Mévio foi pronunciado como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, inciso IV, do Código Penal e, após julgamento popular, foi condenado como incurso nas sanções do art. 121, caput, do Código Penal, com pena final concretizada em 06 (seis) anos de reclusão. Inconformado com a decisão do júri, interpôs apelação com fundamento no art. 593, inciso III, “d”, do Código de Processo Penal. Ao julgar a apelação, o Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso defensivo e determinou que Mévio fosse novamente julgado pelo Tribunal Popular. No novo julgamento, Mévio foi condenado nos termos da capitulação contida na decisão de pronúncia, com pena final fixada em 12 anos de reclusão.
Nesse caso, haveria algum impedimento legal para que, em virtude do novo julgamento popular, Mévio recebesse uma sanção penal mais gravosa da que recebeu no primeiro julgamento? JUSTIFIQUE sua resposta.
Fulano foi denunciado pela prática de homicídio duplamente qualificado – motivo torpe, consistente em vingança, e emprego de meio cruel – e por ocultação de cadáver em concurso material.
Segundo consta da denúncia, Fulano causou a morte de Sicrano mediante golpes de instrumento contundente em diversas partes do corpo, agindo para se vingar do fim do relacionamento amoroso de Sicrano com sua filha. Após a consumação do homicídio, Fulano enterrou o cadáver de Sicrano em um local ermo.
Após regular processo, autoria e materialidade das infrações provadas, Fulano foi pronunciado apenas pela prática de homicídio simples.
Entendeu o prolator da pronúncia que a existência do relacionamento amoroso entre Sicrano e a filha de Fulano impede o reconhecimento das qualificadoras. Quanto ao delito de ocultação de cadáver, o magistrado entendeu não ser da competência do Tribunal do Júri e determinou a remessa de peças para apreciação e julgamento do juiz singular.
Como Promotor de Justiça, apresente o recurso cabível e arrazoe, postulando a pronúncia nos termos da inicial. Fica dispensado o relatório.
Fulano foi denunciado como incurso nos artigos 121, § 2º, incisos II e IV, 129, § 1º, inciso I, na forma do artigo 69, todos do Código Penal, por ter, de acordo com a inicial, causado a morte de Sicrano, com quem tivera banal desentendimento no dia anterior e que, no momento da agressão, estava conversando com um amigo, Beltrano, em um bar. Consumado o homicídio, Fulano desferiu um soco em Beltrano, causando-lhe a queda e, em consequência, lesões corporais que resultaram em incapacidade para as funções habituais por mais de trinta dias.
Após regular processo, autoria e materialidade das infrações provadas, Fulano foi pronunciado apenas como incurso no artigo 121, caput, do Código Penal, sendo absolvido com relação ao crime conexo.
Entendeu o prolator da pronúncia que o desentendimento anterior impede o reconhecimento das qualificadoras e que não restou provada a intenção de ofender a integridade corporal de Beltrano.
Como Promotor de Justiça, apresente o recurso cabível e arrazoe, postulando a pronúncia nos termos da inicial. Fica dispensado o relatório.
Réu é condenado pelo tribunal do júri a cumprir 12 anos de pena privativa de liberdade, por homicídio qualificado pelo motivo torpe, e recorre ao Tribunal de Justiça fundamentando sua apelação só na alínea “d”, do inciso III, art. 593, do CPP.
A decisão do júri transita em julgado para o Ministério Público.
No julgamento da apelação, o tribunal, por maioria de votos, anula o julgamento por falta de quesitação acerca de mais uma qualificadora reconhecida na pronúncia (uso de meio cruel), sem que haja recurso da defesa.
Submetido a novo júri, o réu é condenado a 14 anos de reclusão, por homicídio qualificado pela motivação torpe.
Considerando-se somente os dados fornecidos nesta questão, pergunta-se:
A) A decisão do Tribunal de Justiça que reconheceu vício da quesitação e anulou o 1º julgamento seria suscetível de questionamento? Em caso positivo, qual seria o fundamento?
B) Suponha que o Tribunal de Justiça, em vez de anular o julgamento do júri por vício de quesitação, deu provimento à apelação do réu por decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos. Nesta hipótese, a segunda decisão condenatória, de 14 anos de reclusão, desrespeita algum princípio processual? Qual? Fundamente.
(20 Linhas)
(1,0 Ponto)
Num de seus julgados o Superior Tribunal de Justiça denegou habeas corpus impetrado por uma mandante de homicídio condenada pelo tribunal do júri, sentença mantida pelo Tribunal de Justiça, ocorrendo o trânsito em julgado do veredito.
A impetrante sustentou que o executor material foi absolvido em júri realizado em data posterior ao seu julgamento, ao que, a absolvição deveria ser-lhe estendida.
Discorra sobre os possíveis fundamentos jurídicos utilizados pelo Tribunal da Cidadania para denegar o writ, tanto em caráter liminar, quanto na parte meritória.
(20 Linhas)
(1,0 Ponto)
No dia 06/05/2017, Fernando Sousa relatou a agentes da 2ª Delegacia de Polícia de Boa Vista (2ª DP) que ele, seu irmão Leonardo Sousa e o amigo Bernardo Silva estavam no bar de sua propriedade e de seu irmão, situado em Boa Vista, na rua A, lote 1, no dia 05/05/2017, por volta das dezessete horas, quando dois indivíduos, um deles portando arma de fogo, anunciaram assalto, exigindo que fossem entregues celulares e dinheiro.
Bernardo Silva identificou o assaltante que portava a arma e disse: “Tonho, é você?” Após a pergunta, os assaltantes ficaram mais nervosos e Tonho, que estava de posse da arma de fogo, começou a efetuar disparos com ela. Leonardo estava na frente de Bernardo e acabou levando três tiros: um em um dos ombros, um no tórax e um de raspão em um dos braços.
Com os disparos, as vítimas saíram correndo e não atentaram para o destino dos assaltantes. O irmão da vítima informou que estava com muito dinheiro em espécie porque era dia de pagamento dos seus empregados, o que seria feito ao final do expediente.
Fernando afirmou, ainda, que não conhecia Tonho, visto que era Leonardo quem lidava com o comércio, e forneceu a relação com os dados de todos os ex-empregados, na qual constava o nome de Antônio Mourão, que passou a ser o principal suspeito.
Por fim, informou que os assaltantes não levaram dinheiro algum que estava em sua posse, tampouco os celulares.
Leonardo está internado e não corre risco de morte; segundo boletim médico, ele beneficiou-se do pronto atendimento que lhe foi prestado e do fato de a bala que atingiu seu peito ter passado no meio de duas artérias vitais, sem atingi-las.
Tendo coletado tais dados, os agentes Carlos Batista e Felipe Gonçalves se deslocaram à residência de Bernardo e encontraram sua esposa, Patrícia Silva, muito preocupada, pois havia recebido uma ligação do marido e ele lhe havia dito que tinha sofrido um assalto e que Antônio Mourão, vulgo Tonho, seu amigo pessoal e ex-empregado do comércio dos irmãos Sousa, teria efetuado vários disparos contra Leonardo. Bernardo disse também que estava receoso por ter reconhecido o assaltante, e avisou que iria para Mucajaí, local onde moravam seus pais, a fim de ali permanecer por algum tempo e sair de cena, para não sofrer qualquer vingança por parte dos assaltantes.
Diante desses fatos, o delegado da 2ª DP entrou em contato com o delegado de Mucajaí, com vistas a encontrar e interrogar Bernardo, para confirmar a participação de Tonho e obter informações a respeito do outro indivíduo, que ainda não havia sido identificado. Agentes de Mucajaí foram à residência dos pais de Bernardo, os quais negaram que o filho estivesse lá.
Na manhã do dia 07/05/2017, a delegacia de Mucajaí recebeu a informação de que tinham sido ouvidos tiros e gritos em área rural próxima à entrada da cidade, na BR-174. Os tiros teriam sido efetuados por volta das quatro horas da manhã daquele mesmo dia.
Os policiais dirigiram-se então para a entrada da cidade e, na Fazenda Luz, encontraram o corpo de Bernardo com dois tiros, um na nuca e outro em uma das pernas. Em diligências na avenida principal, os agentes conseguiram uma gravação de um estabelecimento local, na qual aparecia uma pessoa sendo abordada no posto de gasolina e sendo levada para uma motocicleta por duas outras pessoas.
As imagens foram encaminhadas à 2ª DP, que as tendo analisado, identificou, de forma clara, Claudenilson Pereira, vulgo Manezinho, infrator conhecido pela frieza de seus atos. Os agentes da 2ª DP, Carlos e Felipe, foram, então, entrevistar Manezinho, que friamente confessou sua participação nos dois atos e confirmou que seu amigo, Tonho, o havia convidado para a prática delituosa.
Manezinho explicou que Tonho, tendo ficado desesperado por ter sido reconhecido, perseguiu Bernardo até Mucajaí e o arrastou para o matagal da fazenda, onde efetuou os dois tiros. O primeiro tiro atingiu uma das pernas de Bernardo, que, ao cair no chão, foi atingido pelo outro tiro, na nuca. Manezinho negou ter efetuado qualquer disparo, mas informou que a arma era sua.
Manezinho desapareceu após o depoimento e foi encontrado morto em 11/05/2017. Em seu corpo, havia diversas perfurações. Não se sabe quem o matou. Com as informações colhidas no depoimento de Manezinho, em 14/05/2017 o delegado da 2ª DP localizou Antônio Mourão, qualificou-o (fls. 231 do inquérito policial) e procedeu ao seu interrogatório.
O indiciado utilizou seu direito de ficar calado.
Relatado, o inquérito policial foi encaminhado para a central de denúncias, que centraliza todos os inquéritos policiais do estado.
Partindo da premissa de que tanto a comarca de Mucajaí quanto a de Boa Vista possuam uma vara específica criminal e uma vara específica do tribunal do júri, redija, na condição de promotor de justiça, a peça adequada à situação hipotética em questão. Não crie fatos novos nem qualifique o acusado.
Na peça, ao domínio do conteúdo serão atribuídos até 14,00 pontos, dos quais até 0,70 ponto será atribuído ao quesito apresentação (legibilidade, respeito às margens e indicação de parágrafos) e estrutura textual (organização das ideias em texto estruturado).
(Até 120 linhas)
Tertuliano é submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri, em virtude de ter, à meia-noite do dia 1º de abril de 2007, convencido sua mulher, Martifinélia, que era portadora de grave doença mental, a pular da cobertura de um prédio de dez andares, com uma raquete de tênis em cada uma das mãos e várias penas de pavão presas às costas, sob a alegação de que ela conseguiria voar.
Acusado da prática de homicídio qualificado, o réu acabou sendo absolvido pelo Conselho de Sentença, em julgamento ocorrido no ano de 2013. À época, o Ministério Público não interpôs recurso.
Alguns meses depois, o Promotor que assumiu o órgão ministerial perante o referido Tribunal do Júri descobriu que, por um esquecimento do cartório, não foram feitas as publicações e nem a divulgação a que se refere o art. 426 do Código de Processo Penal (lista geral dos Jurados), nos anos anteriores ao julgamento em questão e nem naquele ano.
Diante da descoberta de tal omissão, responda:
1 - Foi válido o julgamento de Tertuliano?
2 - Em caso negativo:
2.1 - De que vício padeceu?
2.2 - Pode Tertuliano ser submetido a novo julgamento?
2.3 - O que precisa o Promotor fazer para que esse novo julgamento, se cabível, ocorra?
(50 Pontos)
Considere os seguintes dados a respeito de um hipotético caso penal:
Após regular desenvolvimento e apresentação de relatório pela autoridade policial, foi submetida à apreciação do Ministério Público procedimento investigatório (autos de inquérito policial no 1111-22.2017, da comarca de Taumaturgia, Estado de Santa Cruz).
Do referido procedimento consta o depoimento da policial militar ALINE SILVA, relatando que em data de 30-11-2016, com seu colega de farda BENTO SOUZA, foi chamada para atendimento de situação ocorrida naquela mesma data, às 09h00min, nas dependências do Centro de Detenção Provisória daquela mesma cidade e comarca, quando foi presa a pessoa de ANA GUERRA, na posse de 40 gramas de cocaína (benzoilmetilecgonina), ocultada em cavidade corporal, além de setecentos gramas de maconha (Cannabis Sativa L., contendo o princípio ativo tetra-hidrocanabinol), devidamente escondida entre os objetos de higiene pessoal e roupas que levava para BERNARDINO GUERRA, preso naquela mesma unidade prisional.
Em depoimento, o agente carcerário CIRINO CRISÓSTOMO confirmou que naquela data procedia à revista dos objetos levados pelos visitantes aos presos, recebendo as sacolas entregues, que eram identificadas, separadas e inspecionadas, quando percebeu que no forro de um casaco entregue por ANA GUERRA para repasse ao preso provisório BERNARDINO GUERRA havia volumes; solicitou esclarecimentos a ANA GUERRA e esta de pronto admitiu que se tratava de droga, abrindo o forro da vestimenta diante do agente; indagada se havia mais droga, a princípio negou, mas na sequência, acionada policial militar feminina para proceder revista pessoal, foi encontrada com ANA GUERRA a quantidade já especificada de cocaína.
ANA GUERRA admitiu que trazia a droga a pedido de seu filho, BERNARDINO GUERRA, ali recolhido desde 20/05/2016, e o qual lhe teria dito que precisava saldar dívidas com o pessoal de um grupo que ele mencionava como sendo o “Comando dos Patrões”, ou seja, os detentos PACÍFICO DOS ANJOS, CÔMODO POMBAL e SANTINO PAZ, dedicados ao roubo de cargas e tráfico de drogas, conforme ele lhe teria informado, dos quais teria recebido, em ao menos duas oportunidades anteriores, pequenas porções de maconha para consumo.
BERNARDINO, por sua vez, confirmou que orientara a mãe a trazer a droga, explicando que uma mulher desconhecida a abordaria na entrada do Centro de Detenção e lhe entregaria a substância ilícita, o que efetivamente ocorreu naquela mesma manhã. Admitiu, de igual modo, que entregaria a droga para o pessoal do Comando dos Patrões.
No mesmo procedimento, apurou-se que em datas anteriores, situações semelhantes haviam ocorrido.
Assim, em 24/10/2016, por volta das 10h00min, no mesmo centro de Detenção, quando da visita ao preso RICARDO SINGH, sua companheira CARLA LETTUCE foi surpreendida na posse de cinquenta gramas de cocaína, escondidos em cavidades de seu corpo, e quatrocentos gramas de maconha, ocultados dentre os alimentos contidos em uma sacola, situação confirmada pelo agente carcerário MARTINHO AUGUSTINO e pela policial militar ALINE SILVA, admitindo CARLA LETTUCE que seguira as orientações de seu companheiro RICARDO SINGH, recebendo a droga de uma mulher desconhecida que se encontrava na esquina do Centro de Detenção.
RICARDO SINGH alegou que atuara segundo as determinações do pessoal do Comando dos Patrões e que repassaria a estes a droga, negando-se a dar maiores esclarecimentos quanto à identidade destes.
Recuperadas as imagens das câmeras de segurança do Centro de Detenção e estabelecimentos circunvizinhos, constatou-se que nos horários e datas discriminados ANA GUERRA e CARLA LETTUCE foram abordadas por um mesmo veículo, conduzido por DEOLINDA SOLÉRCIA, com a qual conversaram e de quem receberam sacolas e pequenos volumes.
Localizada, DEOLINDA SOLÉRCIA admitiu a entrega das sacolas e drogas, alegando que seguia as determinações do Comando dos Patrões, porém negando-se a declinar a identidade destes. Confirmou-se que DEOLINDA SOLÉRCIA estava cadastrada para realização de visitas íntimas a PACÍFICO DOS ANJOS, que teriam ocorrido em três ocasiões anteriores durante o ano de 2016.
Restou também apurado no referido procedimento investigatório a apreensão, em data de 07-12-2016, na cela onde se encontravam recolhidos PACÍFICO DOS ANJOS, CÔMODO POMBAL e SANTINO PAZ, dois quilogramas de maconha, cinquenta pedras de crack e duzentos gramas de cocaína, escondidos em diversos nichos da parede da referida cela, devidamente escamoteados para burlar a fiscalização carcerária.
Comprovou-se, ainda, que PACÍFICO DOS ANJOS exercia a função de coordenação e mando dos demais, incumbindo a CÔMODO POMBAL e SANTINO PAZ a efetiva execução das empreitadas criminosas, inclusive com a seleção, arregimentação e coordenação das atividades de outros asseclas.
Por fim, em data de 25/12/2016, durante o banho de sol que ocorria às 15h00min naquele Centro de Detenção Provisória, obedecendo a determinação do preso PACÍFICO DOS ANJOS, que exercia o comando do grupo, e fazendo uso de um punhal que recebera de CÔMODO POMBAL, o detento RICARDO SINGH desferiu três golpes contra BERNARDINO GUERRA, enquanto este era dominado por dois outros detentos não identificados, causando-lhe lesões que foram a causa de sua morte, situação presenciada pelos agentes carcerários PEDRO CABREL e LEONARDO REIS.
Ouvido, RICARDO SINGH admitiu a prática do ilícito, aduzindo que BERNARDINO havia alcaguetado PACÍFICO DOS ANJOS, CÔMODO POMBAL e SANTINO PAZ, situação que levou à perda da droga que estes distribuíam dentro do Centro de Detenção aos demais integrantes do Comando dos Patrões e simpatizantes.
O procedimento investigatório é devidamente instruído com o auto de constatação provisória das drogas apreendidas, laudo definitivo de exame destas, laudo de exame cadavérico, laudo de exame em arma branca (punhal).
O candidato deve elaborar denúncia a respeito dos fatos narrados, utilizando os dados constantes da narrativa fática. Não é necessário qualificar as pessoas na peça.
(120 Linhas)
(3,0 Pontos)
Fernando foi pronunciado pela prática de um crime de homicídio doloso consumado que teve como vítima Henrique. Em sessão plenária do Tribunal do Júri, o réu e sua namorada, ouvida na condição de informante, afirmaram que Henrique iniciou agressões contra Fernando e que este agiu em legítima defesa. Por sua vez, a namorada da vítima e uma testemunha presencial asseguraram que não houve qualquer agressão pretérita por parte de Henrique.
No momento do julgamento, os jurados reconheceram a autoria e materialidade, mas optaram por absolver Fernando da imputação delitiva. Inconformado, o Ministério Público apresentou recurso de apelação com fundamento no Art. 593, inciso III, alínea ‘d’, do CPP, alegando que a decisão foi manifestamente contrária à prova dos autos. A família de Fernando fica preocupada com o recurso, em especial porque afirma que todos tinham conhecimento que dois dos jurados que atuaram no julgamento eram irmãos, mas em momento algum isso foi questionado pelas partes, alegado no recurso ou avaliado pelo Juiz Presidente.
Considerando a situação narrada, esclareça, na condição de advogado(a) de Fernando, os seguintes questionamentos da família do réu:
A - A decisão dos jurados foi manifestamente contrária à prova dos autos? Justifique. (Valor: 0,60)
B - Poderá o Tribunal, no recurso do Ministério Público, anular o julgamento com fundamento em nulidade na formação do Conselho de Sentença? Justifique. (Valor: 0,65)
Relatório
A presente ação penal refere-se à acusação contra RIBAMAR pela prática dos crimes previstos no art. 121, § 2º, II, e no art. 155, § 4º, II, do Código Penal (CP). Conforme a denúncia, no dia 10/7/2013, o acusado ceifou a vida de sua esposa LUCIANA por supor que ela o havia traído. Após o homicídio, o acusado evadiu-se do distrito da culpa e sacou quase todo o valor disponível na conta da vítima, uma vez que possuía seu cartão e a respectiva senha.
Em plenário, o representante do Ministério Público (MP) sustentou integralmente a denúncia e pugnou pela condenação do acusado pela prática dos crimes mencionados, nos termos em que ele foi pronunciado.
A defesa, por seu turno, sustentou a tese de que o acusado teria praticado o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida de injusta provocação da vítima. Requereu, ainda, que, em caso de condenação, fosse reconhecida a atenuante relativa à confissão espontânea.
Ao apreciar os quesitos, os senhores jurados integrantes do conselho de sentença entenderam por bem condenar o acusado às penas cominadas no art. 121, § 2º, II, e no art. 155, § 4º, II, do CP.
Com tais considerações e respeitando a vontade soberana dos senhores membros do conselho de sentença, julgo procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia e condeno RIBAMAR às penas cominadas no art. 121, § 2º, II, e no art. 155, § 4º, II, do CP. Atento às disposições dos arts. 59 e 68 do CP, passo à individualização da pena.
Sabe-se que a fixação da pena do acusado deve atender aos princípios que regem a aplicação da pena, cujo caráter, por definição, é retributivo-preventivo. Cabe ao magistrado balizar a pena atendendo ao disposto do art. 59 do CP, o qual preceitua que a pena estabelecida deve ser a necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime.
Quanto ao homicídio
O acusado é reincidente, visto que, conforme certidão juntada aos autos, foi definitivamente condenado pela prática do crime de roubo, cometido em 12/7/2013. Segundo consta dos autos, o trânsito em julgado da sentença condenatória ocorreu em 10/10/2015. Essa circunstância será apreciada na segunda fase da dosimetria da pena. O sentenciado ostenta maus antecedentes, pois, conforme se vê de sua folha penal, está sendo processado por um crime de furto simples, cometido em 5/7/2013.
Em relação ao crime de homicídio por que ora condenado, vale informar que culpabilidade, motivos e meios são inerentes ao tipo. Não foi possível apurar eventual contribuição da vítima para a prática desse crime. A conduta social do acusado é questionável, uma vez que ele não respeita a individualidade das pessoas que estão à sua volta, tendo admitido, durante seu interrogatório, que frequentemente bisbilhotava o celular da vítima à procura de eventuais provas de infidelidade. Não se pode dizer que o acusado tenha personalidade louvável; ao contrário, ele se revela um homem de pouca cultura, que não se esforçou minimamente para obter qualificação educacional, tendo abandonado os estudos na quinta série. Além disso, sua reprovável estrutura psicológica e seu modo de pensar puderam ser questionados pelo fato de ele, após matar a vítima de modo cruel, ter escrito um bilhete, no qual afirmava que havia cometido o crime motivado por ciúme, tendo deixado o referido bilhete junto ao corpo da vítima, o que revela completo desprezo pelos parentes da vítima e pelas autoridades constituídas.
O modo como o acusado agiu aponta para a configuração de pelo menos três qualificadoras, aquela indicada pelo MP na denúncia e duas outras não referidas na peça inicial: as previstas no art. 121, § 2º, III, quarta figura (crime cometido por meio de asfixia), e IV, última figura (crime cometido com recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido). No entanto, uma vez que a denúncia delimita o alcance da acusação e que a peça ministerial é omissa quanto a tais qualificadoras, esse magistrado não pode considerá-las para agravar a pena do acusado.
As circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do CP não favorecem o acusado, visto que ele cometeu o crime em sua própria residência, em local que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima.
A escolha do local para o cometimento do delito revela também que o acusado premeditou o crime, tendo-o consumado em sua residência para que não fosse contido ou atrapalhado por terceiros. No âmbito de sua casa, o acusado pôde agir livremente, tendo enforcado a vítima, inicialmente, com o braço e, posteriormente, com uma corda. Ressalte-se, ainda, que o acusado, conforme declarou durante seu interrogatório em plenário, enforcou a vítima por pelo menos cinco minutos enquanto ela se debatia desesperadamente, o que evidencia a extensão da crueldade perpetrada pelo acusado contra a vítima — conforme referido anteriormente, o acusado poderia ter sido, por isso, denunciado por homicídio triplamente qualificado.
As consequências do crime são por demais desfavoráveis, já que a vítima deixou sua filha, Clara, de sete anos de idade por criar e educar. A criança, conforme ficou evidenciado pela instrução realizada em plenário, vive hoje com os avós, que, surpreendidos pela súbita e inesperada perda da vítima, se viram compelidos a arcar com a difícil tarefa de criar e educar a pequena órfã.
Dado o exposto, a pena-base é fixada em dezenove anos e seis meses de reclusão.
Em virtude da atenuante prevista no art. 65, III, d, do CP, a pena é reduzida para dezenove anos de reclusão.
Em virtude da agravante da reincidência, a pena é majorada para dezenove anos e seis meses de reclusão.
Em virtude da agravante prevista no art. 61, II, f, do CP — uma vez que é incontroverso que o acusado mantinha relacionamento amoroso com a vítima — a pena é novamente majorada, para vinte anos de reclusão.
Sendo aplicável ao caso a agravante prevista no art. 61, II, d, do CP, uma vez que o meio para a prática do crime foi cruel — consistente em asfixia, o que fez que a vítima se debatesse agonizante por aproximadamente cinco minutos enquanto seu algoz a enforcava impiedosamente —, a pena é majorada para vinte anos e seis meses de reclusão.
Por fim, reconhecida a aplicabilidade da agravante prevista no art. 61, II, c, do CP, uma vez que o acusado praticou o delito nas dependências de sua residência, distante dos olhos de terceiros, o que tornou impossível qualquer tentativa de defesa por parte da ofendida, a pena é majorada para vinte e um anos de reclusão.
Não há causas de diminuição ou de aumento de pena aplicáveis à espécie.
Dessa forma, a pena imposta torna-se definitiva.
Quanto ao furto
O acusado é reincidente, circunstância que será apreciada na segunda fase da dosimetria da pena. Como visto anteriormente, ostenta maus antecedentes e sua conduta social é questionável. Além disso, não se pode dizer que o acusado tenha personalidade louvável, podendo-se questionar sua reprovável estrutura psicológica e seu modo de pensar.
Assim, a pena-base é fixada em quatro anos e seis meses de reclusão e trinta dias-multa.
Não há atenuantes a incidir nesse caso, devendo-se destacar que o acusado, em essência, negou a autoria do delito de furto, tendo afirmado que apenas se apropriou do que lhe pertencia, o que não configura a confissão, que, para beneficiar o acusado, deve ser plena e segura.
Em virtude da agravante da reincidência, a pena é majorada para cinco anos de reclusão e trinta e cinco dias-multa.
Como o acusado mantinha relacionamento amoroso com a vítima, a pena é majorada para cinco anos e seis meses de reclusão e quarenta dias-multa.
Não há causas de diminuição ou de aumento de pena aplicáveis à espécie.
Assim, a reprimenda imposta torna-se definitiva.
Decisão
Em atenção ao disposto no art. 69 do CP, unifico as penas impostas, somando-as, o que resulta em uma pena total de vinte e seis anos e seis meses de reclusão, a ser inicialmente cumprida em regime fechado (art. 33 do CP), e quarenta dias-multa.
Dada a ausência de informações seguras sobre a situação econômica do acusado, assim como o disposto no art. 49 do CP, cada dia-multa será calculado à razão de um trigésimo do salário mínimo vigente ao tempo do fato e atualizado quando de seu efetivo pagamento.
Sendo certo e incontroverso que a vítima deixou filha por criar (segundo informaram as testemunhas, a órfã tinha sete anos de idade quando do cometimento do crime), é inequívoca a obrigação do autor do fato de indenizar os familiares da vítima. A dor, o sofrimento e os prejuízos causados pelo acusado são imensos.
Dessa forma, considerando os prejuízos sofridos pelos familiares da ofendida e atento ao disposto no art. 387, IV, do Código de Processo Penal, entendo por bem fixar a quantia de R$ 50.000 como valor mínimo a ser pago por Ribamar aos familiares da vítima Luciana a título de indenização e reparação pelos danos causados pela infração. Tais recursos deverão ser destinados à educação da infante Clara, devendo a prestação de contas ser feita ao MP, nos termos da lei.
Persistindo as razões da prisão do acusado, que respondeu ao processo sob custódia do Estado, entendo prudente, por garantia da ordem pública e para assegurar a aplicação da lei penal, manter sua prisão preventiva, negando-lhe o direito de aguardar em liberdade o julgamento de eventual recurso.
Transitada em julgado a presente sentença:
a) inscreva-se-lhe o nome no rol dos culpados, expedindo-se a respectiva carta de sentença;
b) venham os autos conclusos para deliberação a respeito dos bens apreendidos e vinculados ao presente processo.
Determino que a Serventia do Juízo extraia cópia da foto de fl. 27, a qual deverá ser imediatamente devolvida aos familiares da vítima.
Dou por publicada a sentença e intimados os presentes, nesta sessão de julgamento.
Registre-se. Cumpra-se.
Recomende-se o acusado na prisão em que se encontra.
Sala das sessões plenárias do Tribunal do Júri, quinta-feira, 15 de outubro de 2015.
– Juiz de Direito –
Na qualidade do defensor público responsável pela defesa de Ribamar, interponha o recurso cabível ao caso, fundamentando-o juridicamente e datando-o no último dia do prazo para a interposição. Dispense o relatório e não crie fatos novos.