Em 1993, o povo indígena Kanindé ajuizou ação perante a justiça federal do Ceará contra a União e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), alegando omissão das autoridades brasileiras em promover a identificação, a demarcação, o reconhecimento e a titulação das terras tradicionalmente ocupadas pela comunidade, já que o processo administrativo iniciado com essa finalidade ainda seguia sem conclusão.
Em 1997, como prova dos prejuízos causados pela ausência de titulação territorial, a comunidade indígena peticionou, argumentando que fazendeiros seguiam ocupando grande parte do território.
A partir de então, a ação judicial seguiu seu curso regular e foi definitivamente julgada em 1999 — ano em que a União promoveu a titulação das terras indígenas. No entanto, de acordo com lideranças do povo Kanindé, parte dos fazendeiros segue até hoje ocupando uma pequena parcela do território.
Em 2018, o Ministério de Minas e Energia anunciou a intenção de oferecer à iniciativa privada concessão pública para exploração e produção de petróleo em reservatório localizado no território ocupado pelo povo Kanindé.
Em 2019, a comunidade indígena noticiou às autoridades competentes que um fazendeiro havia assassinado duas de suas lideranças.
Em 2020, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação penal para processar três indiciados pelos crimes de homicídio doloso. Ninguém foi preso até o momento. Ainda em 2020, o MPF ajuizou ação civil pública contra a União, alegando que a concessão da exploração petrolífera violava o direito à propriedade do povo indígena e que o poder público sequer havia realizado consulta livre, prévia e informada à comunidade acerca do projeto. As sentenças, favoráveis ao MPF, foram confirmadas em segunda instância, e os respectivos recursos estão pendentes de julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em razão desses fatos mais recentes, em 2022 a Comissão Interamericana de Direitos Humanos decidiu submeter o caso ao julgamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Em nota, a Corte alegou que o Brasil violou direitos protegidos tanto pelo Pacto de São José da Costa Rica quanto pela Convenção n.º 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), especificamente os direitos à vida, à integridade pessoal, à propriedade coletiva, à consulta livre, prévia e informada, às garantias judiciais e à proteção judicial. Para a Comissão, as violações ocorreram em razão de:
a) demora até a conclusão dos processos de reconhecimento e titulação do território indígena;
b) omissão do Estado brasileiro em prevenir os homicídios de lideranças da comunidade;
c) presença de fazendeiros na terra indígena até a atualidade;
d) projeto de concessão pública para exploração petrolífera no território;
e) ausência de persecução e punição dos autores dos homicídios de duas lideranças do povo Kanindé;
f) ausência de prestação jurisdicional para impedir a concessão pública para exploração de petróleo no território; e
g) alegada ausência de consulta livre, prévia e informada à comunidade sobre o projeto de concessão.
Diante da situação hipotética apresentada, na condição de advogado da União, responda, de modo justificado, com base nos instrumentos internacionais aplicáveis e na jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, se tal Corte tem competência, em razão do tempo e da matéria, para processar e julgar o caso apresentado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos contra o Brasil. Esclareça, ainda, em que medida se deve reconhecer a ausência de prévio esgotamento dos recursos internos na situação.
(30 linhas)
A prova foi realizada com consulta a códigos e(ou) legislação.
Disserte, com indicação das normas relacionadas ao tema, sobre o princípio da subsidiariedade no âmbito da proteção internacional dos direitos humanos, considerando, sempre de forma fundamentada, no mínimo, os seguintes aspectos:
A - Conteúdo do princípio da subsidiariedade e seus fundamentos teóricos gerais e específicos. Subsidiariedade como regra substantiva e/ou processual.
B - Exceções ao princípio segundo a normativa do Sistema Interamericano de Direitos Humanos e a interpretação, inclusive ampliativa, que lhes dão a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos.
C - Princípio da Subsidiariedade e a Defensoria Pública.
(1,50 Pontos)
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