;
c) concorrência nº 7/2017: 1º Construtora Piso Certo vencedora com o valor de R$16.000.000,00; 2º Construtora Hilux com R$16.030.000,00; 3º Construtora Touro com R$17.000.000,00; 4º Construtora Vilas Secas com R$19.000.000,00 e Construtora Dias Melhores com R$20.000.000,00.
O resultado da licitação foi comunicado pelo presidente e foi homologado pela secretária de administração e pelo prefeito, publicando-se o aviso de resultado das licitações no mural da prefeitura, no Diário Oficial do Estado e em jornais de circulação locais e regionais.
Os contratos com as construtoras vitoriosas foram celebrados em 25.2.2018 (contratos nº: 1/2018, 2/2018 e 3/2018 respectivamente referentes aos editais nº 5/2017, 6/2017 e 7/2017), estabelecendo-se o mesmo prazo de 24 meses para conclusão das obras, cujos pagamentos seriam realizados de acordo com o cronograma de evolução de cada etapa, após as competentes e necessárias medições.
Em 2.5.2018, Alibabá, Marina e Firmino (este apenas para o contrato nº 1/2018) assinaram com as construtoras termos aditivos elevando o custo dos contratos em 25%, tornando os valores finais para o nº 1/2018 em R$22.500.000,00 e R$20.000.000,00 para os outros dois.
Os aditivos foram assinados com base em acordo das partes (prefeito e empresários) com o falso propósito de restabelecer a relação pactuada inicialmente e manter o equilíbrio econômico financeiro dos contratos.
Os ajustes foram fundamentados em pareceres de Virgulino, que informou, falsamente, fatos imprevisíveis e retardadores que impediriam a execução do ajustado e que demandariam a alteração de alguns quantitativos dos materiais das obras. Tal manobra era de conhecimento de Alibabá, verdadeiro mentor da ideia, e de Marina que iniciara o processo dos aditamentos.
Os termos acabaram sendo firmados pelo procedimento denominado “jogo de planilha”, que consiste no aditamento dos contratos com a majoração dos itens que estavam acima do preço de mercado nas propostas (assunto alvo de conversas telefônicas entre Demóstenes e Félix com Alcapone e Virgulino) e redução dos itens que se apresentavam com preços inferiores aos parametrizados, gerando um superfaturamento de 25% no custo das obras.
No ano de 2018 foram efetuados três pagamentos para cada contrato, com os seguintes valores em cada medição:
a) contrato nº 1/2018 foram pagos R$3.000.000,00 em 05.2018; R$4.000.000,00 em 08.2018; e R$6.000.000,00 em 12.2018;
b) contrato nº 2/2018 foram pagos R$3.000.000,00 em 05.2018; R$4.000.000,00 em 08.2018 e R$5.000.000,00 em 12.2018;
c) contrato nº 3/2018 foram pagos R$3.000.000,00 em 05.2018, R$4.000.000,00 em 08.2018 e R$5.000.000,00 em 12.2018.
Ainda em 2018, a força policial efetuou pelo menos dez diligências de campo, constatando em relatório de investigação, inclusive com filmagens, que as obras do contrato nº 3/2018 estavam sendo executadas por funcionários da empresa Mil Tendas e com uso da retroescavadeira, motoniveladora, escavadeira hidráulica, rolos compactador pé-de-carneiro e liso, além de caminhões pipa da Prefeitura de Marte/SC, consoante determinado por Alibabá em diálogos cifrados com Alcapone e Virgulino.
O relatório inicial ainda evidenciara que a empresa Piso Certo possuía poucos empregados cadastrados no Ministério do Trabalho, motivando o monitoramento no período do contrato, constatando-se que eles estavam trabalhando em obra particular da empresa no mesmo período em que se executava a pavimentação asfáltica, consoante filmagens datadas de 25.4.2018, 21.8.2018 e 30.10.2018.
Em janeiro de 2019 acostou aos autos o relatório da interceptação telemática e da análise do conteúdo do iCloud, que explicitou, entre outros elementos, que:
1 - em 3.2.2018 Lampião encaminhou e-mail informando a Alcapone que Gustavo e Jeferson, conforme pactuado, teriam conseguido deslacrar os envelopes das empresas Touro e Hilux, divulgando os valores das propostas das três licitações e assegurando que conseguiram relacrar os envelopes sem deixar qualquer sinal de violação;
2 - ainda em 3.2.2018, Alcapone repassa o e-mail com as informações dos valores das propostas para Félix, Daniel e Ana, com cópia para Alibabá e Virgulino;
3 - nos dados de nuvens extraídos do iCloud de Daniel, no mesmo período – início de fevereiro de 2018 - verificou-se a existência de um grupo de whatsapp denominado Construindo Juntos, em que participavam Daniel e seu pai, Alibabá, Félix e Ana, além de conversas ajustando quem iria ganhar cada licitação com indicação dos valores das obras, diante das informações das propostas dos concorrentes, inclusive com a assertiva do aditamento e da realização do trabalho pela empresa Mil Tendas.
A partir das informações das cautelares e dos pagamentos firmados pela Prefeitura de Marte/SC, em 5.2.2019 o Ministério Público solicitou o afastamento dos sigilos fiscal e bancário dos investigados, mediante o Sistema de Movimentação Bancária – SIMBA (conjunto de processos, módulos e normas para tráfego de dados bancários entre instituições financeiras e órgãos governamentais) e para facilitar a análise e autenticidade dos dados.
A quebra do sigilo bancário evidenciou que as empresas Vilas Secas, Dias Melhores e Piso Certo teriam recebido em suas contas correntes do Banco do Brasil os valores relativos aos pagamentos dos contratos em 30.5.2018, 30.8.2018 e 28.12.2018.
Verificou-se que nos primeiros seis dias de junho de 2018 foram efetuados: 1) 5 saques no valor de R$30.000,00 cada, totalizando R$150.000,00 da conta da Vilas Secas, bem como em 6.6.2018 teriam sido transferidos R$450.000,00 para a conta da empresa de consultoria Consulta Ativa, de propriedade de Pamela (nascida em 19.8.1990, filha de Sara e amante de Alcapone); 2) 5 saques no valor de R$30.000,00 cada, totalizando R$150.000,00 da conta da Dias Melhores, bem como em 6.6.2018 foram transferidos R$450.000,00 para a conta da Consulta Ativa; 3) 5 saques no valor de R$30.000,00 cada, totalizando R$150.000,00 da conta da Piso Certo, bem com teriam sido quitados por meio dessa conta, R$2.550.000,00 em boletos de cinco fornecedores da Mil Tendas (Mineradoras Teclado, Lucas, Marciano e Olarias Perfeita e Pedreta, no valor de R$255.000,00, cada) e de cinco fornecedores do Supermercado Preço Fino (Atacadistas Dunlop, Marvel, Bozo e Destilarias Maia e Saraiva, no valor de R$255.000,00 cada).
Apurou-se, ainda, que foram aplicados R$300.000,00 no dia 6.6.2018, em fundos de investimento da empresa de Ana. A quebra de sigilo bancário revelou com relação ao segundo pagamento dos contratos, que nos primeiros seis dias de setembro de 2018 foram efetuados:
I - 5 saques no valor de R$40.000,00 cada, totalizando R$200.000,00 da conta da Vilas Secas, bem como em 6.9.2018 teriam sido transferidos R$600.000,00 para a conta da Consulta Ativa;
II - 5 saques no valor de R$40.000,00 cada, totalizando R$200.000,00 da conta da Dias Melhores, além de transferidos R$600.000,00 em 6.9.2018 para a conta da Consulta Ativa;
III - 5 saques no valor de R$40.000,00 cada, totalizando R$200.000,00 da conta da Piso Certo, bem com teriam sido quitados por meio dessa conta, R$3.400.000,00 em boletos de cinco fornecedores da Mil Tendas (Mineradoras Teclado, Lucas, Marciano e Olarias Perfeita e Pedreta, no valor de R$340.000,00, cada) e de cinco fornecedores do Supermercado Preço Fino (Atacadistas Dunlop, Marvel, Bozo e Destilarias Maia e Saraiva, no valor de R$340.000,00 cada), além de terem sido aplicados R$400.000,00 no dia 6.9.2018, em fundos de investimento da empresa de Ana.
Já em relação ao terceiro pagamento dos contratos, a quebra de sigilo bancário revelou que nos seis primeiros dias de janeiro de 2019 foram efetuados:
I - 5 saques no valor de R$49.000,00 cada, totalizando R$245.000,00 da conta da Vilas Secas, bem como em 6.1.2019 teriam sido transferidos R$900.000,00 para a conta da Consulta Ativa;
II - 5 saques no valor de R$40.000,00 cada, totalizando R$200.000,00 da conta da Dias Melhores, bem como em 6.1.2019 teriam sido transferidos R$750.000,00 para a conta da Consulta Ativa;
III - 5 saques no valor de R$40.000,00 cada, totalizando R$200.000,00 da conta da Piso Certo, bem com teriam sido quitados por meio dessa conta, R$4.250.000,00 em boletos de cinco fornecedores da Mil Tendas (Mineradoras Teclado, Lucas, Marciano e Olarias Perfeita e Pedreta, no valor de R$425.000,00, cada) e de cinco fornecedores do Supermercado Preço Fino (Atacadistas Dunlop, Marvel, Bozo e Destilarias Maia e Saraiva, no valor de R$425.000,00 cada), além de terem sido aplicados R$500.000,00 no dia 6.1.2019, em fundos de investimento da empresa de Ana.
Revelou, também, que na semana entre 9 e 13 de janeiro de 2019 foram efetuados:
I - 5 saques no valor de R$11.000,00 cada, totalizando R$55.000,00, da conta da Vilas Secas;
II - 5 saques no valor de R$10.000,00 cada, totalizando R$50.000,00, da conta da Dias Melhores; e
III- 5 saques no valor de R$10.000,00 cada, totalizando R$50.000,00, da conta da Piso Certo.
Durante os meses de junho e setembro de 2018 e janeiro de 2019, a força policial efetuou diligências de acompanhamento, fruto da análise dos diálogos telefônicos de Alcapone com Félix, Demóstenes e Ana, identificando a data que seriam pagos os contratos da prefeitura e o repasse de verbas por meio de estafetas das construtoras, que restaram identificados previamente, sendo que:
a) nos dias 2.6.2018, 2.9.2018 e 2.1.2019 foram registradas as idas dos office boys Armando (nascido em 11.11.2000, filho de Jéssica, funcionário da Vilas Secas), Rolando (nascido em 17.9.1999, funcionário da Dias Melhores) e Baltazar (nascido em 16.4.1999, funcionário da Piso Certo) ao Hotel Mirante da Lua (Marte/SC) onde se encontraram com Jeferson e lhe entregaram sacolas;
b) nos dias 3.6.2018, 3.9.2018 e 3.1.2019 foram registradas as idas dos mesmos emissários ao referido Hotel, onde se encontraram com Gustavo e lhe entregaram sacolas;
c) nos dias 4.6.2018, 4.9.2018 e 4.1.2019 foram registradas as idas dos citados estafetas ao mencionado Hotel, onde se encontraram com Marina e lhe entregaram sacolas;
d) nos dias 5.6.2018, 5.9.2018 e 5.1.2019 foram registradas as idas dos ditos mensageiros ao apontado Hotel, onde se encontraram com Virgulino e lhe entregaram sacolas;
e) nos dias 6.6.2018, 6.9.2018 e 6.1.2019 foram registradas as idas dos mesmos funcionários ao referido Hotel, onde se encontraram com Lampião e lhe entregaram sacolas; e,
f) nos dias 9, 10, 11, 12 e 13 de janeiro de 2019 foram registradas situações idênticas, com a ida até o Hotel Mirante da Lua de Armando, Rolando e Baltazar e o respectivo encontro com Jeferson, Gustavo, Marina, Virgulino e Lampião nos dias sucessivos. Em outro relatório de acompanhamento, a força policial constatou que nos dias 4.6.2018, 4.9.2018 e 4.1.2019 Alcapone por ordem de Alibabá teria ido até a Piso Certo, levando uma série de pastas, que depois descobriu-se (pela análise das conversas de whatsapp armazenadas nos iClouds de Ana) que eram os boletos dos fornecedores da Mil Tendas e do Supermercado Preço Fino. Diante da situação, em 10.3.2019, foi solicitado o afastamento do sigilo bancário da Consulta Ativa, nos mesmos moldes do pedido anterior, por sequer possuir empregados registrados no Ministério do Trabalho e ser inexistente o endereço cadastrado na sua inscrição federal, revelando que os valores recebidos das transferências das construtoras Vilas Secas e Dias Melhores foram sacados quase na sua totalidade, permanecendo na conta, em aplicações financeiras de Pamela, um percentual de 10% do transferido.
A força policial também apresentou relatório de investigação sobre acompanhamentos efetuados nas datas de 9.6.2018, 9.9.2018 e 9.1.2019, quando Alcapone fora visto com sua amante na casa dele no período da manhã e depois se dirigindo ao banco em que a Consulta Ativa mantém sua conta, seguindo ambos com malotes até o Hotel Mirante da Lua.
A análise da quebra do sigilo fiscal do Hotel Mirante da Lua revelou:
a) uma majoração nos valores declarados a partir de 2017, cujos montantes indicavam uma taxa de ocupação de 100%, índice totalmente desvirtuado da taxa média da cidade de Marte/SC que seria na faixa de 45%;
b) que declarava a realização de festas com faturamentos milionários, as quais realmente foram realizadas nos finais de semana de 7 e 8 de junho de 2018, de 7 e 8 de setembro de 2018 e de 7 e 8 de janeiro de 2019.
Já do sigilo bancário do referido Hotel apurou-se:
1 - vários depósitos de moeda corrente em junho de 2018, num total de R$810.000,00, iniciando-se com um maior de R$510.000,00, efetuado no dia 10.6.2018 e outros cinco (dias 13, 15, 17, 20 e 27 de junho de 2018), no valor de R$60.000,00;
2 - vários depósitos em espécie, no mês de setembro de 2018, totalizando R$1.080.000,00, iniciando-se com um maior de R$680.000,00, efetuado no dia 10.9.2018, e outros cinco (dias 13, 15, 17, 20 e 27 de setembro de 2018), no valor de R$80.000,00;
3 - em janeiro de 2019 o total de depósitos em espécie atingiram a marca de R$1.620.000,00, iniciando-se com um maior de R$1.120.000,00, efetuado no dia 10.1.2019 e outros cinco no valor de R$100.000,00 (dias 13, 15, 17, 20 e 27 de janeiro de 2019). A quebra do sigilo bancário de Jeferson trouxe que em junho e setembro de 2018 e janeiro de 2019 ele fez depósitos do recebido em sua conta, nos valores individuais de R$9.000,00 (dias 2, 3, 4, 5, 6, 9, 10, 11, 12 e 13 de cada mês). Por sua vez, a quebra do sigilo de Gustavo revelou que em junho e setembro de 2018 e janeiro de 2019 ele fez depósitos do recebido em sua conta, nos valores individuais de R$9.000,00
(dias 3, 4, 5, 6, 9, 10, 11, 12, 13 e 16 de cada mês).
Do período da investigação, foi possível verificar que a partir do mês de abril de 2019, o próprio Estado de Santa Catarina e o município de Marte/SC tiveram que contingenciar verbas por conta do não cumprimento das metas de resultado primário, motivo pelo qual não aconteceram pagamentos desses contratos nesse período.
Junto aos Registros de Imóveis, Tabelionatos, Capitania dos Portos, Detran e outros bancos de dados, foi observado que:
a) o Hotel Mirante da Lua teria adquirido em julho de 2018 um veículo Range Rover Sport, 0KM, avaliado pela tabela FIPE em R$800.000,00;
b) em outubro de 2018, Jussara (esposa de Alibabá, do lar, nascida em 12.6.1990) teria adquirido uma lancha Intermarine 430 Full, seminova, no valor de R$1.400.000,00;
c) em fevereiro de 2019, o Hotel Mirante da Lua teria adquirido um terreno de 2.000 m² na Praia dos Asteróides, Júpiter/SC, pelo preço de R$2.200.000,00, onde seria construído o novo hotel Mirante da Lua Beach;
d) em março de 2019, Felix adquiriu três lotes no Condomínio Vento Sul, em Marte/SC, pelo valor global de R$650.000,00; a Dias Melhores adquiriu um veículo Mercedes Benz AMG C-63 S Coupé, 0KM, avaliado em R$600.000,00 e utilizado por Daniel; Ana adquiriu seis lotes no mesmo condomínio que Felix pelo valor de R$1.200.000,00;
e) em julho de 2018, Virgulino adquiriu em nome de seu sobrinho Carlos (nascido em 13.11.2004) o veículo Honda Civic SPORT 2.0, 0km, avaliado em R$90.000,00, utilizando-o a partir daquela data;
f) em setembro de 2018, Virgulino adquiriu em nome de sua mãe Marlene, cotas de um apartamento localizado em Marte, na Rua Candido Portinari, 45, em Sociedade de Propósito Específico no valor de R$120.000,00;
g) em janeiro de 2019, Virgulino repassou ao supermercado Frango Crocante de seu amigo Cristian, o valor de R$160.000,00, em espécie, sendo que em fevereiro de 2019 ele acabou sendo o ganhador de uma BMW 320i 0km, avaliada em R$159.000,00, em sorteio promovido pelo estabelecimento, devidamente autorizado.
Utilizando-se de prerrogativa inserida na legislação estadual, em abril de 2019 o Procurador-Geral de Justiça efetuou delegação de suas funções de órgão de execução para 2ª Promotoria de Justiça de Marte/SC (com atribuições na área criminal e da moralidade), sendo que em maio deste ano foram solicitadas medidas de busca e apreensão, prisão temporária e bloqueio de valores das contas correntes pelo BACENJUD, as quais foram deferidas pelo Poder Judiciário.
Durante o prazo de cinco dias da prisão temporária, os recolhidos foram interrogados, todos usando o direito ao silêncio. A medida segregatória foi prorrogada, pelo mesmo prazo de cinco dias. Da diligência de busca restou efetivado relatório próprio que indicou a apreensão de diversos documentos (de veículos, imóveis, agendas, entre outros), utensílios e aparelhos eletrônicos, incluindo mídias.
Dentre esses, estavam na residência de Alcapone: cópia de cheque emitido em 13.3.2019 da conta corrente da Consulta Ativa, nominal para a empresa de informática Pouso Ativo, de propriedade de Vanessa (nascida em 19.9.1991, filha de Eva e prima de Pamela), no valor de R$375.000,00, com prazo de vencimento em 25.3.2019; ofício do Cartório de Protestos de Marte/SC notificando a Consulta Ativa para pagamento do título de crédito no prazo de 3 dias a contar de 10.4.2019; documento do cartório comprovando a quitação dos valores em 12.4.2019; comprovante do depósito do cartório do valor protestado para a Pouso Ativo; uma chave contendo o nº 304 e o nome Tradicional.
O bloqueio da conta corrente da Consulta Ativa não teve efetividade porque ela estava sem saldo. Da avaliação do telefone celular de Pamela (diante de autorização judicial expressa permitindo a análise dos dados de todos os terminais) constatou-se conversas dela no aplicativo telegram com Vanessa (em 15.4.2019 elas combinam de se encontrar, pois Vanessa já teria sacado os valores em espécie; no dia 18.4.2019 Vanessa agradece Pamela, informando a compra do veículo Gol, Confort Line, 2017 para seu uso pelo valor de R$37.500,00). Considerando o teor das conversas, foi materializado relatório da força policial, sobre acompanhamento realizado no dia 16.4.2019, fruto de conversa entre Pamela e Alcapone em que ela menciona que iria “pegar aquilo” na igreja matriz, situação que chamou a atenção dos investigadores.
No referido relatório consta o registro de filmagens e fotografias do encontro de Pamela com uma feminina não reconhecida naquele momento, que lhe entregou uma maleta no pátio da basílica, sendo que na sequência Pamela se encontrara com Alcapone e ambos se dirigiram até o prédio comercial Taurus, local sede de diversas casas de câmbio, bancos e da Casa de aluguel de cofres Tradicional, sendo que a diligência restou prejudicada por conta da impossibilidade de ingressar no prédio sem identificação. Da detida análise do telefone de Virgulino viu-se conversa dele com Cristian, no dia 31.1.2019, no aplicativo whatsapp em que Crisitan assegura que vai dar certo pois embora o sorteio conte com mais de 5.000 inscritos a bolinha com o número de Virgulino será mais pesada que as demais do interior do globo.
Paralelamente a esses fatos, já no dia 23.4.2018, Alibabá, Prefeito de Marte/SC, estabeleceu distinto arranjo e colusão, aliando-se ou mesmo ingressando a outro agrupamento integrado também por Olivânio, Gersika, Nilvânio, Hamilton e Apolinário, com estrutura ordenada e formado visando a obtenção de vantagem patrimonial, mediante a prática de atos atentatórios ao patrimônio alheio, inclusive circunstanciados pelo emprego de explosivos em caixas eletrônicos e sob peculiar modus operandi na região de Marte/SC, Júpiter/SC e Saturno/SC.
Alibabá, conquanto não praticasse pessoalmente qualquer ato de execução, exercia a função de comando, fornecia amparo material e estrutural ao grupo, financiando-o e dando guarida aos demais em local particular.
Gersika era responsável pelo reconhecimento dos lugares dos crimes, realizando levantamento audiovisual dos logradouros e repassando os dados aos outros, enquanto Nilvânio, com função estabelecida na execução do crime, também possuía a tarefa de organização da fuga, permanecendo em locais estratégicos para garantir o sucesso da empreitada criminosa e a evasão dos participantes diretos, o que igualmente era realizado no dia da ação por Gersika.
Já Hamilton e Apolinário incumbia a entrada nos estabelecimentos, possuindo ambos expertise para o uso de forte arsenal bélico e o último no manuseio ou mesmo emprego
de explosivos de alto poder de ruptura, compostos por oxidantes, combustíveis e agentes emulsificantes, para destruir qualquer obstáculo nas ações perpetradas.
Olivânio, mesmo detido na Penitenciária de Júpiter/SC, era responsável pela aquisição de coletes à prova de balas, apetrechos inerentes às atividades, compra e fornecimento de armas de grosso calibre, o que somente foi viabilizado a partir da entrada de Alibabá e pelo auxílio direto do agente penitenciário Apolo, que se valendo dessa condição, aderindo ao esquema e ciente das atividades, permitia que Olivânio constantemente usufruísse de toda espécie de regalias, em especial, ser deslocado do regime semiaberto para a administração, inúmeras visitas e, quando do plantão, deixar as dependências da unidade prisional para visitar Gersika quando desejasse e sem autorização, fornecendo ainda suporte mediante a disponibilização de veículo para tanto, tudo em troca de propina que receberia mensalmente e após praticados os eventos, conforme ajustado entre o grupo.
Dois dias após o ingresso de Alibabá, ele e os indivíduos Olivânio, Gersika, Nilvânio, Hamilton e Apolinário deliberaram quanto a escolha do local e planejamento da execução, o que foi concluído no mesmo dia com a visita íntima de Gersika a Olivânio, quando este orientou que fizesse uso e procedesse à entrega de armamentos e coletes balísticos também a Nilvânio, Hamilton e Apolinário para inclusive proteção pessoal em caso de eventual confronto policial.
No dia seguinte à visitação, Gersika, Nilvânio, Hamilton e Apolinário deslocaram-se até à Cooperativa Credi, na Rua Hermann, Saturno/SC.
O automóvel VW/Saveiro, placa MHH-0360, foi conduzido por Gersika, enquanto o segundo Renault/Scenic, placa MDA-8572, por Nilvânio e ocupado por Hamilton e já o terceiro VW/Quantum, sem placa, por Apolinário.
Próximos do local escolhido, cada veículo tomou um rumo diferente, de acordo com as funções definidas, de forma que aquele conduzido por Gersika permaneceu estacionado próximo da Cooperativa para assegurar a fuga, ao mesmo tempo que Nilvânio, Hamilton e Apolinário, vestindo coletes balísticos e fortemente armados, dirigiram-se até a agência bancária lá existente, estacionando os veículos Scenic e Quantum em frente ao local, tendo Nilvânio descido do automotor e exercido a função de segurança do perímetro, utilizando um fuzil (obtido também pelo contato viabilizado entre Olivânio e Gersika).
Já Hamilton e Apolinário entraram na agência e, enquanto Nilvânio, mediante a utilização de uma barra de ferro, arrombou dois caixas eletrônicos, Apolinário instalou um artefato explosivo (dinamite ou substância de efeitos análogos) e acionou o cordel, explodindo-os em seguida. Após a explosão que causou na agência um grande dano, Hamilton e Apolinário despojaram o valor de R$78.990,00 dos caixas eletrônicos e empreenderam fuga no VW/Saveiro conduzido por Gersika, abandonado 2km depois num terreno baldio e foram resgatados por Nilvânio, evadindo-se todos.
Ato contínuo, foi procedida a guarda provisória do numerário subtraído, do Scenic, coletes e armamento em uma das residências fornecidas para tanto por Alibabá, em Marte/SC.
Esse fato (Cooperativa Credi) foi repetido a partir do esquema idealizado pela agremiação e executado pelos indivíduos acima mencionados, por meio de idêntico modus operandi e disciplina e durante o período compreendendo os meses de junho e novembro de 2018 e fevereiro de 2019, agora, segundo noticiado, em detrimento de outras agências bancárias: ICBC, situada em Marte/SC; BNP, em Júpiter/SC; e posto bancário no Supermercado MART, em Saturno/SC, apoderando-se em cada uma os valores aproximados de R$80.000,00. Por sua vez, na manhã do dia 1.5.2019, Gersika, Nilvânio, Hamilton e Apolinário, dando seguimento a empreitada criminosa e de forma ordenada e articulada (e natural ciência dos demais membros), dirigiram-se até a escolhida Cooperativa de Crédito Star, na Rua Nereu, em Marte/SC, valendo-se do veículo FORD/Focus, placa MKS-4559.
Já na agência bancária visada e mesmo todos cientes do alto fluxo de pessoas, do horário escolhido (próximo do meio dia) e da alta potencialidade lesiva da ação, Gersika, Nilvânio, Hamilton e Apolinário, assumindo o risco de provocar a morte de outrem, dispararam por, no mínimo, três vezes contra os vidros que guarneciam a agência, para garantir o acesso ao local e atemorizar os clientes e funcionários que lá se encontravam.
A fim de causar ainda mais pânico, Gersika, valendo-se de uma marreta, terminou por estilhaçar aquela superfície, possibilitando o ingresso dos demais no estabelecimento e retornando, em seguida, ao veículo, estacionando nas proximidades para dar guarida à empreitada e garantir a rápida saída.
Nilvânio, Hamilton e Apolinário, o primeiro portando uma espingarda e os demais revólveres e pistolas, realizaram mais disparos no interior do estabelecimento. Mediante porte ostensivo das armas, os agentes ordenaram que funcionários e clientes deitassem ao chão, arrebatando, em proveito comum, a quantia de R$41.227,41 dos caixas da agência, além de uma carteira contendo em seu interior documentos pessoais e o valor de R$134,00 (da cliente Shelly) e um revólver, calibre .38, numeração WD90773, que estava sob posse do vigilante da agência Michel.
Efetivado o assenhoreamento, deixaram o local utilizando-se do mencionado veículo Focus, em que Gersika os aguardava, ocasião em que ao alcançar o Bairro Antena foram localizados e interceptados por uma das viaturas acionadas da Polícia Militar, iniciando o procedimento de abordagem.
Com a clara intenção de garantir a detenção do produto da subtração e anuindo com o concreto risco de provocar a morte dos membros da força pública que estavam em seu
encalço (policiais militares Anilton e Augusto), passaram a efetuar inúmeros disparos de arma de fogo em detrimento destes, os quais apenas não foram fatalmente alvejados por erro de pontaria dos atiradores. E mais, não bastassem os tiros, os agentes, para empreender também fuga do local, lançaram o carro Focus contra Anilton, em nítida tentativa de atropelamento, que não se consumou diante da pronta postura evasiva deste.
No deslocamento em alta velocidade, Gersika perdeu o controle do veículo por força da alta concentração de carros nas imediações da entrada da ponte, vindo a colidir contra a traseira do automóvel FIAT/Palio, placa MEN-8263, conduzido e pertencente a Guilherme e igualmente ocupado pela esposa Marta e o filho Alf, de 9 anos.
Após o acidente, os quatro indivíduos, imbuídos do propósito de subtração e dispostos a todo tipo de conduta criminosa para assegurar sua impunidade, desceram armados do FORD/Focus e renderam agora todos os ocupantes do FIAT/Palio. Enquanto Hamilton, mediante a empunhadura de arma de fogo, determinou que a vítima Guilherme saísse do veículo, retirando-lhe à força do interior deste e assenhorando-se da coisa alheia móvel, Gersika arrancou violentamente os outros ocupantes, os quais se encontravam sentados no banco traseiro, permitindo o ingresso dos demais comparsas no veículo.
Nesse momento, os policiais militares logo aportaram ao local, ocasião em que novamente Gersika, Nilvânio, Hamilton e Apolinário, cientes do poder letal dos armamentos que portavam, do alto fluxo de veículos e pessoas (centro da cidade), determinados a garantir o sucesso da empreitada e assumindo o risco de provocar a morte daqueles policiais, deflagraram contra estes inúmeros disparos, em meio à via pública.
Em virtude do erro de pontaria, Anilton e Augusto não restaram lesionados, logrando, no entanto, êxito em prender em flagrante, naquele instante, apenas Gersika, deixada para trás pela trupe.
Incansáveis e sem o automóvel Palio, Nilvânio, Hamilton e Apolinário então correram em direção à margem esquerda da via, quando se depararam agora com o veículo JEEP/Renegade, placa QID-3647, fazendo a travessia, procedendo outra abordagem.
Os três indivíduos apontaram os artefatos bélicos à condutora Carol e determinaram a imediata desocupação.
Acatada a ordem, adentraram no referido automóvel, restando nesse momento abordados por Anilton e Augusto.
Diante da concreta possibilidade da prisão e anuindo com o real risco de provocar a morte dos agentes da força pública, Nilvânio, Hamilton e Apolinário iniciaram novo enfrentamento armado, atingindo, desta vez, o policial Augusto em sua perna e causando-lhe lesões corporais.
O resultado apenas não foi mais gravoso a partir da conduta do policial, chamado em reforço, consistente em Pedro Emanuel, que logrou êxito em alvejar Hamilton em seu pé, levando ao término da troca de tiros e imediata fuga. Hamilton foi abordado, em seguida, enquanto Nilvânio e Apolinário conseguiram se embrenhar na mata ciliar e escapar. Em poder de Gersika foi localizado o revólver, calibre .38, numeração WD90773.
Já no Focus, que apresentava adulteração de sinal de identificação no chassi e no agregado do motor, foi apreendido toucas, coletes balísticos e grampos de aço, enquanto em poder de Hamilton uma balaclava e aparelho de telefone celular, além de uma pistola, calibre .380 ACP, marca Taurus, com numeração suprimida.
Hamilton, questionado pelos policiais quanto ao rumo tomado pelos demais, informou dois endereços em que supostamente estariam Nilvânio e Apolinário, o primeiro naquela residência de Alibabá, em Marte/SC. Deslocado imediatamente, os policiais Lucas, Douglas e Heitor não encontraram Nilvânio e Apolinário, deparando-se no lugar com o veículo Scenic, placa MDA-8572, coletes balísticos, um fuzil, calibre 5.56x45mm, marca CZECH, nº 5600241CP e uma submetralhadora, calibre 9x19mm, marca RRNO, nº 07752. Já no veículo Saveiro, placa MHH-0360, então abandonado, foi localizado um bilhete com o número dos telefones de Alibabá, Olivânio e Apolo.
Na outra casa indicada, localizada em Saturno/SC (também pertencente a Alibabá e utilizada em favor do grupo) foi apreendida uma motocicleta HONDA CB 1000R (de propriedade de Apolo), dezoito carregadores de marcas diversas, calibres .380, 9mm, .40 e 5.56mm e 394 cartuchos de marcas diversas, calibres .380, 9mm, .40, 5.56mm, bem como "dez cartuchos de emulsão, explosivos de alto poder de ruptura, compostos por oxidantes, combustíveis e agentes emulsificantes, além de dez espoletas amolgadas a segmentos de estopim e um tubo de choque”.
Constam do Auto de Prisão em Flagrante e do Inquérito Policial os seguintes elementos, informações, documentos e peças:
1 - Todos os investigados restaram devidamente qualificados pela autoridade policial de origem, mesmo indiretamente;
2 - Oportunizado o direito de serem assistidos por defensor técnico e lembrados dos direitos constitucionais do preso, foi procedido o interrogatório de Gersika e Hamilton, os quais admitiram a participação deles na totalidade dos fatos, registrando que todos envolvidos, inclusive Apolo e Alibabá, tinham ciência do alto poder letal das armas e da possibilidade de morte no desdobramento dos eventos para o fim de subtração ou para garantir a impunidade ou detenção do numerário visado.
Também relataram que o Focus foi adquirido no mês de janeiro de 2019 de um terceiro chamado apenas de Xará, e então encomendado porque já era objeto de sabida adulteração de sinal de identificação.
Interrogado Olivânio, que já estava preso, afirmou que os carros Scenic e Saveiro tinham sido adquiridos um dia antes do fato ocorrido na Cooperativa Credi, porque possuíam procedência espúria e foram destinados tanto para uso regular como para a prática de ilícitos.
Apolo esclareceu que os artefatos explosivos, armas e munições, então adquiridos, eram mantidos sob guarda, posse, ocultação e porte de todos, em momento anterior e
também posterior aos eventos que foram utilizados, disponibilizando-os também para uso, a qualquer tempo e modo, por qualquer dos integrantes do grupo;
3 - Consta a juntada de documentação individualizada - “Informações sobre a Vida Pregressa do Indiciado”, com descrição de todos os dados de qualificação, e procedida a redução a termo das declarações de investigados, vítimas e testemunhas, compreendendo inclusive: Alibabá, filho de Leopoldina, Prefeito Municipal de Marte/SC, nascido em 2.1.1947; Olivânio, casado, nascido em 30.1.1969, filho de Ana, com endereço residencial na Rua B, Bairro XX, Júpiter/SC; Nilvânio, nascido em 27.4.2000, filho de Carolina, com endereço residencial na área rural de Plutão/SC; Gersika, casada com Olivânio, nascida em 27.5.1972, filha de Ivone; Hamilton, nascido em 8.3.1975, filho de Hilda, residente na Rua V, Bairro ZZ, Plutão/SC; Apolinário, nascido em 7.2.1970, filho de Maria, com endereço residencial na Rua X, Bairro VV, Saturno/SC; Apolo (irmão de Apolinário), nascido em 22.8.1977, filho de Maria, funcionário público lotado na Penitenciária de Júpiter/SC; Michel, com endereço de trabalho na Cooperativa de Crédito STAR; Shelly, viúva, aposentada, nascida em 31.6.1927, residente na Rua R, Bairro JJ, Marte/SC; Guilherme e Marta, residentes na Rua Quilombo, 77, Marte/SC; Carol, residente na Rua Condá, 265-D, Júpiter/SC; Anilton, Augusto, Pedro Emanuel, Lucas, Douglas e Heitor, policiais militares lotados no 2º BPM de Marte/SC; Anoar, representante da Cooperativa Credi; e Wilma, representante da Cooperativa de Crédito STAR;
4 - Todos Boletins de Ocorrência, Termos de Apreensão e Autos de Exibição e Apreensão acerca dos fatos já apurados integram os procedimentos, incluídos os Boletins de Ocorrência comunicando a subtração dos veículos Saveiro e Scenic, datadas de 21 e 23.4.2018, respectivamente, nas cidades de Júpiter/SC (vítima Isadora) e Plutão/SC (vítima Nayane);
5 - Todos Laudos Periciais dos eventos já apurados integram os procedimentos, incluídos os de Lesão em Augusto e Hamilton, de Arrombamento de caixas eletrônicos, em artefatos explosivos, das armas e munições apreendidas (atestando eficiência e numeração suprimida para uma delas), de Adulteração do chassi e agregado do motor no veículo Focus e de Levantamento do Local de Delito na Cooperativa Credi do uso de dinamite ou substância de efeitos análogos, seguida de explosão que causou um grande dano na agência bancária, expondo a perigo a vida, a integridade física e o patrimônio dos demais moradores do prédio onde é sediada e das demais pessoas que habitavam nas residências vizinhas;
6 - Todos Termos de Reconhecimentos realizados pelas vítimas por meio de fotografia afetos aos crimes apurados, dentre eles, Shelly, reconhecendo, com absoluta certeza, as pessoas de Gersika, Nilvânio, Hamilton e Apolinário como autores do evento delituoso, enquanto Michel não teve condições de reconhecer;
7 - Lavrado APF de Gersika e Hamilton, pela autoridade policial de Marte/SC foi procedida a juntada de Inquérito Policial acerca de investigação sobre os fatos acima correlatos na região de Marte/SC, Júpiter/SC e Saturno/SC;
8 - Já foram asseguradas a apresentação à autoridade judicial das pessoas presas em decorrência da prisão em flagrante (Gersika e Hamilton), com a conversão em prisão preventiva;
9 - Dos documentos do Inquérito Policial, constam Relatórios de Investigação e filmagens, além de Relatório Preliminar de Investigação, informando o último que quanto as ocorrências nos estabelecimentos ICBC, BNP e Supermercado MART, a autoridade policial ainda prossegue na coleta de elementos para individualização de cada um dos eventos, tal como Levantamento do Local do Delito e da explosão, oitiva das vítimas e testemunhas, confirmação dos valores subtraídos, reconhecimento pessoal dos investigados, obtenção de filmagens internas e externas, dentre outros;
10 - Pela autoridade policial foi juntado documento de identificação civil em nome de Shelly, acompanhado de Atestado Médico recentemente emitido noticiando enfermidade grave desta, inspirando receio de que ao tempo da instrução criminal já não exista, e sustentando a relevância de sua oitiva perante o juízo decorrente inclusive do reconhecimento pessoal dos agentes;
11 - Certificados os antecedentes criminais, consta o registro que: Olivânio foi condenado com trânsito em julgado em 28.11.2014, pela prática de crime de tráfico de drogas e associação, atualmente cumprindo pena perante o Juízo de Execução Penal de Marte/SC, no regime semiaberto; Hamilton possui processo crime pela infração penal de tentativa de furto qualificado, atualmente suspenso no Juízo da 1ª Vara Criminal de Marte/SC, pelo período de prova de dois anos e com apresentações mensais regulares; Apolinário foi condenado com trânsito em julgado em 10.1.2017, pela posse ilegal de armas de fogo de uso permitido, em regime aberto, atualmente sob resgate da pena restritiva de prestação de serviços à comunidade no Juízo de Execução Penal de Netuno/SC; e Gersika possui precedente prisão em flagrante em 27.2.2018, pela prática de furto qualificado no Juízo da 1ª Vara Criminal de Plutão/SC, atualmente cumprindo medidas cautelares diversas da prisão, dentre elas de comparecimento periódico em Juízo, de trato mensal, além de recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga;
12 - Pelo Defensor de Hamilton, após homologação do APF pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Marte/SC e conversão, foi apresentada petição, desacompanhada de documentação, alegando que seu cliente é portador de retardo mental entre leve e moderado e postulando a instauração de incidente para tanto. Requer ainda a nulidade do APF pelo fato que Hamilton foi interrogado sem a assistência de advogado;
13 - Pelo Defensor de Nilvânio e Apolinário, sem apresentá-los, foi peticionado também antes de final opinio delicti, postulando a declaração de nulidade no reconhecimento efetuado por meio de fotografia, tal como de Shelly, com o consequente desentranhamento dos autos, por ter sido realizado em desacordo da legislação processual penal;
14 - A Defensoria Pública, em nome de Gersika, sustentou a nulidade de dita submissão à identificação criminal a partir de qualificação da investigada com anexação de sua fotografia colorida a um relatório de investigação juntado quando da confecção do Inquérito Policial.
Para Olivânio, apresentou também precedente pedido de desentranhamento dos autos do Inquérito Policial no caso de conclusão de oferecimento de denúncia e tão logo recebida, sob a alegação de que contamina o processo penal acusatório e compromete a imparcialidade e independência do magistrado.
Os autos do Auto de Prisão em Flagrante Delito com o Inquérito Policial vieram com vista ao Promotor de Justiça com atribuição perante o Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Marte/SC (ora candidato), os quais juntamente com o Procedimento Investigatório Criminal (PIC nº 8/2017) deverão ser alvo de devida apreciação e pronunciamento.
Nessa condição, com vista dos dois primeiros na data de 14.5.2019 e de posse do PIC (cujo prazo das prisões temporárias encerram na data de hoje, 15.5.2019), o candidato deverá apresentar devida(s) peça(s), requerimento(s), manifestação(ões) pertinente(s), com indicação expressa dos dispositivos e/ou normas correspondentes, levando em consideração a totalidade dos fatos e procedimentos que lhe foram confiados, bem como todos elementos, informações, documentos e peças integrantes desta questão.
Descabe arquivamento implícito e qualquer requerimento de retorno dos autos à autoridade policial de origem para diligências quanto aos fatos aqui já devidamente apurados. O candidato não poderá se identificar, consignando tão somente, ao final, a expressão “Promotor de Justiça”.
É punível a conduta do notário que dá fé em contrato de compra e venda de imóvel por preço superior ao efetivamente praticado pelos contraentes, ciente de que tal estratagema tem por objetivo a dissimulação dos pagamentos da corrupção?
A partir do exame do problema em tela e, em caso positivo, do enquadramento penal, disserte, de maneira fundamentada, sobre o tema da lavagem de dinheiro e a responsabilidade penal dos profissionais jurídicos, conceituando e analisando situações exemplificativas, sobretudo diante das ações neutras, com a sua inserção dogmática na estrutura da teoria do delito.
(30 linhas)
(2,0 pontos)
A prova foi realizada com consulta a códigos e(ou) legislação.
O sistema de Compliance de uma instituição financeira detecta movimentações financeiras suspeitas de clientes, mas o diretor financeiro deixa de comunicá-Ias aos órgãos de controle. Tal conduta configura crime de lavagem de dinheiro?
A partir do enfrentamento da questão proposta e, em caso positivo, do enquadramento penal, disserte, de maneira fundamentada, sobre Compliance e Lavagem de Dinheiro, conceito, violação de deveres especiais e omissão imprópria, à luz da legislação de regência, da doutrina e da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
(30 linhas)
(2,0 pontos)
A prova foi realizada com consulta a códigos e(ou) legislação.
Entre 2011 e 2014, José, proprietário de um laticínio, alterou o leite vendido por dois mercados e um supermercado que são os seus distribuidores em determinado município. A alteração consistiu na troca do leite de vaca puro por leite de vaca com a adição de formol em quantidade excessiva para aumentar-lhe o prazo de validade, atitude altamente nociva à saúde do consumidor. Para tanto, José contou com a ciência e o apoio de Bonifácio e Fausto — donos dos dois mercados — e de Adalberto — proprietário do supermercado. Ao tomar conhecimento dessa situação, Caio, servidor público do órgão de fiscalização local, procurou José e passou a exigir para si vantagem para liberar o leite alterado para entrega aos mercados e ao supermercado e, com isso, permitir a revenda ao consumidor final. A exigência foi aceita por José, e o valor variava conforme a quantidade de leite adulterado a ser liberado. Tendo em vista a ausência de registro de entrada e saída desses produtos nas empresas (laticínio, mercados e supermercado), seus proprietários disfarçavam o recebimento da renda obtida com as suas vendas. O mesmo ocorria com Caio em relação aos valores que recebia de José, uma vez que o exercício de seu cargo público era incompatível com a percepção de remunerações advindas de outras atividades.
Diante dessa situação hipotética, responda de forma fundamentada aos seguintes questionamentos.
1 - Que crimes podem ser imputados a José? (valor: 0,30 ponto)
2 - Que crimes podem ser imputados a Bonifácio, Fausto e Adalberto? (valor: 0,30 ponto)
3 - Que crimes podem ser imputados a Caio? (valor: 0,30 ponto)
4 - Caso fosse feita proposta de acordo de colaboração espontânea ou de delação premiada, aceita por quaisquer dos envolvidos e homologada pelo juízo que processa o feito, desde que cumpridos os requisitos legais, qual(is) poderia(m) ser a(s) consequência(s) para o direito estatal de punir? (valor: 1,00 ponto)
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