No que se refere aos procedimentos penais, pergunta-se:
A - É possível a decretação de absolvição sumária com base na prescrição virtual ou pela pena ideal?
B - Existe a possibilidade de realização de diligências após a audiência concentrada no procedimento sumário?
RESPOSTA OBJETIVAMENTE JUSTIFICADA.
Antônio, Braz e dois agentes não identificados, com unidade de desígnios, associaram-se para a subtração de bens de terceiros, que seriam vendidos no mercado paralelo, a fim de levantarem fundos para a compra de uma lancha, a ser utilizada nos momentos de lazer. Para tanto, em 01/1/2005, por volta das 14 h, dirigiram-se ao estacionamento do Shopping Manaíra, em João Pessoa – PB, onde abordaram o casal Eduardo e Flávia e sua filha, Gabriela, de 13 anos de idade, subjugando-os mediante a utilização de um revólver calibre 38, que Antônio portava ilegalmente havia mais de seis meses.
O veículo do casal, uma camionete de grande porte, chamou a atenção dos agentes, assim como a grande quantidade de joias que Flávia usava. As vítimas foram abordadas antes de entrarem no automóvel e não ofereceram resistência: Eduardo entregou as chaves do veículo a Braz, e Flávia, suas joias a Antônio.
Os quatro agentes entraram na camionete, dirigida por Antônio, e, já iniciada a fuga, o terceiro agente, com intuito de facilitar a evasão e garantir o sucesso da subtração, sugeriu que retornassem para levar as vítimas com eles, alegando que elas, provavelmente, acionariam as autoridades policiais. Antônio, então, dirigiu o veículo de volta ao local do assalto, e as vítimas foram obrigadas a entrar no veículo. Em seguida, foram em direção ao município de Itaporanga – PB, a 408 km da capital paraibana.
Ao passarem pelo município de Cabedelo – PB, Braz e os outros dois agentes estupraram Gabriela, enquanto Antônio dominava Eduardo e Flávia com a arma.
Por volta das 23 h do mesmo dia, chegando ao destino, Antônio perdeu o controle da camionete, que capotou, o que ocasionou a morte de Eduardo, tendo Flávia, Gabriela e os agentes saído ilesos do acidente. Antônio e Braz foram presos em flagrante por agentes da polícia rodoviária estadual, e os agentes não identificados empreenderam fuga pela vegetação, levando as joias subtraídas de Flávia.
Após os trâmites necessários, o inquérito policial foi relatado e encaminhado à auditoria militar de João Pessoa, em virtude de os réus serem policiais militares. Após decretar, de ofício, a prisão preventiva dos indiciados, o juízo abriu vista dos autos ao Ministério Público Militar, que ofereceu denúncia contra Antônio e Braz, considerando-os incursos nos tipos penais correspondentes previstos no Código Penal Militar. A denúncia foi recebida em 10/01/2006.
Durante a instrução do feito, apurou-se que os réus eram primários e que, no dia do crime, estavam de folga do serviço. Foram ouvidas duas testemunhas, Hudson e Iara, que reconheceram os réus como dois dos agentes que obrigaram, mediante grave ameaça, Eduardo, Flávia e Gabriela a entrar no veículo da família. Os policiais que efetuaram as prisões de Antônio e Braz também testemunharam, reconhecendo-os como pessoas que ameaçavam as vítimas no local do acidente. A arma portada por Antônio foi apreendida e periciada, tendo sido constatado que era apta a efetuar disparos. Houve perda total da camionete, que também foi periciada, tendo sido identificadas, em seu interior, impressões digitais dos réus. Antônio e Braz negaram a participação no delito.
Encerrada a instrução da ação penal, os réus foram condenados nos termos requeridos na denúncia.
No entanto, o órgão ad quem, atendendo a recurso da Defensoria Pública, anulou, por incompetência absoluta, o decreto condenatório e a decisão que impôs a prisão preventiva aos denunciados, determinando o encaminhamento dos autos à justiça estadual em João Pessoa – PB e a expedição de alvará de soltura em favor dos réus.
O juiz de direito da vara única da comarca de Itaporanga suscitou, porém, conflito positivo de competência, por entender que o feito deveria tramitar naquele juízo, tendo o Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba acolhido a pretensão do suscitante.
Aberta vista dos autos ao Ministério Público estadual, expôs-se a narrativa dos fatos, individualizando-se a conduta de cada um dos agentes. Em seguida, foi oferecida denúncia contra Antônio e Braz, incursos nos seguintes tipos previstos no Código Penal brasileiro, em concurso formal (art. 70): art. 288, parágrafo único; art. 157, § 2º, I, II e V; art. 213, c/c artigos 224, 226, I, e 9º da Lei nº 8.072/1990 (redação anterior à publicação da Lei nº 12.015/2009); e art. 121, § 3º, c/c art. 61, II, a e b; art. 92, I, b. Antônio ainda foi denunciado pela prática do delito de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (Lei nº 10.826/2003, art. 14, c/c art. 20).
A denúncia foi recebida, em 10/1/2011, pela autoridade judicial de Itaporanga, que decretou, ainda, a prisão preventiva dos réus, por entendê-la necessária para acautelar o meio social. Novamente interrogados, os denunciados confessaram a prática delitiva, informando, ainda, o nome dos outros dois envolvidos, Carlos e Daniel, que foram localizados pelas autoridades policiais.
A denúncia foi aditada, para serem incluídos, no polo passivo da ação, Carlos e Daniel, cuja prisão preventiva foi decretada pela autoridade judiciária, tendo sido esses dois agentes também incursos nos mesmos tipos penais imputados a Antônio e Braz.
O aditamento à denúncia foi recebido em 1º/3/2011. Interrogados, Carlos e Daniel, que também são policiais militares e primários e estavam de folga no dia dos fatos narrados na denúncia, confessaram a participação na empreitada criminosa, não sabendo informar, no entanto, o paradeiro das joias de Flávia. Cada um dos quatro réus contava, na data dos fatos delituosos, vinte anos de idade.
Hudson e Iara foram ouvidos novamente e também reconheceram Carlos e Daniel como dois dos agentes que participaram da ação no Shopping Manaíra, cuja administração forneceu cópia das imagens das câmeras de segurança instaladas no estacionamento. Tais imagens, entretanto, não eram suficientemente nítidas para a identificação precisa dos agentes.
Determinou-se a realização de perícia nessas gravações. O laudo pericial foi inconclusivo quanto à identidade dos réus, mas apurou-se que os agentes que aparecem nas imagens se assemelham fisicamente aos denunciados.
Juntou-se aos autos o atestado de óbito de Eduardo.
Flávia e Gabriela prestaram declarações em juízo, tendo sido uníssonas quanto à confirmação dos fatos narrados na inicial acusatória e ao reconhecimento dos réus. Flávia esclareceu, ainda, que era casada com Eduardo em regime de comunhão universal de bens.
Em fase de alegações finais, o Ministério Público pediu a condenação dos réus, conforme as capitulações criminosas da inicial acusatória, além da fixação de valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração.
A Defensoria Pública, que representou todos os réus, pugnou pela decretação da nulidade do processo, em razão da incompetência do juízo, com fundamento no art. 78, II, a, do Código de Processo Penal, uma vez que a infração a que foi cominada a maior pena fora praticada no município paraibano de Cabedelo; pelo reconhecimento da prescrição em relação a todos os delitos; pela ocorrência de causa superveniente absolutamente independente e do princípio da consunção; e pela aplicação da causa especial de diminuição de pena, prevista no art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 8.072/1990.
Antes de proferida a sentença, os réus foram colocados em liberdade, por ordem emanada do relator do habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública, que pugnou pela soltura, para que os réus pudessem responder ao processo em liberdade, ante a ausência dos requisitos autorizadores da segregação cautelar nesse momento processual.
Com base na situação hipotética apresentada, na qualidade de juiz de direito substituto da comarca de Itaporanga – PB, profira a sentença que entenda adequada, devidamente embasada na legislação, na doutrina e(ou) na jurisprudência. Analise toda a matéria de direito processual e material pertinente para o julgamento. Dispense a narrativa dos fatos e não crie fatos novos, considerando verdadeiros aqueles narrados na situação.
Jaime, brasileiro, solteiro, nascido em 10/11/1982, praticou, no dia 30/11/2000, delito de furto qualificado pelo abuso de confiança (art. 155, parágrafo 4º, II, do CP). Devidamente denunciado e processado, Jaime foi condenado à pena de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão. A sentença transitou definitivamente em julgado no dia 15/01/2002, e o término do cumprimento da pena se deu em 20/03/2006. No dia 24/03/2006, Jaime subtraiu um aparelho de telefone celular que havia sido esquecido por Lara em cima do balcão de uma lanchonete. Todavia, sua conduta fora filmada pelas câmeras do estabelecimento, o que motivou o oferecimento de denúncia, por parte do Ministério Público, pela prática de furto simples (art. 155, caput, do CP). A denúncia foi recebida em 14/04/2006, e, em 18/10/2006, Jaime foi condenado à pena de 1 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Foi fixado o regime inicial aberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade, com sentença publicada no mesmo dia.
Com base nos dados acima descritos, bem como atento às informações a seguir expostas, responda fundamentadamente:
1 - Suponha que a acusação tenha se conformado com a sentença, tendo o trânsito em julgado para esta ocorrido em 24/10/2006. A defesa, por sua vez, interpôs apelação no prazo legal. Todavia, em virtude de sucessivas greves, adiamentos e até mesmo perda dos autos, até a data de 20/10/2010, o recurso da defesa não tinha sido julgado. Nesse sentido, o que você, como advogado, deve fazer? (Valor: 0,60)
2 - A situação seria diferente se ambas as partes tivessem se conformado com o decreto condenatório, de modo que o trânsito em julgado definitivo teria ocorrido em 24/10/2006, mas Jaime, temeroso de ficar mais uma vez preso, tivesse se evadido tão logo teve ciência do conteúdo da sentença, somente tendo sido capturado em 25/10/2010? (Valor: 0,65)
(1,25 Ponto)
Em 10 de janeiro de 2007, Eliete foi denunciada pelo Ministério Público pela prática do crime de furto qualificado por abuso de confiança, haja vista ter alegado o Parquet que a denunciada havia se valido da qualidade de empregada doméstica para subtrair, em 20 de dezembro de 2006, a quantia de R$ 50,00 de seu patrão Cláudio, presidente da maior empresa do Brasil no segmento de venda de alimentos no varejo. A denúncia foi recebida em 12 de janeiro de 2007, e, após a instrução criminal, foi proferida, em 10 de dezembro de 2009, sentença penal julgando procedente a pretensão acusatória para condenar Eliete à pena final de dois anos de reclusão, em razão da prática do crime previsto no artigo 155, §2º, inciso IV, do Código Penal.
Após a interposição de recurso de apelação exclusivo da defesa, o Tribunal de Justiça entendeu por bem anular toda a instrução criminal, ante a ocorrência de cerceamento de defesa em razão do indeferimento injustificado de uma pergunta formulada a uma testemunha. Novamente realizada a instrução criminal, ficou comprovado que, à época dos fatos, Eliete havia sido contratada por Cláudio havia uma semana e só tinha a obrigação de trabalhar às segundas, quartas e sextas-feiras, de modo que o suposto fato criminoso teria ocorrido no terceiro dia de trabalho da doméstica.
Ademais, foi juntada aos autos a comprovação dos rendimentos da vítima, que giravam em torno de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) mensais. Após a apresentação de memoriais pelas partes, em 9 de fevereiro de 2011, foi proferida nova sentença penal condenando Eliete à pena final de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão. Em suas razões de decidir, assentou o magistrado que a ré possuía circunstâncias judiciais desfavoráveis, uma vez que se reveste de enorme gravidade a prática de crimes em que se abusa da confiança depositada no agente, motivo pelo qual a pena deveria ser distanciada do mínimo. Ao final, converteu a pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, consubstanciada na prestação de 8 (oito) horas semanais de serviços comunitários, durante o período de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses em instituição a ser definida pelo juízo de execuções penais. Novamente não houve recurso do Ministério Público, e a sentença foi publicada no Diário Eletrônico em 16 de fevereiro de 2011.
Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima, redija, na qualidade de advogado de Eliete, com data para o último dia do prazo legal, o recurso cabível à hipótese, invocando todas as questões de direito pertinentes, mesmo que em caráter eventual.
(5,0 Ponto)
APOLINÁRIO, BETO, CELIMAR, DADO, ELIVÂNIO, FELÍCIO, ANILTON, HAMILTON, IVÂNIO e CAROLINE aliaram-se ou mesmo associaram-se, de forma estável ou permanente, com o fim de praticar reiteradamente crimes, e agindo com plena consciência da ilicitude de seus atos, tramaram ações em comum, auferindo lucro fácil e indevido às custas do patrimônio alheio e, desenvolvendo conduta típica de organização criminosa com provável ramificação em outros Estados da Federação.
Para dar azo a concretização do desiderato ilícito, os acima referidos, agindo adredemente mancomunados, inclusive chegaram a instituir empresa, de nome “J. A. L. Representações”, ainda no mês de junho de 2009, montando, inclusive, sede própria na Avenida Fernando Machado, centro, município de Chapecó – SC.
Segundo infere-se dos inclusos procedimentos administrativo e investigatório que acompanham a exordial, o primeiro, desencadeado diretamente pela Subcoordenadoria Regional de Investigações Especiais - CIE, do Ministério Público do Estado de Santa Catarina, sediada na Comarca de Chapecó – SC; e o segundo, oriundo da Polícia Civil local, os fatos tiveram início após delação prestada por familiar de um dos agentes, que levantou fundada suspeita na prática de crime intitulado “golpe do chute”. Iniciada investigação, restou apurado que, de fato, tratava-se de uma organização criminosa especializada com atuação sistemática e de largo espectro.
Foi possível aferir que a quadrilha agia sob preparação estável, em que seus integrantes atuavam em conjugação de esforços e cumplicidade, fomentando a perpetuação da associação criminosa.
Para tanto, dentro da divisão de tarefas, APOLINÁRIO e BETO figuravam como mentores e idealizadores da empreitada ilícita, e também responsáveis pela distribuição dos valores obtidos. CELIMAR e DADO eram encarregados de divulgar ou mesmo oferecer por meio de anúncios em jornais de circulação local, regional e de amplitude estadual, a venda de veículos, registrados e em nome, efetivamente, dos verdadeiros proprietários, que tão somente ficavam sabendo do ocorrido e da utilização de seus nomes após instados a comparecer na repartição policial.
ELIVÂNIO, ainda tratava diretamente de arregimentar “clientes” (pretensas vítimas), oferecendo os automóveis diretamente para comerciantes do ramo de compra e venda de automóveis. Os contatos e a negociação, na seqüência, eram levados a efeito pelos integrantes FELÍCIO e ANILTON, que se valendo, inclusive, do engodo da existência da aludida empresa constituída para tal fim, utilizavam de telefones em nome desta e igualmente fornecidos quando da divulgação nos jornais.
HAMILTON era encarregado de manter o contato pessoal com as vítimas, aguardando a chegada destas, em veículo próprio, no local acordado para a conclusão da negociação.
Na seqüência encaminhava as vítimas até o local ajustado com os demais integrantes, o qual serviria como cativeiro, onde aquelas eram privadas de suas liberdades. IVÂNIO, juntamente com NILVÂNIO, era responsável pela manutenção dos cativeiros e das vítimas nesses locais, os quais foram arregimentados por APOLINÁRIO, com anuência dos demais. A locação dos locais utilizados pela quadrilha ou mesmo a escolha destes como cativeiro era promovida por CELIMAR.
CAROLINE, cunhada de ELIVÂNIO, não só emprestava e disponibilizava, reiteradamente, a conta bancária na qual foram efetuados vários depósitos e/ou transferências das vítimas, a título de liberação destas, como providenciava o imediato saque mediante comparecimento direto no estabelecimento bancário e transferência das importâncias, repassando aos demais integrantes em espécie diretamente ou via segunda modalidade, recebendo, para tanto, o percentual de 5%.
Assim é que, mesmo consultando a procedência, as vítimas ludibriadas, confirmavam não só a existência dos bens, como os dados já previamente repassados pelos agentes (placa, ano e modelo, propriedade, etc) e a ausência de qualquer restrição e/ou pendência junto ao Departamento de Trânsito.
Acordado o valor para aquisição e o modo de pagamento, era acertado com a vítima o dia, hora e local certo para a conclusão da negociação e, inclusive, a obtenção do veículo em pretensa venda. Igualmente, eram fornecidos números de telefones celulares para o contato pessoal. Valiam-se, ainda, do expediente, que o bem em negociação era proveniente da venda de imóvel e recebido como pagamento parcial.
Já no local combinado para o encontro, a vítima era abordada pelo integrante da quadrilha encarregado, que tão logo confirmava que aquela se encontrava no local para adquirir o veículo, adentrava no interior deste, tratando incontinenti de rendê-la mediante uso de arma de fogo, determinando que seguisse em direção ao ponto, já previamente destinado pela quadrilha como cativeiro.
Era ainda utilizado o expediente, em algumas das situações, de troca do veículo, ocasião em que outros integrantes da quadrilha, em veículo de apoio e dando guarida a empreitada ilícita, assumiam a direção do veículo da vítima tão logo o responsável pela abordagem inicial determinava que o automóvel fosse parado após adentrar em via secundária e de pouco movimento.
A vítima era conduzida até o cativeiro, localizado em local ermo e de difícil acesso, permanecendo sob custódia dos demais membros da quadrilha, os quais tratavam de levá-la a um dos cômodos, amarrando-a com corda, e sempre sob a constante presença dos integrantes, que se utilizavam da posse ostensiva de arma de fogo e a todo tempo do prenúncio da prática de mal injusto e grave em detrimento daquela, tal como ameaça de morte no caso de denúncia do fato e fuga, e ainda que sabiam da família da vítima.
Mantida a vitima sob restrição de liberdade, um dos membros da quadrilha, a partir de informações já obtidas anteriormente ou mesmo diretamente com a vítima, dentre eles o telefone de familiares, entrava em contato com estes, relatando que aquela se encontrava reclusa e que deveria ser providenciada a transferência bancária em conta fornecida, em valores consideravelmente altos, visando a libertação da vítima.
Dessa forma, intimidados e atemorizados com a situação, e após sucessivos contatos telefônicos, os familiares da vítima levavam a efeito a transferência da quantia acertada para a conta bancária em nome de um dos integrantes da quadrilha, cada vez em estabelecimentos bancários diversos. Na seqüência, a responsável pela conta comparecia até a agência bancária sacando os valores em espécie, ou mesmo promovia a transferência para outras contas bancárias em nome dos demais membros.
Por fim, confirmado o depósito, e sempre sob prévia autorização de APOLINÁRIO, era procedida a libertação da vítima, então levada por um dos responsáveis pelo cativeiro para local distante.
De fato, segundo apurado, no dia 20 de julho de 2009, a vítima Antoni, da cidade de São Lourenço do Oeste – SC, após proceder a leitura de jornal de circulação estadual e no campo pertinente aos classificados, avistou anúncio da venda de um veículo GM/Camaro, cujo valor, a princípio, estaria em patamar inferior a tabela de preços de carros usados.
Interessado na aquisição do veículo, a vítima entrou em contato com o telefone fornecido, sendo atendido na primeira ligação por FELÍCIO e, depois repassado para ANILTON, o qual ainda se intitulou terceira pessoa, confirmando a existência do veículo, repassando o nome do proprietário e placa para consulta, e acrescentando que havia recebido tal bem proveniente da venda de um apartamento.
Acertada as condições de pagamento na importância de R$ 108.000,00, a vítima Antoni, no dia 27 de julho de 2009, dirigiu-se até a cidade de Chapecó – SC para finalizar a negociação. Já no local previamente combinado com o pretenso vendedor, a vítima, que conduzia o veículo GM/Vectra, foi abordada por HAMILTON, que, após confirmar que se tratava da vítima e adentrar no carro desta, rendeu-a com o uso de arma de fogo, mostrando, ainda que se fazia acompanhar de seus asseclas.
Levada até o cativeiro, a vítima permaneceu reclusa em um dos cômodos deste, uma casa afastada do centro e bairro próximos.
Pressionada e intimidada, a vítima Antoni entrou em contato com seus familiares para afirmar que o veículo encontrava-se em condições regulares e que era para promover a transferência do valor supramencionado, o que somente viabilizou a libertação daquela.
Não obstante, durante o período que a vítima Antoni permaneceu no cativeiro, um dos integrantes da quadrilha identificado como sendo IVÂNIO, então responsável diretamente pela manutenção e permanência daquela no cativeiro juntamente com NILVÂNIO, aproveitando-se da presença de seus comparsas e das condições da vítima, amarrada, amordaçada e intimidada e, sob constante emprego de arma de fogo, tratou de subtrair desta objetos pessoais acondicionados em cômodo diverso, compreendendo cartões de crédito, aparelho de telefone celular, talonário de cheques e quantia em dinheiro no valor de R$ 660,00.
Registre-se que, na mesma data, tão logo providenciado o depósito para a conta de titularidade de CAROLINE, esta esteve na agência bancária e promoveu o saque da quantia de R$ 108.000,00 em favor da quadrilha.
Da mesma forma, no dia 2 de agosto de 2009, a vítima Batista, então garagista e empresário da cidade de Florianópolis – SC, constatou divulgado no campo classificados de jornal de circulação regional a oferta da venda de um veículo marca Mercedes Benz, zero quilometro, em valor atrativo.
Interessado na aquisição do automóvel, entrou em contato com o telefone fornecido, sendo atendido por ANILTON, que se passando por terceira pessoa, repassou os dados necessários como nome do proprietário, placa para consulta, renavam, e acrescentando que havia recebido tal bem proveniente da venda de um imóvel no litoral, na cidade de Balneário Camboriú - SC.
Acertada a condição e forma de pagamento, alcançando o valor de R$ 80.000,00, foi marcado dia, hora e local para a conferência do automóvel e levar a termo a negociação.
Assim é que, no dia 6 de agosto de 2009 e, tal como previamente combinado com o vendedor, a vítima Batista, acompanhado da família (esposa e filha) foi recepcionada por HAMILTON no Aeroporto Serafim Bertazo, cidade e comarca de Chapecó, o qual na condução de um veículo GM/Astra, levou a vítima e familiares supostamente em direção ao centro da cidade de Chapecó.
No caminho, em conversa amistosa disse que o veículo estaria na residência de ANILTON, então localizada em condomínio fechado, fora da cidade aproximadamente 5 Km.
Por sua vez, após afastarem-se do centro da cidade e adentrarem em via de acesso precário, HAMILTON tratou de render a vítima e familiares com o emprego de um revólver calibre 38, mostrando, ainda que estavam sendo seguidos por outro veículo, desde o aeroporto, conduzido por outro comparsa.
Levados até o cativeiro, a vítima Batista, esposa Clô e filha Dé permaneceram restringidas do direito de ir e vir, sendo colocadas em um cativeiro, devidamente escolhido. Mantidos sob os cuidados de HAMILTON, IVÂNIO e NILVÂNIO, os quais valiam-se inclusive da posse ostensiva de arma de fogo, a vítima Batista, esposa Clô e filha Dé, foram colocados separadamente em cômodos diversos, aumentando ainda mais o temor com a situação e o risco à integridade física e saúde, amarrando-se as mãos e pés. Passado curto espaço de tempo, APOLINÁRIO chegou no local, passando a negociar diretamente com a vítima Batista a quantia em dinheiro no valor de R$ 80.000,00 para libertação de todos.
No quarto em que fora colocada a filha do casal Dé, permaneceu esta sob vigilância única de HAMILTON, que se aproveitando do início e continuidade da negociação, e igualmente da ausência de qualquer outra pessoa, acabou abusando sexualmente da vítima Dé, constrangendo-a, de forma que inicialmente segurou suas mãos, colocando-as nos órgãos genitais do agente, retirando, em seguida, as vestes daquela, passando as mãos no corpo e partes íntimas da vítima, além de beijá-la a força.
Em continuidade, acabaram entrando em contato com familiares de Batista e, após seguidos contatos sob a condução de APOLINÁRIO, foi promovida, após aproximadamente 1 (uma) hora, a transferência bancária em conta fornecida por este último, na importância de R$ 80.000,00. Na seqüência, CAROLINE promoveu a transferência dos valores na quantia de R$ 76.000,00 para outras contas bancárias indicadas pelos demais membros.
Por fim, confirmado o depósito, e somente após o decurso de mais de 2 (duas) horas, sempre sob constante emprego de grave ameaça de morte, foi procedida a libertação das vítimas, as quais foram
ainda acondicionadas no porta malas do carro conduzido por HAMILTON e levadas até o município vizinho de Coronel Freitas - SC, onde foram finalmente soltas em local distante ainda do centro.
Igualmente, no dia 8 de agosto de 2009, a vítima Erasmo, da cidade de São José – SC, motivado pela divulgação em jornal de circulação estadual da venda de um veículo da marca Land Rover, em valor abaixo do normalmente praticado, entrou em contato via telefone fornecido, obtendo informações igualmente acerca da procedência, quilometragem, forma de pagamento, localização do bem, etc. A quadrilha, valendo-se do mesmo modus operandi, justificou a razão da venda decorrente de se tratar de “veículo de repasse”, obtido em recente venda de imóvel.
Obtido o interesse pela vítima Erasmo, ludibriada pelo engodo, foi acertada a forma e condição de pagamento, bem como informado que referido veículo estaria na cidade de Chapecó – SC para visualização e fechamento do negócio.
Diante da situação retratada, foi marcado local, dia e hora para a finalização da negociação, o que ocorreria tão somente na próxima semana, ficando ajustado que a vítima bastaria, uma vez conferido o estado do veículo e documentos in locu, autorizar a transferência do valor de R$ 125.000,00 para conta bancária a ser fornecida diretamente na data aprazada.
Ocorre que a vítima, desconfiada, no dia 10 de agosto de 2009, procedeu a verificação do renavam e placa fornecidos, constatando que aludido veículo, de fato, encontrava-se em nome do proprietário justamente fornecido pelos membros da quadrilha, cujos dados foram repassados por FELÍCIO, um dos responsáveis pela negociação.
Ato seguinte, em consulta a Internet, a vítima acabou descobrindo que o mesmo veículo, marca Land Rover, cor, placas e quilometragem fornecidos, encontrava-se exposto a venda em concessionária da marca, no Estado do Rio Grande do Sul. Levado o fato a conhecimento da autoridade local (São José – SC) e após contato com a Polícia Judiciária de Chapecó – SC, foi obtida a informação desta e que já havia investigação da existência de quadrilha especializada na aplicação de idêntico evento delituoso, com vítimas já precisadas, e outras ainda em potencial.
Nesse mesmo período, a genitora de NILVÂNIO, este último um dos encarregados da manutenção e segurança dos cativeiros, procurou o Ministério Público na Comarca de Chapecó – SC, reduzindo-se a termo as declarações daquela. No termo, restou consignado que seu filho estaria integrando uma quadrilha na cidade, e que havia sido contratado pelo grupo, desenvolvendo tal atividade ilícita já alguns meses.
Consignou ainda que o valor recebido pelo filho em razão do serviço era de R$ 2.000,00 mensais, que ficava às vezes dois dias sem retornar para casa e já havia visto uma arma de fogo no quarto deste, escondida no guarda roupa.
De posse de tais informações, repassadas diretamente ao representante ministerial responsável pela Subcoordenadoria Regional de Investigações Especiais - CIE, sediada na Comarca de Chapecó – SC, foi deflagrada imediata investigação, utilizando-se da Força Tarefa existente, compreendo integrantes da Polícia Militar, Polícia Civil e componentes da Fazenda Estadual.
A partir da aludida declaração e da obtenção do Boletim de Ocorrência firmado pela vítima Erasmo, com igual redução a termo das declarações desta, foi procedida investigação complementar, inclusive com campana, levantamento de placa e propriedade dos veículos que traziam e levavam NILVÂNIO, até culminar com a tomada das declarações e confissão deste acerca da existência da quadrilha e sua contratação, nomes de alguns dos integrantes, números de telefone destes e ainda da próxima vítima, que recaía justamente na pessoa de Erasmo, além do local do cativeiro.
Orientada a vítima Erasmo, previamente alertada da atividade desenvolvida pela quadrilha, para retardar a conclusão do negócio e induzir os quadrilheiros, o que perdurou por mais de uma semana mediante desculpa utilizada por aquela dizendo de motivo de doença na família que levaria alguns dias para se deslocar até o local solicitado, o Ministério Público, nesse ínterim, postulou medidas de interceptação telefônica e quebra de sigilo telefônico e bancário, além de decretação da prisão preventiva dos membros da quadrilha já devidamente apontados como APOLINÁRIO, BETO, HAMILTON e IVÂNIO, mesmo que indiretamente, e concessão de medidas de busca e apreensão nas residências destes, o que foi deferido pelo Juízo Criminal da Comarca de Chapecó – SC.
No dia e hora aprazados pela vítima Erasmo, em data de 21 de agosto de 2009, pela manhã, após seguidos diálogos mantidos com aquela e ANILTON, inclusive informando que já estaria chegando no município de Chapecó, aquela acabou ainda entrando em contato com a Polícia Civil de Chapecó - SC, restando convencida que um dos integrantes da Polícia poderia substituí-la no encontro, passando-se por aquela, o que foi efetivado.
Assim é que, enquanto era monitorada toda a situação, tão logo compareceu no local ajustado e devidamente recepcionado por HAMILTON, o policial a paisana acabou sendo conduzido em direção ao cativeiro, como se vítima fosse. No caminho, tal como sabidamente ocorreria, a vítima acabou sendo rendida com uso de arma de fogo, amarrada, e colocada, em seguida, em cômodo destinado a tal fim.
Passado cerca de aproximadamente 10 (dez) minutos, IVÂNIO chegou no local, o qual já havia sido contatado por HAMILTON, informando este que a vítima já estava devidamente sob custódia. Logo após, e tal como já acordado, policiais civis adentraram no interior da casa utilizada como cativeiro, promovendo a prisão em situação de flagrante delito de todos envolvidos presentes.
Na ocasião, além da liberação da vítima já confinada, no local foi promovida a detenção de HAMILTON, IVÂNIO e NILVÂNIO, e reduzido a termo as declarações destes, com a obtenção da identificação dos demais integrantes do grupo e do provável paradeiro. Assim é que, comunicado da prisão em flagrante delito, e de posse de novos elementos, pelo Ministério Público foi requerida a concessão de nova medida de busca e apreensão nas residências de CELIMAR, DADO, ELIVÂNIO, FELÍCIO, ANILTON e CAROLINE, além da prisão preventiva destes, o que foi decretado pela autoridade judiciária preventa.
No mesmo dia e período da manhã, a equipe da Força Tarefa já em diligência visando o cumprimento dos mandados iniciais de prisão preventiva e busca e apreensão, estiveram na moradia de APOLINÁRIO e BETO, ocasião em que nada se logrou encontrar. Já, na residência de HAMILTON, localizada na Rua C, Bairro D, Chapecó – SC, os policiais encontraram escondida no quarto uma arma de fogo do tipo “caneta-revólver”, que este possuía sem registro e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Por sua vez, na casa de IVÂNIO, restou apreendido cartões de crédito, aparelho de telefone celular e talonário
de cheques. A segregação de APOLINÁRIO e BETO restou infrutífera ante a não localização destes nos respectivos endereços fornecidos.
Já de posse dos mandados de prisão preventiva e busca e apreensão, e no período vespertino, outro grupo da Força Tarefa dirigiu-se até os endereços declinados de CELIMAR, DADO, ELIVÂNIO, FELÍCIO, ANILTON e CAROLINE, logrando-se promover a efetivação da prisão de CELIMAR, DADO, ELIVÂNIO e FELÍCIO. Nas dependências da residência de CELIMAR, no quarto por ele utilizado, foi apreendido arma de fogo curta, com munição calibre 357 Magnum.
Nada foi apreendido nas residências de DADO e ELIVÂNIO. Na residência de FELÍCIO foi apreendido grande quantidade de cheques em nome de terceiros, recortes de jornais dentro da escrivaninha, e anotações de telefones acompanhado de letras iniciais. ANILTON e CAROLINE não foram localizados e na moradia destes nada apreendido. No endereço da sede da empresa “J.A.L.Representações” foi apreendido o total de 9 (nove) telefones celulares, além de 2 (duas) CPU’s, cujos aparelhos supostamente mantinham dados acerca dos depósitos e das vítimas.
Na primeira diligência, obtida informação complementar com um dos vizinhos de APOLINÁRIO, que terceira pessoa, posteriormente identificada como sendo BETO, poucos minutos antes da chegada da Força Tarefa havia se retirado na condução de um veículo VW/Gol, cor branca, em direção à cidade de Coronel Freitas – SC, na companhia de APOLINÁRIO, uma das viaturas foi ao encalço destes, tomando rumo para o aludido município.
Registre-se, que segundo apurado, APOLINÁRIO e BETO, juntamente com os demais agentes, já possuíam plano traçado anteriormente de fuga na hipótese de descoberta da trama. Já no caminho, LINO entrou em contato telefônico com APOLINÁRIO, informando que a polícia esteve na casa deste, fazendo buscas, e que estava a sua procura com mandado de prisão preventiva para cumprir, bem como sabia do veículo que estavam conduzindo e rumo. Isso levou ao abandono imediato do veículo VW/Gol ainda na entrada do município de Coronel Freitas – SC.
Em continuidade da fuga, já por volta do meio dia, APOLINÁRIO e BETO ligaram de um telefone público para um ponto de moto táxi, solicitando os serviços, acertando previamente o “valor da corrida” e aguardando junto ao Posto de Combustível, situado no centro de Coronel Freitas – SC, a vinda do “mototaxista”.
Ato seguinte, transcorrido aproximadamente 20 minutos, com a chegada do mototaxista Deovani, APOLINÁRIO e BETO acertaram com aquele o local da corrida, dizendo que queriam ir até uma das Linhas, no interior do município de Coronel Freitas - SC e comprometendo-se em pagar os serviços tão logo chegassem na casa do pai do primeiro de nome Antonio Carlos .
Assim é que APOLINÁRIO e BETO, na companhia de Deovani, após indicado o caminho a percorrer pelo primeiro, seguiram pela Rodovia SC 468. Já naquele município, apontaram a direção da casa e nas proximidades de um pardieiro, situado em uma encruzilhada que dá acesso a propriedade de Carlos Antônio, solicitou à Deovani que parasse, sob o pretexto que “queria urinar”.
Neste instante, logo após Deovani parar a motocicleta, BETO permaneceu no veículo na garupa, enquanto APOLINÁRIO dirigiu-se até o pardieiro, urinando próximo, contudo acabara apanhando instrumento de reconhecido poder vulnerante e potencialidade consistente em um revólver calibre 38, marca Taurus, com capacidade para cinco tiros e municiado, que havia, no dia anterior, deixado escondido ou mesmo ocultado quando passara no local com destino a cidade de Chapecó – SC.
Ato contínuo, APOLINÁRIO, mediante dissimulação e já munido com referida arma de fogo, embarcou novamente na moto, entregando a arma de fogo para BETO, dirigindo-se até a casa dos pais do primeiro. Lá chegando, APOLINÁRIO apenas encontrou sua irmã, recebendo a informação que seu pai disse que deveria ir até a moradia de seu tio, local em que o genitor já estaria esperando, levando a solicitar a continuidade da corrida a pessoa de Deovani para que fosse até este último local.
Por sua vez, já no caminho indicado por APOLINÁRIO e passando pela mesma estrada anteriormente utilizada, ao chegarem na encruzilhada em que aquele havia parado e munido-se da arma e fogo, Deovani recebeu nova indicação daquele para que entrasse à direita, o que fora atendido. Deovani, temerário em não receber a quantia pelos serviços prestados e ao reclamar diretamente da situação para APOLINÁRIO, BETO, ainda com a motocicleta em movimento, efetuou seguidos disparos, em número de três, contra o corpo daquele.
Em seguida, tão logo levada ao chão, APOLINÁRIO tratou de buscar subtrair ilicitamente o capacete que aquela utilizava, da qual inclusive fez uso dos próprios pés (“marca com característica de ter sido produzida pelo solado de um calçado sujo de terra” – Laudo Pericial de fls. ), não conseguindo retirá-lo, promovendo, no entanto, o assenhoreamento da motocicleta Honda CG 125 TITAN, de cor vermelha, placas ILA 4402 – Chapecó - SC, utilizada pelo mototaxista e vítima.
Assim, diante da violência empregada pelo denunciado BETO e em razão do evento morte dela resultante, ocorrendo o comum propósito criminoso com a retirada da res da esfera de posse e disponibilidade do ofendido, APOLINÁRIO e BETO trataram de se retirar incontinenti do local, retornando por via secundária à SC 468, ainda no município de Coronel Freitas - SC, deixando, após percorrido aproximadamente 30 Km, a aludida motocicleta “nas terras de Antoninho Carlo, onde existe uma plantação de eucalipto” (local ao final apreendida - Termo de Apreensão de fl. ) a fim de posteriormente “desmanchá-la para reaproveitar as peças e comercializá-las” e conseqüentemente proporcionar a ocultação do crime.
Entretanto, antes de “abandonar a moto”, APOLINÁRIO e BETO teriam passado e permanecido temporariamente na residência de um amigo identificado como Nilvo, vulgo “Polenta”, localizada no interior de Coronel Freitas – SC e, tão logo questionado acerca da moto que o primeiro conduzia, e obtido a informação de BETO “que a tinha roubado em Chapecó e comentou que tinha dado uns tiros no ‘cara’ da moto, chegando a mostrar o revólver que tinha consigo”, descrevendo em seguida os fatos (fl. ), levou-o a solicitar a retirada de APOLINÁRIO e BETO do local, o que fora, de pronto, atendido.
Ocultada a moto, APOLINÁRIO teria buscado esconder o revólver calibre 38, marca Taurus,utilizado na atividade criminosa, solicitando a um amigo, identificado como LOVÂNIO, a guarda de tal instrumento, o qual, ao final, fora exibido junto à repartição policial (Auto de Exibição e Apreensão de fl.).
Por sua vez, Nilvo, na companhia de um amigo Ivo, procurou o policial Airton, responsável pela Delegacia de Polícia Civil do Município de Coronel Freitas – SC, delatando os fatos admitidos e confessados por BETO.
Ainda na mesma data, a autoridade policial de Coronel Freitas - SC, sem conhecimento da quadrilha, representou visando a concessão da prisão preventiva de APOLINÁRIO e BETO, além do deferimento de busca e apreensão na provável residência em que estariam ocultados, nos seguinte termos:
“Na manhã de hoje, no município de Coronel Freitas - SC, policiais civis encontraram o cadáver de Deovani, apresentando ter sido morto por disparos de arma de fogo, conforme Boletim de Ocorrência juntado. (...). Tudo está a demonstrar que foram mesmo APOLINÁRIO e BETO os autores do crime e que ainda devem estar na posse da moto subtraída e do revólver utilizado na prática delitiva. (...). A prova até então colhida revelou um grande ‘sangue frio’ e destemor por parte dos representados, que demonstraram extrema periculosidade” (fls.).
Assim é que os policiais, de posse dos respectivos mandados de prisão preventiva e busca e apreensão obtidos por decisão da autoridade judiciária de plantão da Comarca de Coronel Freitas (fls.), na manhã do dia seguinte, lograram abordar e deter APOLINÁRIO na residência de outro familiar, em diligência procedida pelos policiais civis Pedro e Airton, conduzindo aquele à Delegacia de Polícia de Coronel Freitas - SC.
Na ocasião, procedida imediata revista pessoal no denunciado APOLINÁRIO, acabaram constatando que este mantinha sob sua posse e detenção, em suas vestes, três cápsulas de munição calibre 38, as quais inclusive foram utilizadas por aquele na prática delituosa acima narrada e por ele mesmo guardadas após os seguidos disparos efetuados.
Da mesma forma, foi apreendido em poder de APOLINÁRIO uma mochila contendo a quantia de R$ 300,00, supostamente pertencentes a vítima Deovani, além de cópia de documentos de veículos, relação de nomes, telefones e endereços, contrato de locação em nome da empresa “J.A.L.Representações” e extratos de contas bancárias em nome de CAROLINE e de depósitos em nome daquele.
Por fim, efetivada a prisão de APOLINÁRIO e, ainda no final da manhã, BETO acabou sendo interpelado por policiais militares que trabalham no Terminal Rodoviário da cidade de Chapecó – SC e, que haviam recebido denúncia que contra tal pessoa havia pendente cumprimento de mandado de prisão preventiva, justamente no momento em que aquele embarcava no ônibus com destino a Foz do Iguaçu – PR.
No momento da abordagem, solicitado pelos policiais militares, em razão da dificuldade na identificação ou mesmo confirmação da qualificação do sujeito, BETO recusou-se a fornecer qualquer dado ou indicações referentes à própria identidade, tal como nome, data e lugar de nascimento, filiação, etc.
Da mesma forma, mesmo após conduzido à repartição policial e levado perante a autoridade policial, permanecia recusando-se a fornecer dados da própria identidade ou qualificação, o que tão somente foi possível após contato com o Centro de Investigações Especiais – CIE, Regional de Chapecó - SC.
Valendo-se dos fatos e circunstâncias delituosas acima narradas e, igualmente, constantes dos dados, informações e elementos complementares na seqüência consignados, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, por intermédio de seu representante na Comarca de Chapecó – SC, ofertou denúncia em face de
APOLINÁRIO, BETO, CELIMAR, DADO, ELIVÂNIO, FELÍCIO, ANILTON, HAMILTON, IVÂNIO, CAROLINE, KLOVÂNIO e LINO, dando-os como incursos nas sanções das respectivas normas penais violadas.
Preenchidos os requisitos de admissibilidade, foi recebida a denúncia em 14 de setembro de 2009, determinando-se a citação dos então acusados para fins de apresentação de resposta à acusação, por escrito, no prazo legal. Ao acusado ANILTON foi expedida carta precatória dirigida à Comarca de Porto Alegre/RS.
Igualmente, para a acusada CAROLINE, foi expedida carta precatória para efetivação de sua citação pessoal dirigida à Comarca de Florianópolis – SC.
O defensor constituído de APOLINÁRIO apresentou defesa prévia, negando os fatos descritos na preambular.
Pela defesa do acusado BETO, foi ofertada resposta à acusação em forma de “defesa preliminar”, promovendo a juntada de atestado médico e documentos complementares, consignando que aquele apresentada distúrbio mental grave e, postulando na ocasião a instauração de incidente de sanidade mental.
A defesa de CELIMAR, DADO, ELIVÂNIO, FELÍCIO, HAMILTON, IVÂNIO, KLOVÂNIO e LINO, via respectivos defensores, postularam, em suma, a improcedência da denúncia, por falta de provas da autoria delitiva e participação, culminando por requerer, desde já, a decretação da absolvição.
Ouvido o Ministério Público, foi apresentada manifestação favorável a instauração do incidente, repelindo-se os argumentos já apresentados na defesa e, pugnando pelo recebimento da denúncia.
O Juízo determinou a instauração do incidente em autos apartados. Apresentado o laudo, o incidente restou apenso aos autos principais, concluindo-se, ao final, que BETO “em decorrência da existência de nexo-causal entre o transtorno mental apresentado e os atos ilícitos praticados à época dos fatos, o periciado deve ser considerado do ponto de vista psiquiátrico-forense, inimputável pelos referidos atos”. O processo prosseguiu com a presença de curador.
Pelo Juízo, entendido não configurada qualquer das hipóteses de possível absolvição sumária, foi ainda confirmado o recebimento da denúncia, designando-se data para audiência de instrução e julgamento. No mesmo ato, determinou a citação editalícia dos acusados ANILTON e CAROLINE, não encontrados no endereço do domicílio e considerados foragidos (certidões de fls. e relatório policial de fl. ) .
Foi promovida a juntada de documentos complementares do Presídio Regional e da Polícia Judiciária, acompanhado de prontuário, ficha cadastral com vida pregressa e levantamento fotográfico, relativos a pessoa de ELIVÂNIO, concedendo-se imediata vista ao Ministério Público.
De posse dos documentos, o Ministério Público procedeu ao aditamento da denúncia, requerendo a retificação do nome de um dos acusados ELIVÂNIO para OLIVÂNIO, bem como alteração da data e local de nascimento, a compreender, nascido em 03.03.1987, no município de Pinhalzinho – SC, mantendo-se a filiação e demais dados constantes da qualificação da exordial.
Recebido o aditamento e procedida a correção dos dados inclusive no Sistema de Automação do Judiciário – SAJ local, no mesmo ato, foi decretada a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional em relação aos acusados ANILTON e CAROLINE, determinando-se ainda a produção antecipada de provas.
Foi juntada aos autos cópia de decisão emitida pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, que concedeu liberdade provisória ao acusado LINO, fruto de hábeas corpus interposto em favor deste pelo advogado constituído, sob o fundamento que não apresentava risco à ordem pública e instrução criminal. Expedido pelo Juízo respectivo alvará de soltura, foi colocado em liberdade, restando igualmente cientificado da audiência de instrução e julgamento pelo cartório judicial.
Na audiência, mantidas as algemas em relação aos acusados presos cautelarmente, em ato justificado no termo de ata, e presente o acusado solto, foram ouvidas 4 testemunhas de acusação, dentre elas um policial civil e outro militar, insistindo o Ministério Público na oitiva de outro policial militar integrante do CIE Regional e requerendo a substituição de testemunha não localizada, o que foi deferido.
A defesa dos acusados não concordou em proceder, desde já, a oitiva das testemunhas de defesa presentes, restando todos intimados no ato da data da próxima audiência.
Na audiência de continuação, ocorrida em 17 de janeiro de 2010, foi procedida a oitiva da testemunha de acusação José Ivan e da testemunha substituída. Verificada a situação das cartas precatórias expedidas para oitiva das vítimas, apenas a da Comarca de São Lourenço – SC já estava cumprida e juntada aos autos.
Pela autoridade judiciária, a pedido do Ministério Público, foi encaminhado expediente aos Juízos Deprecados, solicitando informações quanto ao cumprimento.
Na seqüência e no mesmo ato, foi procedida a inquirição das testemunhas de defesa e realizado os interrogatórios dos acusados presos, decretando-se ainda a revelia do acusado LINO, que apesar de devidamente intimado para o ato, deixou de comparecer sem motivo justificado.
Por fim, pela defesa dos acusados presos foi solicitado o deferimento de liberdade provisória, sob a alegação de excesso de prazo para a formação da culpa e que possuem residência fixa, em patente constrangimento. Foi igualmente requerida a decretação da nulidade absoluta do feito, em razão que, por força de conexão, o processamento e julgamento do feito deveria ocorrer tão somente na Comarca de Coronel Freitas – SC, local
do crime mais grave.
O defensor de KLOVÂNIO postulou o reconhecimento da nulidade absoluta do feito, argumentando que não foi procedida a notificação prévia do acusado antes do recebimento da denúncia.
A defesa de CELIMAR consignou, desde já, pedido de declaração de nulidade ab initio do processo instaurado em desfavor de seu cliente, alegando que a degravação da conversa não foi realizada por dois peritos oficiais e que não houve a realização da perícia para a identificação das vozes. Pelo advogado de OLIVÂNIO foi requerida a nulidade da audiência de instrução pela ocorrência do interrogatório judicial antes do retorno das precatórias. HAMILTON, por intermédio de seu defensor, requereu a desconsideração do depoimento da testemunha substituída pelo Ministério Público, alegando que tal procedimento não poderia mais ser admitido, por ausência de previsão legal.
Na fase de diligências, apenas pelo Ministério Público foi solicitada a atualização dos antecedentes criminais de todos os acusados junto à Corregedoria Geral de Justiça e perante às Comarcas de Chapecó - SC, Coronel Freitas – SC, São Lourenço do Oeste – SC, Quilombo - SC, Florianópolis – SC e Porto Alegre – RS (Termo de Audiência de fl.).
Atualizado os antecedentes em 19 de janeiro de 2010, os autos foram, no mesmo dia, encaminhados ao gabinete do Promotor de Justiça, com atribuições perante a respectiva Vara Criminal.
Constam dos autos os seguintes documentos, dados, fatos, informações, elementos e peças:
1 - Relatório Policial acompanhado de Levantamento Fotográfico, demonstrando a existência da empresa “J.A.L. Representações” e dos cativeiros; Laudo Pericial de Levantamento do Local do Delito;
2 - Extratos bancários em nome de CAROLINE, confirmando os depósitos efetivados pelas vítimas, inclusive que tais valores, em quase sua totalidade, eram imediatamente sacados tão longo ingressavam na conta;
3 - Termos de Apreensão do veículo GM/Astra, utilizado por HAMILTON, apreendido quando da prisão em flagrante deste; e de apreensão do veículo VW/Gol, cor branca, encontrado abandonado na entrada do município de Coronel Freitas – SC;
4 - Termo de Apreensão de cartões de crédito, aparelho de telefone celular e talonário de cheques, apreendidos na residência de IVÂNIO, porventura do cumprimento do mandado de busca e apreensão;
5 - Cópia dos jornais em que constava o anuncio no campo de classificados dos veículos colocados à venda;
6 - Certidão de nascimento em nome de NILVÂNIO, nascido em 2 de junho de 1992;
7 - Cópia de consulta na Internet, confirmando a existência do veículo Land Rover exposto a venda em concessionária da marca;
8 - Boletim de Ocorrência emitido na DP de São José – SC;
9 - Inquérito Policial instaurado mediante portaria pela autoridade policial de Chapecó – SC, a fim de instaurar a noticiada existência de quadrilha especializada;
10 - Termo de Declaração prestado no Ministério Público na Comarca de Chapecó, Promotoria Criminal, em nome da mãe de NILVÂNIO;
11 - Relatório de Investigação pormenorizado emitido pelo Centro de Investigações Especiais - MPSC, Regional de Chapecó, subscrito por integrantes da Polícia Militar e Civil, acompanhado de documentos;
12 - Termo de Declaração firmado por NILVÂNIO, prestado perante o Centro de Investigações Especiais - MPSC, Regional de Chapecó, admitindo aquele a existência da quadrilha, sua contratação pelos integrantes e fornecendo os nomes de alguns dos integrantes, números de telefone destes, etc;
13 - Termos de Declaração das vítimas Antoni, Batista, Clô e Erasmo, confirmando os fatos descritos na inicial e o reconhecimento pessoal dos agentes que tiveram contato direto com as vítimas. Relataram ainda os danos materiais sofridos e/ou prejuízo, ratificando os valores narrados na denúncia;
14 - Termo de Declaração da vítima Dé, nascida em 09 de agosto de 1995, descrevendo o cativeiro, a separação de cada um nos cômodos, e a prática de atos libidinosos sofridos e narrados na exordial, acompanhado de respectiva certidão de nascimento;
15 - O Laudo de Conjunção Carnal da vítima Dé não demonstrou a ocorrência de conjunção carnal;
16 - Termo de Depoimento Judicial de Batista, declarando que inclusive sofreu tais lesões, culposamente levada a efeito pelos agentes do grupo, quando da sua retirada do veículo e colocação no cativeiro, e ainda agravada pelo período que permaneceu recluso. Foi ainda apurado que em razão do fato praticado em detrimento de Batista, resultou na prática de lesões que incapacitaram-no para o exercício do trabalho por mais de trinta dias e perigo de vida (Laudo Pericial de Lesão Corporal de fl. e Laudo Complementar de fl. );
17 - Apensamento dos autos de interceptação telefônica e busca e apreensão, constando os pedidos, decisões judiciais de deferimento, requisições, expedientes e mandados;
18 - Termo de Apreensão de “9 (nove) telefones celulares, além de 2 (duas) CPU’s, cujos aparelhos supostamente mantinham dados acerca dos depósitos e das vítimas”, e foram encontrados na empresa “J.A.L.Representações”;
19 - Juntada do resultado da interceptação telefônica ao processo criminal após a confirmação do recebimento da denúncia, acompanhado de auto circunstanciado, contendo o resumo das operações realizadas, além de relatório da Subcoordenadoria Regional do CIE, individualizando as condutas imputadas aos agentes;
20 - Juntada de degravação e/ou transcrição respectiva, objeto da interceptação telefônica deferida pelo Juízo da Comarca de Chapecó – SC, ocasião em que foi verificado, em fato igualmente descrito na denúncia ofertada pelo Ministério Público, que um funcionário comissionado do DETRAN, de Chapecó – SC, identificado como sendo KLOVÂNIO, com autorização para acessar os sistemas informatizados ou banco de dados do órgão, era que comunicava e encaminha/repassava para FELÍCIO e ANILTON informações atinentes aos dados cadastrais dos veículos utilizados em cada uma das tramas, tal como número do renavam, marca, placa, ano e modelo, chassi, anteriores proprietários, proprietário atual, localização da residência deste, etc.. Na transcrição, constou que dias antes da aplicação dos golpes, FELÍCIO e ANILTON entravam em contato com o funcionário, obtendo deste as informações necessárias para o sucesso da empreitada ilícita, e tão logo encaminhado os dados, tudo era repassado para APOLINÁRIO e BETO, que tratavam de idealizar a estratégia para a aplicação dos ilícitos;
21 - Segundo apurado, pelo resultado da interceptação e prova testemunhal produzida, KLOVÂNIO foi vizinho de FELÍCIO e ANILTON há considerável tempo, pessoas que possuía relação de amizade e se valiam desse fato para a obtenção dos dados com aquele, de forma não autorizada, repassando-os em prol do grupo, sem conhecimento daquele;
22 - Ficha cadastral em nome de KLOVÂNIO, emitida pelo Detran de Chapecó – SC;
23 - Termos de Apreensão de uma arma de fogo curta, com munição calibre 357 Magnun, e outra do tipo caneta-revólver, municiada, acompanhados de informação policial e cadastral dizendo da ausência de qualquer registro e porte.
24 - Interrogatório judicial de LINO, admitindo o contato com APOLINÁRIO, limitando-se afirmar que tão somente comunicou a este último a ação policial;
25 - Termo de Inquirição Judicial do policial José Ivan, integrante da Subcoordenadoria Regional do CIE, confirmando os relatórios apresentados e os termos da denúncia. No mesmo sentido, foram os depoimentos prestados pelos demais policiais inquiridos perante a autoridade judiciária;
26 - Interrogatório judicial de APOLINÁRIO, admitindo como verdadeiros os fatos descritos na denúncia, postulando pessoalmente no respectivo termo a delação premiada;
27 - Depoimento judicial dos policiais militares que abordaram BETO no Terminal Rodoviário, confirmando o ocorrido, acompanhado da passagem com destino a Foz do Iguaçu – PR;
28 - Os advogados promoveram a juntada, após a última audiência de instrução e julgamento, de documentos consistentes em comprovantes de residência e trabalho em nome dos acusados presos, e certidão de nascimento em nome de DADO, constando a data de 18 de janeiro de 1992, natural de São Lourenço do Oeste – SC;
29 - Laudo de Exame Cadavérico, diagnosticando que a morte da vítima Deovani foi decorrente de “anemia aguda – hipovolemia – hemorragia interna”, descrevendo os seguintes ferimentos e ordem: Ferimento pérfuro-contundente na região escapular esquerda, com 6mm de diâmetro, com zona de contusão e enxugo, correspondendo à orifício de entrada do projétil, com saída em região do procórdio, com perfuração do pulmão esquerdo; Ferimento pérfuro-contundente na região infra-escapular esquerda, de 6mm de diâmetro, com zona de contusão e enxugo, com perfuração hepática, correspondendo à orifício de entrada do projétil, indo alojar no hipcôndrio direito. Ferimento pérfuro-contundente na região lombar direita, de 6mm de diâmetro, com zona de contusão e enxugo, correspondendo à orifício de entrada do projétil, indo alojar na região umbilical. Discussão e conclusão: diante dos comemorativos e achados na necrópsia, constatamos, violência traumática por projéteis de arma de fogo, ocasionando hemorragia toráxica e abdominal, a qual foi responsável pelo êxito legal”;
30 - O corpo da vítima Deovani restou encontrado na manhã do dia 22 de agosto de 2009, nas proximidades da propriedade rural de Antoni Carlos (“local externo, situado próximo a estrada que dá acesso à Linha Flor da Serra, interior do município de Coronel Freitas – SC (Laudo Pericial de fls. ), tendo um dos integrantes da Polícia Militar local deparado-se “com um corpo de um homem, já sem vida, o qual estava usando capacete de segurança (moto). Nas costas da vítima percebi haver a princípio duas perfurações e ao levantar a camisa, ainda na parte de trás, observei a presença de sangue”, identificando-o por meio dos documentos pessoais encontrados, além de respectivo documento do motocicleta CG Titan, de cor vermelha, placas ILA – 4402, de Chapecó – SC, dentre outros objetos (Termo de Apreensão de fl. );
31 - Termo de Apreensão, constando a apreensão da motocicleta Honda, modelo CG 125 TITAN, de cor vermelha, placas ILA 4402 “nas terras de Antoninho Carlo”;
32 - Laudo Pericial de fls., atestando “marca com característica de ter sido produzida pelo solado de um calçado sujo de terra” (documento de fl. );
33 - Auto de Exibição e Apreensão de arma de fogo, calibre 38, marca Taurus, apresentado voluntariamente por LOVÂNIO à repartição policial, tão logo APOLINÁRIO retirou-se da residência daquele, acompanhado de redução a termo das declarações, delatando o ocorrido;
34 - Termo de Apreensão de “3 (três) cápsulas de munição calibre 38”, encontrada e apreendida em poder de APOLINÁRIO, em suas próprias vestes;
35 - Termo de Apreensão da quantia de R$ 300,00 (trezentos reais) em dinheiro encontrados com BETO, e cujos valores encontravam-se ocultados na “sola do sapato”. Na instrução, apurou-se que tais valores foram igualmente subtraídos da vítima Deovani, a qual no dia de sua morte havia, momentos antes da solicitação da corrida, recebido o salário no valor de R$ 600,00. Foi ainda encontrado em poder de BETO, uma sacola contendo no seu interior comprovantes de depósito e transferência em nome de CAROLINE, aparelho de telefone celular com número objeto de interceptação telefônica outrora deferida, além de uma máquina fotográfica contendo fotos de pessoas amarradas e amordaçadas, supostamente tiradas nos cativeiros;
36 - As cartas precatórias expedidas judicialmente, com prazo devidamente fixado, restaram acostadas/devolvidas após a atualização dos antecedentes criminais, concedendo-se vista às partes, as quais tomaram ciência e nada alegaram;
37 - Relatório da autoridade policial, acompanhado de levantamento fotográfico, informando que o noticiado pardieiro localizado na cidade de Coronel Freitas – SC era utilizado pela quadrilha como um dos locais a título de cativeiro, cujo fato foi admitido por BETO;
38 - Infere-se ainda da descrição de todos os dados de qualificação dos envolvidos, quando da denúncia:
APOLINÁRIO, brasileiro, solteiro, profissão a definir, nascido em Chapecó – SC em data de 27.10.1968, filho de Maria e Antonio Carlos, residente na Rua X, Bairro XX, Chapecó – SC;
BETO, brasileiro, solteiro, profissão a definir, natural de Chapecó – SC, nascido em 27.12.1970, filho de Carol e Luca, residente na Rua Y, Bairro YY, Chapecó – SC;
CELIMAR, brasileiro, casado, representante comercial, natural de Coronel Freitas – SC, nascido em 02.02.1986, residente na na Rua A, Bairro São Cristóvão, Chapecó;
DADO, brasileiro, convivente, natural de São Lourenço do Oeste – SC, nascido em 18.02.1982, filho de Tereza, residente na Rua B, Bairro XX, Chapecó – SC;
ELIVÂNIO, brasileiro, solteiro, estudante, natural de Maravilha – SC, filho de Lourdes, nascido em 03.03.1977, residente na Rua V, próximo a entrada do Bairro XX, Chapecó;
FELÍCIO, brasileiro, solteiro, comerciante, natural de Chapecó – SC, nascido em 04.12.81, filho de João e Terezinha, residente na Rua H, bairro B, Chapecó;
ANILTON, brasileiro, casado, profissão a definir, natural de Nonoai – RS, nascido em 14.12.83, filho de Ana e Pedro, residente na Rua A, Bairro São Cristóvão, Porto Alegre - RS;
HAMILTON, brasileiro, convivente, pintor, natural de Quilombo – SC, filho de NILVO e ANGELINA, nascido em 04.11.1975, residente na Rua C, Bairro D, Chapecó – SC.
IVÂNIO, brasileiro, solteiro, profissão a definir, natural de Chapecó – SC, filho de DILVETE, nascido em .07.07.1987, residente na Rua U, bairro Passo dos Fortes, Chapecó – SC;
CAROLINE, brasileira, casada, comerciante, natural de Chapecó – SC, filha de LUIZA, nascida em 27.11.1975, residente na Rua AL, Centro, Florianópolis – SC.
KLOVÂNIO, brasileiro, solteiro, funcionário público comissionado, nascido em 19.11.1980, filho de OLGA, lotado no Detran de Chapecó – SC.
LINO, brasileiro, solteiro, profissão a definir, irmão de APOLINÁRIO, nascido em Chapecó em data de 31.12.1975, filho de Maria e Antonio Carlos, residente na Rua X, Bairro XX, Chapecó – SC;
Certificados os antecedentes criminais dos envolvidos, consta em nome de:
a - ANILTON, APOLINÁRIO e FELÍCIO condenação destes à pena de 5 anos e 6 meses de reclusão, dando-os como incursos na prática do delito de roubo circunstanciado pelo emprego de arma e concurso de agentes;
b - KLOVÂNIO condenação à pena de 8 meses de reclusão e multa, com trânsito em julgado em maio de 2009, por crime de tentativa de furto, constando guia de recolhimento emitida;
c - LINO, cumprimento de prestação pecuniária por força de transação penal ocorrida em junho de 2006, já declarada extinta, e ainda dois processos em andamento, um por crime de receptação dolosa e outro culposa, iniciados em setembro de 2007 e janeiro de 2008.
Ofereça a peça processual adequada, observado o prazo legal, e os requerimentos/manifestações pertinentes à autoridade judiciária competente, abordando cada uma das situações e dados acima retratados, inclusive com indicação expressa dos dispositivos legais aplicáveis, levando em consideração que o processo crime, contendo os elementos de prova e convicção descritos, foram encaminhados com vista ao representante do Ministério Público para devido pronunciamento, que deverá, ao final, datar a peça, e sem se identificar, consignando tão somente a expressão “Promotor de Justiça Substituto”.
Os autos do Inquérito Policial n. 0008/2004, instaurado pela autoridade policial competente lotada no Município e Comarca de Blumenau-SC, para apurar os fatos e as responsabilidades atinentes ao ocorrido nessa cidade, no dia 21 de abril do ano de 2004, por volta das 12:40 horas, onde durante arrufo verificado na praça denominada de Bier Garden culminou na morte de Jota Jota Acetato, vereador no Município de Ponte Serrada-SC, averiguou que durante a realização de uma convenção político-partidária para fins eleitorais houve acerbo desentendimento entre alguns convencionais e populares que se encontravam na praça no instante em que aqueles, aproveitando o intervalo para o almoço, faziam no local público um churrasco.
“Ex-improviso” generalizou-se a confusão, com exaltação de ânimos, havendo troca intensa de sopapos,
pontapés, socos e agarra-agarra de todo lado, até que, num repente, caiu um corpo ensanguentado no meio da praça, causando pânico nos contendores e nos circundantes, estancando a briga e propiciando o alarma geral na procura por socorro médico e chamamento da polícia. Tarde demais, Jota Jota Acetato jazia inerme numa poça de sangue! Ao lado do corpo foi deixada uma chaira encoberta de sangue.
Posteriormente, quando juntado aos autos do inquérito (fls.018), o Auto de Exame Cadavérico, assinado
por um médico designado perito pelo Delegado de Polícia, constava “falência por choque hipovolêmico, causado por perfuração na altura do abdômen por instrumento perfuro-contuso”. Submetida a chaira à perícia técnica, positivou tratar-se o sangue nela contido como pertencente a vítima, segundo termo de apreensão encartado às fls. 021.
Dos enredados no entrevero, a autoridade investigante logrou identificar e indiciar os a seguir nominados:
Cafuringa Astron (comerciante), Antonio Betânia (bancário), Araújo Figueiredo (professor da rede pública estadual de ensino), Hans Von Ettenger (farmacêutico), Picolo Babinette (Prefeito do Município de Botuverá-SC, município integrante da Comarca de Brusque-SC), Vitor Franzino (estudante, menor, à época, com 16 anos), Bartolomeu Krantz (músico), Jango Tsé-Tsé (silvícola aculturado), Raposo Tavares ( servidor público estadual, representante da Justiça Eleitoral na convenção que se realizava), Sardinha dos Anjos (sacerdote, que teria tentado separar os contendores e acalmar os ânimos), Boy George (estafeta, menor, à época, com l7 anos) e Taison da Silva (vereador em Joinville-SC).
Além dos indiciados, que por ocasião dos interrogatórios apontaram uns aos outros como participantes do enfarruscamento, negando, entretanto, a autoria do golpe fatal dado na vítima, porém asseverando a propriedade da chaira como sendo de Picolo Babinette, restaram ouvidas no inquérito as pessoas de:
Q. Santos(fls. 065) – afirmando ter visto, durante a realização do churrasco, o indiciado Picolo Babinette portando a chaira; Edu Schumacher, taxista em ponto daquela praça, dizer que assistiu a todo o entrevero, e que, de fato, quem utilizou a chaira para afiar uma faca de churrasco foi o indiciado Picolo Babinette, pouco antes do início da briga generalizada (fls. 068), e a florista da praça Sara Vera (fls.070), que afirmou peremptoriamente que quem usava a chaira durante o churrasco, sempre na cintura, era o indiciado Picolo Babinette, e mais outras testemunhas cujos relatos cingem-se a existência de luta generalizada, identificando um ou outro contendor, porém não vendo o golpe mortal, nem seu autor.
Concluído o inquisitório, em 04 de agosto de 2009, a autoridade policial que o presidiu remeteu os autos para o Fórum da cidade e comarca de Brusque-SC, onde o digno juiz criminal determinou, por despacho, fosse aberto vista ao douto órgão do Ministério Público.
Recebendo, em gabinete, os autos do inquérito, o doutor Promotor de Justiça Substituto, após detido exame dos autos, fundamentou juridicamente a solução seguinte.
Elaborar a peça processual à hipótese, dispensando o relatório, de que cuida o art. 43, III, “in fine”, da Lei nº 8625/93.
Manuel dos Santos, em 27 de março de 2005, pulando muro de 1,50 m., ingressou em jardim de residência e, como a porta da casa estava aberta, conseguiu entrar no imóvel e subtrair talonário de cheques em branco que se encontrava sobre a mesa da cozinha, com ele fugindo sem ser percebido.
Horas depois, no interior de bar, aproveitando-se de descuido de cliente, subtraiu carteira por este deixada sobre o balcão.
Ainda no mesmo dia, foi surpreendido por policiais quando, com a intenção de praticar novo furto, rompia a fechadura da porta de outra casa. Detido em flagrante, apurou-se que trazia o produto dos delitos anteriores.
Concluído o inquérito, o representante do Ministério Público denunciou Manuel como incurso nas penas do art. 155, §4º, II (escalada), art. 155, caput, e art. 155, §4º, I, c.c art. 14, II, na forma do art. 69, todos do Código Penal.
A denúncia foi recebida em 18 de abril de 2005, concedendo-se ao réu a liberdade provisória. Manuel, apesar de ter apenas dezenove anos à época dos fatos, já fora condenado definitivamente por desacato. A correspondente sentença transitou em julgado para a acusação em 17 de fevereiro de 2005 e para a defesa em 01 de março de 2005.
Interrogado, o acusado admitiu as três imputações e foi firmemente incriminado pela prova oral. Laudos periciais atestam a transposição de muro no primeiro furto e o rompimento de obstáculo no terceiro.
Superada a fase do art. 499 do Código de Processo Penal, o Promotor de Justiça, nas alegações finais, requer a procedência da ação, com a condenação do acusado por todos os crimes atribuídos e a elevação das penas pela reincidência, fixando-se o regime inicial fechado pela mesma circunstância.
A defesa, por sua vez, em preliminar, postula o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva no tocante ao furto simples. No mérito, pede a absolvição quanto aos demais crimes, ante a atipicidade das condutas. No primeiro fato, o bem apossado não teria valor econômico e, no terceiro, a ação não ultrapassou a fase preparatória, não se iniciando a execução. Em caráter subsidiário, no que toca à infração inicial, pretende a exclusão da escalada, pois não a configuraria a transposição de muro de 1,50 m. de altura, ou a identificação da figura privilegiada do delito. Com referência ao último crime, busca a aplicação do redutor máximo pela tentativa. Se condenado por dois ou três delitos, pugna pela incidência da regra do crime continuado, com a imposição do aumento mínimo. As sanções, na primeira e na segunda fases do cálculo, também devem ser estabelecidas no piso, já que presentes circunstâncias atenuantes. Por fim, afirma que o regime prisional deve ser o semiaberto, com substituição da pena corporal por restritivas de direito.
Dispensado o relatório, sentencie o feito.