Uma das clivagens mais importantes da teoria constitucional contemporânea é a que distingue as concepções procedimentalistas das substancialistas. Com base nesse debate, aponte como tais teorias discutem o papel da constituição na sociedade e o espaço adequado da jurisdição constitucional. Qual seria a postura de um tribunal constitucional diante de um tema polêmico como o aborto (sem entrar na questão de mérito)?
Os princípios jurídicos, inseridos ou não em normas escritas, fazem parte do Direito Brasileiro.
Dentre estes princípios assinala-se os princípios gerais do direito, fontes mediatas, supletivas ou subsidiárias, aplicáveis nas hipóteses de lacunas da lei, conforme expressam os artigos 4º do Decreto-Lei nº 4.657/1942 (LINDB), que estabelece o uso dos princípios gerais do direito nas decisões judiciais quando a lei for omissa, e 108, incisos II e III, e 109, ambos do CTN, que permitem à autoridade competente utilizar os princípios gerais do direito tributário, do direito público e do direito privado para aplicar ou interpretar a legislação tributária; os princípios infraconstitucionais, fontes diretas e imediatas de diversos ramos do direito, previstos expressa ou implicitamente em inúmeras normas, v.g., Princípio da Boa-Fé Objetiva, art. 5º do CPC; e, também, os princípios constitucionais, alicerces sobre os quais se constrói o ordenamento jurídico, os quais lhe dão estrutura e coesão e podem ser entendidos como vetores de interpretação que buscam integrar as diferentes partes do sistema constitucional, atenuando as tensões normativas, v.g., o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, expresso no art. 1º, inciso III, da Constituição Federal.
Não raros são os princípios que encontram guarida expressa tanto no texto constitucional quanto nas leis infraconstitucionais, v.g., o Princípio da Razoável Duração do Processo, contido tanto no art. 5º, inciso LXXVIII, da CF, quanto no art. 4º, do CPC.
Doutrina e jurisprudência recorrem frequentemente a eles para solucionar questões jurídicas e costumam discorrer sobre seus conteúdos.
Observe o Princípio da Boa-Fé Objetiva. Ele encerra uma obrigação tanto para as partes quanto para o próprio magistrado de um comportamento ético e leal no transcorrer do processo. Ele se relaciona a uma situação jurídica, não a uma previsão no campo da moral.
Por boa-fé objetiva compreende-se então a fixação de um modelo de conduta leal, à luz do caso concreto (CAMBI). Este dever não pode ser afastado nem mesmo por deliberação das partes, conforme contido no Enunciado 6 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC).
O STF (ACO 2746), ao tratar de questão relacionada ao valor da causa, entendeu que se o próprio autor definiu o valor da causa quando da propositura da inicial, utilizar critério diverso apenas para a fixação de honorários advocatícios atenta contra o Princípio da Boa-Fé Objetiva. O STJ (AgInt no AREsp 204801) fez alusão ao referido princípio quando o recorrente, após anuir expressamente à alteração contratual para permitir sucessão causa mortis, alega inoperância de tal cláusula pela ausência do devido registro, omissão a que, como sócio, deu causa.
No tocante ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, convém iniciar sua análise observando que aquilo que tem preço, pode ser substituído por algo equivalente; por outro lado, aquilo que se acha acima de todo preço compreende uma dignidade (KANT).
O ser humano, medida de todas as coisas (PROTÁGORAS) não pode ser substituído por equivalente, pois dotado de dignidade, e esta dignidade deve ser protegida pelo princípio constitucional aqui observado. A dignidade é qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venha a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos (SARLET).
O STF (RE 670422), ao julgar situação envolvendo a alteração do assento do nascimento para fins de retificação do nome e do gênero sexual aludiu expressamente ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, e, quando se pronunciou (ARE 833248 – Repercussão Geral) sobre veiculação de programa televisivo que aborda crime ocorrido há várias décadas, fez referência sobre a harmonização deste princípio com outros princípios constitucionais: liberdade de expressão, direito à informação, inviolabilidade da honra e da intimidade.
Por sua vez, o Princípio da Razoável Duração do Processo encontra indicação expressa no art. 5º, LXXVIII, da CF e no art. 4º do CPC, constituindo-se em uma determinação a todos aqueles que atuem no âmbito dos processos judiciais ou administrativos para que ajam de forma a garantir a celeridade na tramitação desses feitos.
Por este princípio as autoridades jurisdicionais e administrativas devem exercer suas atribuições com rapidez, presteza e segurança, sem tecnicismos exagerados, ou demoras injustificáveis, viabilizando, a curto prazo, a solução dos conflitos (BULOS).
O Supremo Tribunal Federal, quando da análise da aplicação deste princípio ao processo administrativo, já decidiu (RMS 28172) que a garantia constitucional à duração razoável do processo também deve ser assegurada no âmbito administrativo, e, ao analisar a aplicação da multa fixada no art. 1.021, § 4º, do CPC (ARE 1173250), invocou expressamente este princípio, aduzindo que a referida multa constituía-se em importante ferramenta à sua concretização.
Possível, portanto, observar a importância dos princípios jurídicos para o Direito Brasileiro, razão pela qual enumera-se a seguir dez princípios jurídicos para que o candidato discorra sobre eles.
1 - Princípio da Solidariedade Intergeracional;
2 - Princípio da Continuidade ou Permanência;
3 - Princípio da Conformidade Funcional;
4 - Princípio da Socialidade;
5 - Princípio da Uniformidade Geográfica;
6 - Princípio da Adstrição;
7 - Princípio da Intranscendência Subjetiva;
8 - Princípio da Operabilidade;
9 - Princípio da Não Afetação;
10 - Princípio do Juízo Imediato;
Com relação ao Princípio da Proporcionalidade, discorra sobre sua finalidade, seus fundamentos, a estrutura quando da sua aplicação e as suas dimensões ou sua dupla face.
“Na Política, Aristóteles questiona se a autoridade política é melhor quando exercida por meio da primazia da lei ou pela primazia de pessoas, mesmo sendo a melhor pessoa ou o melhor conjunto de pessoas, como uma assembleia ou mesmo uma corte. Ele sugere que em quase todas as sociedades, em quase todas as ocasiões, é preferível a primazia da lei, visto que:
1 - As leis são produtos da razão e não de paixões;
2 - A primazia de um governante ou de uma assembleia tende à tirania (ou seja, tende a privilegiar o interesse de uma parte da sociedade e não do bem comum);
3 - A igualdade exige que cada pessoa madura tenha alguma participação no governo,
4 - A desejável alternância no exercício do poder dificilmente poderia ser garantida sem suporte legal”. (Finnis, John, “Natural Law Theories”, The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Winter 2016 Edition), Edward N. Zalta (ed.), URL = <https://plato.stanford.edu/archives/win2016/entries/natural-law-theories/>. Tradução e adaptação do elaborador)
“Sob uma democracia representativa, o direito constitucional tem como sua verdadeira finalidade a maior felicidade do maior número [de cidadãos]. [...] A única espécie de governo que tem ou pode ter como objetivo e efeito a maior felicidade para o maior número é [...] uma democracia: e a única espécie de democracia que pode ter lugar em uma comunidade numerosa o suficiente para defender-se contra a agressão nas mãos de adversários externos é uma democracia representativa”. (Bentham, J. (1843) Constitutional code. Indianapolis/USA: The Online Library Of Liberty. Disponível em http://lfoll.s3.amazonaws.com/titles/1999/Bentham_0872-09_EBk_v6.0.pdf p. 3 e 97, tradução e adaptação do elaborador)
Os textos tratam da relevância do Estado de Direito e do papel político que os cidadãos podem desempenhar em uma democracia representativa. Assim sendo:
1 - Defina o conceito contemporâneo de Estado Democrático de Direito;
2 - Apresente suas principais características;
3 - Explique porque a adoção de práticas democráticas parece ser correlata ao princípio de primazia da lei.
OBS.: Identifique os itens ao responder.
Segundo Ronald Dworkin, quando os juristas discutem sobre direitos e obrigações, sobretudo naquelas situações, os chamados casos difíceis, em que as formas e os conceitos jurídicos parecem “agudizar-se” mais intensamente, os profissionais do Direito parecem lançar mão de standards (normas) que não operam como regras, mas sim, de forma diferente, como princípios (ou em outros casos como diretrizes políticas). (Ronald Dworkin. Taking Rights Seriously)
Em relação ao tema, responda às questões abaixo em um único texto.
A - Explique como se resolve a tensão entre princípios constitucionais.
B - Discorra sobre o mínimo existencial e a vedação do retrocesso, relacionando-os aos direitos fundamentais sociais.
(30 Linhas)
O Estado Beta editou uma lei ordinária estabelecendo a exigência de Programa de Integridade às empresas que celebrem contrato, consórcio, convênio ou parceria público-privada com a administração direta, indireta e fundacional, cujos valores pactuados sejam superiores a cem mil reais para serviços e compras.
Aduz expressamente que o referido comando tem por objetivo proteger a administração pública estadual por atos lesivos que possam resultar em prejuízos financeiros causados por irregularidades, desvios de ética e fraudes contratuais, bem como promover maior segurança e transparência na consecução contratual.
A Empresa ABCD Engenharia, afastada do certame licitatório por inexistência de programa de integridade, impetrou mandado de segurança ao argumento de que tal medida não encontraria amparo no texto constitucional.
Isso porque, no âmbito econômico, a Constituição da República, em seu artigo 170, norma de eficácia plena, não somente enfatizou a livre iniciativa como princípio fundante, como também não estabeleceu nos incisos respectivos nenhuma norma que pudesse destacar, em contraposição, a defesa do patrimônio público, restrição esta que, para justificar a validade do diploma legal editado, deveria estar alocada no Capítulo I do Título VII, que versa sobre princípios gerais da atividade econômica.
Nesse sentido, segundo a referida empresa, a medida teria lhe imposto um ônus exacerbado, configurando-se, portanto, desproporcional.
Operacionalize, de modo argumentativamente detalhado, o postulado hermenêutico cabível para a hipótese acima narrada, a fim de equacionar o embate levantado, apontando a solução apropriada.
Resposta objetivamente fundamentada.
(40 Pontos)
O Tribunal de Justiça do Estado Alfa, no exercício regular de sua competência, ao reconhecer a ocorrência de mutação constitucional do art. X, da Constituição de Alfa, deliberou um novo sentido a esse enunciado, recusando o sentido anteriormente adotado.
No entanto, houve uma manifestação contrária por parte de membros da Assembleia Legislativa do Estado Alfa, que, entendendo que o instituto da mutação estaria sendo utilizado em desconformidade com as balizas traçadas pelo sistema jurídico-constitucional brasileiro, defendeu a inconstitucionalidade da referida mutação constitucional.
Nesse sentido, responda de forma justificada, e em consonância com a inteligência do sistema jurídico-constitucional brasileiro, as questões que seguem:
a) no processo de reconhecimento da existência de mutação constitucional, haveria limites ao Poder Constituinte difuso do Estado Alfa? Justifique.
b) no âmbito das discussões sobre a legitimidade constituinte, havendo discrepância entre o texto constitucional e a nova norma estabelecida pelo Poder Constituinte difuso, em que sentido o princípio da conformidade funcional ou justeza pode ser suscitado? Justifique.
Resposta objetivamente fundamentada.
(5,0 Pontos)
Em um certo país (República Teta), o poder constituinte originário, ao produzir uma nova Constituição, insere no respectivo texto os seguintes artigos:
“Art. 28 - A produção, alteração e revogação de leis ordinárias se dará por manifestação da maioria simples no Parlamento da República, em um único turno. (...)
Art. 63 - No que se refere às normas materialmente constitucionais, a manifestação do poder constituinte derivado reformador somente será reconhecida se o processo de votação for aprovado pela maioria de 4/5 do total de membros do Parlamento da República, em votação a ser realizada em dois turnos.
Art. 64 – No que se refere às normas meramente formais da presente Constituição, a manifestação do poder constituinte derivado reformador se dará por intermédio de manifestação de maioria simples dos membros do Parlamento da República, em um único turno. (...)
Art. 100 dos ADCT (Atos das Disposições Constitucionais Transitórias) – Ficam integralmente revogadas as normas da Constituição anterior.”
Diante do exposto e seguindo o quadro teórico adotado no sistema jurídico-constitucional brasileiro, responda às questões a seguir.
A - Quanto à estabilidade, é possível considerar que a nova Constituição deve ser classificada como rígida? Justifique. (Valor: 0,65)
B - A nova Constituição deu origem ao fenômeno conhecido, no âmbito do direito constitucional intertemporal, como "desconstitucionalização”? (Valor: 0,60)